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IES devem preparar professores que atuarão na EAD

Uso ineficaz de tecnologias leva cursos a manter molde dos presenciais

 

A EAD (Educação a Distância) no Brasil ainda é concebida, de modo geral, a partir das premissas da educação presencial, com uso restrito e inadequado das tecnologias e mídias disponíveis. A afirmação é do professor Alfredo Matta, coordenador do pólo ABED (Associação Brasileira de Educação a Distância) na Bahia. Para ele, ainda é comum as instituições venderem interatividade e entregarem cursos baseados na educação presencial e apenas lecionados a distância, por meio de vídeos. O dirigente alerta ainda para um problema crônico nesse cenário: a formação dos professores que atuam na EAD.

 

"O principal problema ainda é de concepção por parte de quem fornece cursos. A maioria das instituições não se envolveu efetivamente com a política colaborativa da EAD e os professores estão a reboque dessa concepção", afirma Matta. Ele responsabiliza as próprias IES (instituições de Ensino Superior) por essa falha porque argumenta que os projetos pedagógicos dos cursos EAD ainda teriam como base a imagem, com mera exibição do conteúdo. "O professor tem de estar consciente das especificidades da EAD e lidar com isso no projeto pedagógico. A instituição deve possibilitar ao professor amadurecer nesse sentido",declara ele.

 

De acordo com Matta, a formação do professor que atuará na EAD pode ser feita pela instituição por meio do suporte durante a escolha das plataformas a serem utilizadas. Ele acredita ser imprescindível contemplar as possibilidades de interação com os alunos por meio de vídeo, texto, áudio e comunidades virtuais. "Quando as possibilidades são deixadas de lado, a EAD fica sem graça e as taxas de evasão aumentam", alerta Matta. "Talvez o que falte sejam instituições que tenham a cara da EAD e sejam referência, que trabalhem melhor a articulação entre mídias. No Brasil, a EAD de qualidade ainda é muito pontual", lamenta ele.

 

Oreste Preti, coordenador do curso da licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, na modalidade a distância, do Nead (Núcleo de Educação Aberta e a Distância) da UFMT (Universidade Federal do Mato Grosso) diz que muitos professores têm dificuldade para entender a dinâmica e aceitar que o aluno tem capacidade de estudar a aprender mesmo longe do professor. Para ele, o ponto fundamental a ser considerado pelos professores que atuam em EAD é relacionado à autonomia dos alunos nessa modalidade, em que é possível ao docente atuar mais na mediação do aprendizado do que no fornecimento bruto de conteúdo.

 

A autonomia, mesmo que aliada a outros aspectos, parece ser um conceito relacionado à EAD que tem importância decisiva para o sucesso da modalidade. "A EAD tem três pilares fundamentais, o diálogo, o planejamento e a autonomia, que é o seu grande diferencial, pois nessa categoria tudo é planejado, sem tanto espaço para o improviso", reforça a professora Angelita Marçal Flores, coordenadora da equipe de capacitação e assessoria docente da UnisulVirtual.

 

Angelita diz que é a partir do envio de material que o aluno terá dúvidas que motivarão a interação com os colegas e com o professor. Assim, a metodologia, a dinâmica e o ritmo das aulas passam a depender da iniciativa dos alunos. Professor há cerca de dois anos e meio de cursos a distância de graduação em gestão e administração, Osny Taborda Ribas Junior, da UnisulVirtual, concorda com Angelita e afirma que o papel do professor dessa modalidade é mostrar caminhos e os pontos em que o aluno precisa melhorar. "É um papel de mediador e de psicólogo. Com muito mais frequência do que no presencial, há alunos que relatam problemas pessoais gravíssimos, muitos alunos com deficiências, que optam pela EAD por não poderem sair de casa. E é necessário valoriza-los para que eles não desanimem", destaca Ribas.

 

O professor da UnisulVirtual acrescenta que os alunos de EAD são mais dedicados e empenhados. "No presencial há dois ou três alunos que se destacam por turma. Na EAD percebo que são pessoas que escolheram e decidiram se dedicar", garante ele. Tal constatação surpreendeu o professor, que via com ressalvas a modalidade.

 

Habilidades necessárias

 

Mas apesar de haver algumas diferenças entre as modalidades presencial e a distância, o coordenador da UFMT defende que o professor que atua em EAD precisa se preocupar com a concepção pedagógica, o domínio do conteúdo e da técnica. "A habilidade não é diferente da do presencial e a atividade do professor independe da plataforma utilizada", defende Preti.

 

Além disso, Preti acredita ser necessário o desenvolvimento da habilidade de comunicação, principalmente a escrita. "Tem de considerar que está falando para um aluno que está sozinho. E muitos professores têm dificuldade de escrever um texto que prenda o leitor", diz ele, que aponta esse problema como ainda mais evidente em cursos técnicos, em que o professor depende mais da oralidade.

 

A comunicação foi, a propósito, o principal obstáculo no início da atuação de Ribas na EAD. Segundo conta, nas primeiras experiências, influenciado pela necessidade de síntese das aulas presenciais onde já atuava há quatro anos, era muito sucinto ao tratar da matéria nos e-mails que trocava com os alunos e acabava deixando o conteúdo incompleto.

 

A dica de Matta para evitar esse problema é, durante a preparação do conteúdo, imaginar o aluno do outro lado. "Ele, às vezes, está em regiões diferentes e é preciso criar situações que relacionem a realidade daquela pessoa ao conteúdo e ao professor. Saber que os alunos são diferentes tem de ser um trunfo do professor, não uma dificuldade", acredita Matta. Já para Angelita, é essencial que o docente de EAD seja aluno da modalidade antes de começar a lecionar para que compreenda a forma como ocorre o aprendizado e o relacionamento com o professor.

 

Quanto aos recursos tecnológicos disponíveis, Ribas afirma que devem ser explorados de forma a auxiliar o docente na transmissão do conhecimento. Ele conta que explora a possibilidade de armazenagem e envio de arquivos para compartilhar reportagens, artigos e outros materiais com os alunos. "O meio digital permite acumular muito mais material em um banco de dados", observa ele.

 

Ribas alerta, no entanto, para o risco de perder o controle da gestão do tempo devido ao fato de a atuação não se limitar mais ao espaço físico da universidade. Ele admite que tem dificuldades em lidar com esse lado da questão e que, embora a Unisul não exija dedicação em tempo integral, acaba por ficar o tempo todo conectado. "Se tenho condições, acho que não custa nada, no intervalo das minhas atividades, responder às questões para que os alunos tenham a resposta o mais rápido possível", diz.

 

 Dicas para o professor que atua com EAD

 

 - Procure explorar a possibilidade de colaboração entre os alunos para desenvolver os conteúdos das aulas

- Explore as possibilidades tecnológicas, como vídeos, áudios, textos e comunidades virtuais, para compor o processo de transmissão de conhecimento

- Atente para a linguagem utilizada. Embora o meio possibilite mais informalidade, o professor deve evitar usar as abreviações comuns da Internet

- Ao assumir o papel de motivador, o professor precisa prestar atenção aos limites de intimidade que têm com os alunos

- A EAD exige que o professor se envolva com os alunos, os motive e atue como tutor

- Ter mais disposição em transmitir os conteúdos de maneira mais completa do que é feito em sala de aula é tão importante quanto o domínio da disciplina.

 

(Universia)


Data: 19/03/2010