Em Dia com a Poesia O blues do sumiço do soul de uma mãe Maria Um amigo perdeu o pai subitamente... E me falou que o que lhe conforta É o fato que ele sabe que (a alma de) Seu pai está em um bom lugar... Tenho andado com raiva da vida Pois minha Maria básica, Minha mãe Maria Arly, Não mais está entre nós (a)normais... Minha recifense primeira Que neste 19 de frevereiro, Completa 90 carnavais, Fugiu do bloco dos (ir)racionais... Eis a grande incógnita: Para onde vai a alma de quem não morreu, Por onde anda a alma Se a lucidez se escafedeu? A caduquice lembrou-se de minha mãe E eu acho até que isso não é mal Pois, pelo menos para ela, Viver ou morrer agora é algo do surreal... Entretanto, não é fácil Para este seu bem querente Saber que Dona Lili não é mais A dona do seu saber Mas, o lance é que minha mãe está Em grandíssima parte de minha vida Quando acordo, quando como, Quando durmo e até quando perco o sono... Se me meto a poeta Lembro de suas polipolares poesias Seus bolos eram esculturas Simples rabanadas, eram douradas fatias... Se rocko uma jazzeira Lembro do seu gosto por uma frevança, Agora, tal qual uma criança Por qualquer batuque ela dança... Se faço um desenho qualquer Lembro que meus primeiros passos e traços E letras e sílabas, dela vieram e... O lápis e o pincel vieram junto com o talher... Esta minha edípica mãe mulher Está em meus receios básicos Está em meus devaneios trágicos E está em meus pensamentos mágicos Está no respeito pelo antigo Está no apego à fauna e à flora Está no amor pelos filhos Ora sempre, ora toda hora Está no medo do adoecer No sofrer de pavor pelo morrer Mas também na solidariedade Aos sofrentes, doentes e morrentes... Saí, claro, de seu ventre Mas minha mãe não sai de mim Por isso tanto me dói Que minha Lila tenha saído de si Como me doeu, há uns três dias Ela me fitou e me estudou... E com franqueza me indagou: - Quem é, quem é você? Para minha mãe nada mais sou Agora eu lhe sou um zé ninguém, Ou talvez um qualquer alguém Se ela não sabe nem dela, imaginem... Pois saiba, minha mãe querida Eu sou de você e Eu sei de você Serei e saberei por toda minha vida Mas, antes de você me perguntar Quem eu sou, houve uma Pergunta repetente e muito atraente que você muitas vezes me fez Insistente, renitentemente insistente Você me alfinetou Me deixou curioso e estupefato Cada vez que me via, perguntava no ato! Na verdade foi sua última lição Preparando-me para esta situação Tentando me dizer que você logo, avia! Logo, logo, de mais nada lembraria Perguntava-me e sorria E cada vez que me via Com um sorriso maroto A mesma pergunta repetia Perguntou-me esta pergunta Até que eu pudesse ter certeza Que de mais nada você lembraria Que lembrar só a mim caberia A pergunta inquisidora Uma pergunta pesquisadora Era uma frase dissilábica Era somente isso tudo: - Lembra? “Lembra?” era a pergunta... Mas, do que eu deveria lembrar... Parecia estar de mim a zombar Na verdade estava a me orientar... Lembre meu filho Porque eu não posso mais Lembre meu filho E tente ficar em paz... Minha mãe, eu lembro Eu lembro, eu lembro e eu lembro... De bom, de ruim e de maravilhoso Eu lhe fui mágoa e lhe fui formoso Lembro o tempo todo Lembro tanto e tanto e tanto Lembro tanto, que dá tanta saudade Que dá vontade de esquecer... Mas serei valente e não esquecerei De minha mãe sempre lembrarei Chorando de rir ou sorrindo para não chorar Tantas de minha mãe vou lembrar Lembrarei também como um consolo, Para me consolar e para não lembrar Para não querer acreditar Que eu não sei onde sua alma está... Não sei e não sei e não sei... E não importa que você não saiba de mim Não sabe mais do meu bom Mas também não sabe do meu ruim Uma psicanalista esperta me ensinou Ela me lembrou com sutileza Não importa se sua mãe não lhe sabe Você sabe dela! Não esqueça... Mãe querida, eu sei de você! E se um dia eu souber de sua alma Esteja certa que do fundo de minh’alma Perguntar-lhe-ei uma pergunta ansiosa e calma Eu perguntarei para sua alma Com a rapidez de uma disenteria Perguntarei com valentia e ousadia Perguntarei, perguntarei e perguntarei Cara a cara com a sua alma Com firmeza, eu me lembrarei de perguntar Sem pestanejar, eis o que irei perguntar: Lembra? Lembra? Lembra? Lembra? Lembra? Com Amor, S’Eugênio Felipe 19 de fevereiro de 2011 Data: 13/05/2011 |