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Artigo - O pau cantou e pimenta no olho do outro é refresco

Hiran de Melo

 

Assisti a uma das manifestações do Movimento Passe Livre em Campina Grande.  Nela pude perceber que não é à toa que tem causado tantas perplexidades aos analistas políticos.

 

Passe livre nos transportes públicos no Brasil significa o quê? Primeira coisa: o contribuinte é quem vai pagar todos os custos do transporte para quem desejar, por qualquer motivo, utilizar um ônibus (trem ou metrô e depois, quem sabe, navio, avião...) para o seu deslocamento espacial. Segunda: a qualidade do transporte irá declinar, pois dificilmente o usuário dá valor ao que vem de graça.

 

Vi, nos manifestantes, o contribuinte e/ou seus filhos. Fiquei perplexo, perguntando-me, por que fazer uma manifestação para pagar mais? Mas, eu fiquei de mentirinha! Todos nós sabemos que esta não é a real bandeira da mobilização da classe média brasileira.

 

O Movimento Passe Livre apenas fez o achado de colocar uma contestação na rua no momento da Copa das Confederações. Inicialmente para derrubar um pequeno aumento no preço das passagens, que no futuro seria celebrado como um primeiro grande passo para o conquista do passe livre.

 

Em verdade, para a maioria dos manifestantes não interessa o valor aumentado na passagem, nem mesmo revogá-lo. O momento foi para que todos os gritos contidos se libertassem. A bandeira dessa mobilização não é o Passe Livre e nem outra das demais bandeiras oportunistas, ou não, que se fazem presentes no meio da massa.

 

Na realidade, talvez nem existam bandeiras unificadoras. A meu ver, as que fisicamente aparecem - com este intento - são rejeitadas e, algumas vezes, até rasgadas. O que existe no lugar delas são cartazes, onde cada um diz o que quer ou o porquê de estar ali.

 

Vejo como comum e transparente nas manifestações é a rejeição à classe política brasileira. Nunca antes, como se gabaria Lula, na estória desse País, essa classe tão perversa e debochada recebera tamanha expressão de protestos.

 

A Era Lula-Dilma se caracteriza por “tudo pelo poder”, suas negociações espúrias no Congresso Nacional, para formar a base de sustentação do governo (a governabilidade), são feitas à luz do dia. É o famoso vale tudo, no qual esse grupo político vai além do que Maquiavel sonhou um dia. Refiro-me ao Maquiavel popular, àquele a quem tudo de ruim é atribuído.

 

Na linguagem antiga e religiosa, poderia até dizer que a ideologia da Era Lula-Dilma vai além do que o diabo gosta de oferecer: pão e arena.

 

Por fim: com a popularidade nas alturas, o governo do PT e dos seus aliados (aliciados?) mandou o pau cantar em cima da mobilização, com a convicção de que pimenta no olho do outro é refresco. Então, consequentemente, ela cresceu - ao contrário do esperado pelos temerários debochadores. Quem sabe, caso o pau não tivesse cantado, o Movimento Passe Livre não teria apenas a repercussão das passeatas gay - que são consideradas politicamente corretas e inofensivas aos interesses dos políticos atualmente no poder. Mas, como o pau cantou, a classe média cantou junto: “Acorda amor, chame o ladrão! Chame o ladrão!”

 

Hiran de Melo é professor associado II da UAEE/CEEI/UFCG


Data: 01/07/2013