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Artigo - Designer norteamericano desenvolve utensílio que serve para alguma coisa

Wagner Braga Batista

 

Depois de projetar alguns objetos inúteis, John John Junior, fruto do cruzamento entre celebrado figurinista francês e renomado cientista paraguaio, ao sair da proveta migrou do Mississipi para Nova York.

 

John John comprovara  que talento não nasce no berço. Antecede o parto. É uma atividade congênita exercida antes mesmo do nascimento.

 

No ventre da proveta, John John projetara artefatos notáveis, fraldas de filó transparente, chupetas com headphone, mamadeiras com garfo e faca para bebes precoces que nasciam com dentes.

Mesmo antes de vir ao mundo, revelava-se um autentico e originalíssimo designer.

 

Três dias depois de nascer já era pós-graduado num instituto em Milão, que surrupiava cooperativas de artesanato e se mantinha sediado em campanhas de marketing e emissoras de televisão.

 

Nesta tão afamada escola, para não inibir seu talento, professores recusavam-se a lhe dar aulas. Para não lhe causar constrangimentos, também não iam à escola. Enalteciam sua inventividade que dispensava conhecimentos, práticas obsoletas e inúteis teorias. Neste mister, suas preleções eram inigualáveis. Produziam verdadeiras perolas pedagógicas. Dispensavam currículos, programas de curso, planos de aulas, conteúdos de disciplinas e defendiam a plena liberdade para disseminar suas fantasias.

 

Cultivavam idiossincrasias, ensinavam futilidades e originalíssimas banalidades.

 

Tendo livre curso no ensino / aprendizado, com menos de um mês de vida, já estava plenamente formado. Qualificado para ser John John, usar gel no cabelos e eventualmente batom. Familiarizado com happenings notabilizara-se em inúmeras mostras, exposições em colunas sociais, em portais de redes anti-sociais e em revistas de celebridades.

 

Graças a essas edificantes rotinas, com três meses de idade obtivera o título de egocêntrico do ano.

Aos quatro meses de idade era detentor de inúmeras aptidões, hábeis deformidades e de quase todas futilidades. Premiado pelo marketing do ti-ti-ti,  conseguira se destacar num baile carnavalesco, num desfile de modas e dançar vestido de odalisca na imensa fogueira das vaidades.

 

Nem passados cinco meses, seu portfolio engordara três vezes e, de repente ficara anoréxico. Tinha que ser vitaminado com fotos de gente bonita e esbelta, com novos conceitos estéticos e lindos produtos sofisticados.

 

Ao final do primeiro semestre de vida, sentia-se plenamente realizado.  

 

Depois de reinventar um ábaco que não somava, nem subtraia, uma bola de futebol quadrada e um sapato sem sola, o prodigioso projetista de objetos inusitados conseguira desenvolver um produto que servia para ser usado.  

 

Ainda que não soubesse exatamente para quê, estava convencido que dera grande passo. Novamente iria pontificar em colunas sociais, revistas de modas e conseguiria emplacar nos talk shows da TV..

 

Criara um objeto auto-executável. Rapidamente se criaria e, num átimo de segundo, estaria degradado. Tornar-se-ia obsoleto tão rapidamente, que em curto espaço de tempo, estaria descartado. Para acelerar a economia, logo seria trocado. O objeto enigmático teria vida útil quase nenhuma e sua  utilidade seria inventada pelo usuário.

 

Seu manual de instruções, muito criativo, era um jogo de palavras cruzadas. Propunha adivinhações e indicava tudo errado. Para exercitar a imaginação do usuário, as funções deste produto viriam sempre com nomes trocados. Seria um quebra cabeças infinito formado com peças que vinham faltando. Se o produto fosse comprado a prazo, seria entregue com dispositivos quebrados. Se adquirido à vista, teria componentes adulterados.

 

Como um artefato ergonômico poderia ser comestível. Portanto, convém frisar, era econômico, gastronômico e flexível. Graças a estas peculiaridades, o prazo de validade também poderia ser indefinidamente dilatado..

 

Como excelente produto multifuncional, aos domingos era comestível, às segundas tornava-se um eletrodoméstico. Nas terças servia para limpar as pias, na quarta para lustrar assoalhos. Na quinta fritava pastéis, na sexta era usado para matar mosquitos. No sábado era aspirador de pó e nos domingos uma motocicleta.

 

Este notável projeto rendera-lhe um selo verde e um laurel do Excellence Picaretas Design . Agraciado pelo Ministério da Indústria e Comercio, foi exposto em paises africanos, no Haiti e no Oriente Médio, após ser devidamente financiado pela indústria do desperdício.

 

Com um ano de idae, John John tinha a cabeça feita. Aprendera novas palavras em inglês e paradigmas atualizados.

 

Não usava mais terno, nem gel nos cabelos e agora andava aprumado. Descobrira um grande negócio com a defesa da geração de emprego e renda, do alivio à pobreza e do desenvolvimento sustentável. Abocanhava verbas do governo e financiamentos de todo lado. Vendia badulaques para uns e gadgets plagiados. Depois de inventar um produto que servia para alguma coisa e vários outros que serviam para coisa alguma, agora projetava um artefato inusitado.

 

Criaria novas expectativas de uso e o consumo desenfreado. Ao invés de produtos em série, projetaria produtos artesanais seriados. Toda semana seriam comprados, permaneceriam sempre incompletos e nunca seriam usados.

 

Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG


Data: 23/09/2010