topo_cabecalho
Artigo - Desventuras e angústias de uma ecosenhora - Parte 2

Wagner Braga Batista

 

 

Como antecipamos, ocorreria a cizânia e a subseqüente cisão no grupo das ecosenhoras.

 

Na pauta de discussão não estava prevista esta temática. Mas Arminda queria por que queria falar da vida de outra ecosenhora.

 

Não se tratava de uma intriga, mas de uma confidência entre amigas.

 

Pois bem, por curiosidade ninguém a conteve. Falou como quis, quanto quis e o que não quis.

 

Da reunião seguinte, não há registros.

 

Esta celeuma não transpirou. Ficou guardada como segredo intimo das jovens econsenhoras.

 

No entanto, todos sabem que não há fuxico ou mexerico que não vaze quatro paredes.

 

Certo dia, antes de receber encomenda de finos perfumes, a líder máxima do grupo das ecosenhoras desabafou:

Imagine, Mme Bidou nem me falou das novidades. Fui surpreendida ao chegar a sua celebrities room e me deparar com aquela farsante da Arminda.  Traveste-se de militante, mas não tem estatura, talento, traquejo ou dinheiro para ser uma ecosenhora.

 

Sentenciou:

Limita-se a ser uma reles insigne senhora.

 

Com isto, vinha a público um segredo guardado a sete chaves.

 

A rígida disciplina e o silencio exigido pela rigorosa militância das ecosenhoras tinha se rompido. A inquebrantável unidade ideológica fora por terra. Naquele restrito circulo de efemérides, eclodia um fato público. Um racha entre as ecosenhoras.

 

Inicialmente tratado como simples fuxico, adquiriu a magnitude de grandes dissensões político-ideológicas.

 

Segundo elas, a divisão político-ideológica fora provocada pelo diferenciado grau de adesão à causa comum. Intolerável em ações sociais desta envergadura.

 

Assim como nos cismas religiosos, as ecosenhoras também tinham sua fé, eram ciosas de suas praticas e obrigações sociais. Não com seus maridos ou com suas profissões. Estes compromissos menores não lhes serviam como motivações. Já tinham superado estas vicissitudes há longo tempo. Todas elas eram bem casadas e bem empregadas. Arminda tinha como profissão um ministro.

 

Jussara um empresário socialmente responsável. Ademilda tinha três empregos simultâneos. Era mulher de deputado, casada com um pastor e, eventualmente, com um ponta esquerda do Corinthians.. 

 

Pois bem, voltemos ao centro nevrálgico da questão.

 

Naquele circulo restritíssimo se instalara a cizânia. Umas se sentiam mais do que as outras. Isto gerava cochichos e maledicências que afetavam a militância das ecosenhoras. As mais aguerridas formaram uma tendência à esquerda e desqualificaram as renegadas como insignes senhoras.

 

Desde esse dia, vingou a desqualificação e a discórdia.

 

Como água e óleo, ecosenhoras não se misturavam com insignes senhoras.

 

As primeiras adotaram a seguinte palavra de ordem: Fé nos negócios verdes e combate às  políticas públicas. As insignes senhoras, mais moderadas, limitaram-se a professar a inabalável convicção no poder de compra de seus maridos.

 

Após o dissenso voltaram à militância.

 

Como uspianos trotkistas feridos tornaram-se irredutíveis, doutrinárias e ferrenhas defensoras de suas marcas prediletas. Não usavam as mesmas griffes, não ostentavam mesmas jóias, não freqüentavam mais os mesmos coiffeurs. Não usavam os mesmos michês e deixaram de freqüentar seus respectivos maridos.

 

Também passaram a falar outro idioma. Para não se confundir com desafetas, as insignes senhoras só se comunicavam em inglês.

 

Porém o tempo aplacou desavenças. O conturbado litígio fora cedendo lugar a acordos. Já admitiam utilizar os mesmos perfumes e as mesmas echarpes. Reservadamente selaram um pacto de não agressão. Não fariam mexericos em lugares públicos. Tornariam a defesa de seus cãezinhos, orquídeas e  beija flores uma plataforma de lutas comum. Concordaram também em transitar, eventualmente, nos mesmos shoppings e boutiques, para promover conjuntamente algumas ações sociais. Desde que fosse resguardada a independência e o inalienável direito de compra de cada senhora. A partir daí empenharam-se na inclusão digital.

 

Desta feita, comprando sempre mais do que dois ou três celulares para desescluirem ecosenhoras da pobreza e da exclusão digital.

 

 

Wagner Braga é professor aposentado da UFCG


Data: 12/05/2010