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Artigo - O Dia Nacional do Designer: em defesa de uma política pública para o design no Brasil

Wagner Braga Batista

 

O Dia Nacional do Designer, instituído em 1998 por meio de decreto presidencial, reporta-se à data de nascimento de Aloísio Magalhães. Homenageia o advogado e artista plástico pernambucano, professor da ESDI- Escola Superior de Desenho Industrial, que se notabilizou como precursor do desenho industrial e autor de inúmeros projetos de programação visual nas décadas de 1960 e 1970.

 

Aloísio Magalhães também se destacou como defensor do patrimônio cultural brasileiro e do ensino como elementos forjadores do desenho industrial.

 

A alusão a Aloísio Magalhães, ao seu descortino cultural, e a esta data tem como objetivo suscitar um processo de suma importância na atualidade.

 

Está em curso o debate sobre uma política pública para o design no Brasil. Apesar da relevância desta política pública, nota-se uma visível indiferença de vários segmentos habilitados a contribuir com sua elaboração. Lamentavelmente, institutos de pesquisa e centros formadores, entes qualificados para intervir na formulação de estratégias e diretrizes políticas para o design, mantêm-se à margem desta discussão.

 

Esta postura, incompreensível, acarreta o rebaixamento do debate a patamares críticos. Reduz o alcance de políticas abrangentes e integradoras a disputas circunstanciais. Substitui a imprescindível participação coletiva pela movimentação e o transito de grupos de interesses residuais visando a realização de demandas restritas.

 

As omissões de segmentos mais qualificados para esta discussão têm provocado a hipertrofia e o esvaziamento de planos ou programas de design. Transforma estes canais de difusão e implantação do design em meros veículos publicitários, sem desdobramentos significativos. Quando não os converte em instrumentos de transferência de recursos públicos em cabides de empregos.

 

Historicamente, este vicio de origem, inibiu a participação democrática e confinou o debate sobre  estratégias e diretrizes para o design a gabinetes e círculos reservados. Ao invés de assegurar a realização de demandas coletivas, propiciou a obtenção de favores privados.

 

Alertamos que participação na formulação de políticas públicas é um direito constitucional de todos setores sociais interessados na sua implementação.

 

Portanto, os segmentos refratários ao debate, que se omitem na explicitação de suas demandas abrem mão deste direito.

 

Mais grave, agem deste modo numa conjuntura propicia ao debate e permeável a absorção do desenho industrial ou design em vários setores de atividade econômica e cultural.

 

Pela omissão, sedimentam restrições à participação coletiva, o monopólio de informações, o confinamento do debate em grupos reduzidos, a formação de círculos de interesses estritos, ações intermitentes e descontinuas, falta de registros e de avaliações, entre tantos outros desvios que anulam o caráter democrático e participativo exigido para formulação de uma política pública e para a implementação de um plano setorial para o design no Brasil.

 

A defesa de um debate democrático, amplo e participativo deve mobilizar profissionais e estudantes interessados na consolidação deste setor de atividades. Pode também contribuir significativamente para que este plano setorial tenha conseqüências positivas para a afirmação, a expansão e a destinação social do design.

 

À guisa de estimulo ao debate e de sinalização de um horizonte permeável a nossa intervenção, faremos menção a alguns indicadores socioeconômicos.

 

1-            Há um expressivo aumento do volume da arrecadação tributária em 2010, correspondendo a 17, 68 % em relação a setembro de 2009, fonte de provisão recursos exigidos pelas políticas públicas (Arrecadação federal completa um ano de recordes sucessivos em setembro. URL: http://g1.globo.com/economia-e-negocios/noticia/2010/10/arrecadacao-federal-completa-um-ano-de-recordes-sucessivos-em-agosto.html acessado em 19 de outubro de 2010 )

2-            O Brasil se torna a 8ª maior economia do mundo ( EUA,  China, Japão, Alemanha, França, RU, Itália e Brasil) com crescimento real em 2010, de 7,5%. O PIB salta de U$ 1,5 tri para U$ 2,02, com expansão equivalente a 28,5%. (FMI) Ampliando o mercado interno e a pauta de exportações.r

3-            Pela primeira vez a renda per capita brasileira ultrapassará o patamar dos dez mil dólares (FMI)

4-            Dois eventos, a Copa do Mundo, em 2014, e as Olimpíadas, em 2016, realizar-se-ão no Brasil, implicando em grandes investimentos em desenho industrial ou design.

5-            Cresce a demanda de bens de consumo entre as camadas com menor poder de compra. Na camada D, há um contingente de 43 milhões de habitantes, com renda entre R$ 768,00 e R$ 1115,00 , que detêm  8% da produção nacional. Classificados pelo Índice de Desenvolvimento Humano-IDH, Organização das Nações Unidas- ONU, como pobres, estes segmentos correspondem a 22,16% da população brasileira. No estrato E, com renda mensal inferior a R$ 768,00, localizam-se 29,9 milhões de brasileiros, classificados como miseráveis, que correspondem a 16,02% da população, participando de apenas 2% da produção nacional. Este segmento, apesar de suas necessidades e premências, mantém-se à margem das atividades produtivas e de consumo. (Neri, Marcelo. A Pequena Grande Década- Crises Cenários e a Nova Classe Média  Rio de Janeiro, CPS, Fundação Getúlio Vargas, 2010).  A inclusão social de pobres e de miseráveis implicará na produção de equipamentos de uso coletivo e de bens de consumo por meio do poder público, suscitando inúmeras oportunidades para o desenho industrial nesta esfera.

6-            As recentes políticas distributivas contribuíram para reduzir a pobreza no Brasil, porém estão longe de alcançar um resultado satisfatório. Na parte superior da pirâmide ainda se observa expressiva concentração da riqueza e da renda em nosso país. Em 2009, segundo indicações da pesquisa supracitada, 10,4% da população detinham 44% da renda nacional. Projetos de desenho industrial podem estar mais sintonizados com esta perspectiva distributiva.

7-            A pesquisa mencionada enseja a integração de 36 milhões de novos consumidores ao mercado, bem como a ascensão de 14 milhões de habitantes, que hoje se encontram abaixo da linha da pobreza, até 2014. A produção de bens industrializados que contemplem demandas deste contingente também reclama a nossa participação.

 

Estas proposições adquirem relevo e que requerem a intervenção do design

 

A ênfase em preservação ambiental, no planejamento urbano, nos sistemas de transportes, no saneamento básico e construção de moradias, em equipamentos de uso coletivo, em acessibilidade, em políticas de segurança pública que respeitem a cidadania, em investimentos produtivos, no desenvolvimento de novas tecnologias e de artefatos que resultem de sua aplicação, entre tantos outras proposições, são fortes motivações para projetos de design.

 

Apesar das inúmeras restrições ao exercício pleno das nossas atividades, no Brasil o poder público em seus vários níveis ainda é o setor que mais demanda nossas atividades seja por intermédio da contratação eventual de serviço, seja por meio da oferta de empregos em instituições públicas, especialmente de ensino.

 

Neste enfoque, também não podemos deixar de lado duas reivindicações básicas.

 

Duas postulações ganham relevo neste contexto: a defesa de um estatuto profissional, corporificado na regulamentação da profissão, e a indissociável melhoria da qualidade do ensino, que impõe avaliação sistemática de instituições e de cursos de design ou desenho industrial no país.

 

São metas que se conjugam, uma vez que não se pode conceber o exercício condigno de uma profissão sem que esteja respaldado em educação de qualidade, em formação consistente.

 

Atualmente há mais de 500 cursos no Brasil. Há enormes disparidades entre eles. Na esfera pública, responsável durante três décadas pela oferta de ensino e pesquisa com inegável padrão de qualidade, há evidentes retrocessos. As recentes avaliações efetuadas pelo INEP são esclarecedoras. Cursos com significativas assimetrias, possivelmente, a cada ano, estejam diplomando sete mil desenhistas industriais ou designers. Este enorme contingente está ingressando num mercado de trabalho difuso e anômalo. Disputando inserção profissional em ambiente inóspito, marcado pela falta de parâmetros e de critérios para o exercício desta atividade.

 

Todos temos uma grande responsabilidade com a realização do planejamento participativo e com estratégias integradoras para o design. Como professores, não podemos nos eximir na formação de nossos alunos e no resguardo de condições mais adequadas para o exercício profissional desta atividade.

 

O IX Congresso de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, recém findo, debateu esta questão. Suscitou a necessidade  de que este novo contexto socioeconômico favoreça a retomada do debate amplo, democrático e participativo para a construção de alternativas para o design brasileiro.

 

Acentuou a importância do planejamento participativo na elaboração de plano setorial e de política pública consistente, abrangente e integradora capaz absorver criteriosamente nosso setor de atividades.  Assinalando que este processo pode descortinar um cenário no qual o design se consolide na esfera pública, tenha maior visibilidade e seja reconhecido pela sua relevância social. As indicações deste novo cenário são auspiciosas.

 

Com este entendimento, procurou sensibilizar para a efetivação deste propósito, reivindicando a realização de encontro democrático e participativo, precedido de ampla divulgação e de eventos regionais, para que possamos dar continuidade a este objetivo comum, fornecendo maior vigor e representatividade ao Plano Setorial de Design e ao seu colegiado específico.

 

Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG


Data: 05/11/2010