topo_cabecalho
Sem cotas, estatuto da Igualdade Racial é aprovado na CCJ do Senado

Sem políticas de cotas para negros na educação ou no mercado de trabalho, o Estatuto da Igualdade Racial foi aprovado por unanimidade nesta quarta-feira pela CCJ (Comissão de Constituição de Justiça) do Senado, depois de dez anos de tramitação no Congresso.

 

Apesar de os senadores admitirem que a proposta "não é perfeita nem a ideal", existe acordo entre os partidos para que o texto seja votado ainda hoje no plenário da Casa, para depois seguir à sanção presidencial.

 

"O acesso à universidade e ao programa de pós-graduação, por expressa determinação constitucional, deve se fazer de acordo com o princípio do mérito e do acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística segundo a capacidade de cada um", argumenta o relator do projeto, Demóstenes Torres (DEM-GO), em seu parecer.

 

Ele defendeu a agilidade na apreciação do projeto sobre cotas na educação que já tramita no Senado. Afirmou, porém, que as cotas devem ser sociais, e não raciais.

 

Caíram também os incentivos fiscais a empresas com mais de 20 empregados que mantenham uma cota mínima de 20% de trabalhadores negros, porque seriam uma discriminação reversa contra os brancos pobres, segundo entendimento dos senadores.

 

A exclusão das cotas provocou reação da plateia --formada principalmente por integrantes de movimentos-- que gritou em coro: "Os traidores serão lembrados, senadores".

 

Representantes de movimentos de afrodescendentes que acompanharam a votação se disseram frustrados com o esvaziamento do projeto, mas afirmaram que a aprovação é uma vitória para a população negra.

 

"Identificamos que a não aprovação do estatuto constituiria um entrave à efetiva emancipação e desenvolvimento dos negros deste país", afirmou Nuno Coelho, coordenador nacional do Movimento dos Agentes de Pastoral Negros do Brasil.

 

Segundo Coelho, o texto é um ponto de partida para que o governo e o Congresso passem a discutir políticas destinadas aos negros. Ele disse que os movimentos já estão articulando com congressistas propostas para cada um dos trechos suprimidos do texto inicial.

 

Como o projeto é do Senado e já foi alterado e aprovado pela Câmara, os senadores só puderam suprimir artigos e trechos e fazer emendas de redação.

 

Raça

 

O relator retirou todas as menções a "raça" do texto, apesar de o termo estar presente no nome do projeto. Demóstenes afirma que a idealização do estatuto partiu do mito da raça, mas "geneticamente, raças não existem".

 

"Deste modo, em vez de incentivar na sociedade a desconstrução da falsa ideia de que raças existem, por meio do estatuto, o Estado passa a fomentá-la, institucionalizando um conceito que deve ser combatido, para acabar com o preconceito e com a discriminação."

 

Na mesma linha, a proposta aprovada pela comissão rejeita a expressão "derivadas da escravidão", em artigo que trata da implementação de programas de ação afirmativa destinados a reparar distorções e desigualdades sociais.

 

A justificativa é que o estatuto deve "olhar para o futuro", buscando a justiça social para todos os injustiçados, sem limitação a descendentes de escravos.

 

Os senadores também suprimiram do texto o termo "fortalecer a identidade negra", sob o argumento de que não existe no país uma identidade negra paralela a uma identidade branca.

 

"O que existe é uma identidade brasileira. Apesar de existentes, o preconceito e a discriminação não serviram para impedir a formação de uma sociedade plural, diversa e miscigenada", defende o relatório de Demóstenes Torres.

 

A população negra não será alvo de políticas de saúde específicas porque, para o relator, é um "total equívoco" acreditar que ela é predisposta a doenças exclusivas. "Mesmo doenças ditas raciais, como a anemia falciforme, decorrem de estratégias evolucionárias de populações expostas a agentes infecciosos específicos. Nada tem a ver com a cor da pele."

 

A senadora Serys Slhessarenko (PT-MT) votou em favor do estatuto, mas fez ressalva a esse ponto. "Morrem seis vezes mais mulheres negras no parto do que brancas. Existem, sim, especificidades na população negra."

 

(Folha.com)


Data: 16/06/2010