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Artigo - Focinho de porco não é tomada...

Wagner Braga Batista

 

Na década de 1960, Caio Prado Jr, advogado que se tornou proeminente historiador, elaborou ensaio de grande importância para a interpretação da realidade social brasileira.

Neste ensaio  questionou a lógica reprodutiva, que decalcava modelos de análise aplicados a outros processos históricos. Assinalou que não se prestavam para investigar a dinâmica da realidade brasileira. Com este vezo crítico, debateu com diversos interlocutores,  dentro e à margem de seu campo ideológico. Investiu contra alguns consagrados pressupostos e teorias que situavam nossa formação socioeconômica nos marcos do desenvolvimento do capitalismo em países centrais. Em linhas gerais, por meio de reducionismo, definiam etapas da formação socioeconomica brasileira à luz de esquemas predeterminados que não refletiam especificidades do nosso processo histórico.

O debate provocou cisões na esquerda brasileira.

Este viés crítico, rendeu a Caio Prado, além de processo judicial e condenação, o estigma perpetrado por correntes de pensamento que se julgavam autorreferentes.

Em que pesem os anátemas aplicados a Caio Prado Jr, suas considerações críticas ainda são oportunas..

A fecundidade deste proficiente debate desencadeado pelas suas contribuições ainda é reconhecida e valorizada por intelectuais de diferentes matizes, entre eles, nosso grande amigo e mestre, Raimundo Santos, que se esmera em recuperar estas análises, bem como examinar  seus desdobramentos políticos.

Graças à reprodução de modelos e ao reducionismo da análise social, a investigação da realidade brasileira e de movimentos sociais sofreu distorções e inegáveis prejuizos epistemológicos.

Surge daí uma lição, esquemas de análise muitas vezes facultam a compreensão imediata do objeto de estudo, porém retardam a compreensão de sua complexidade. Pior, podem nos conduzir a uma idéia distorcida do que examinamos.

Conduzir-nos por caminhos fáceis que apresentam intransponíveis barreiras mais à frente.

Os salutares enfrentamentos do passado deram lugar a um silencio inopinado, ao consentimento passivo e à aceitação de receituário que nos mortifica em vida.

Hoje enfrentamos uma nova forma de reducionismo que favorece a adulteração da realidade e a manipulação de expectativas de amplos contingentes da população.

Esta nova performance, impulsionada pelo monopólio dos meios de comunicação é potencializada por novas tecnologias que disseminam simultaneamente, a todo tempo e em todos locais, verdades formatadas ao sabor de conveniências circustanciais.

Transformam-se em informações anestésicas que hierarquizam e distorcem fatos sociais, significativos para a opinião pública.

Hoje, um novo tipo de reprodução, colagem e falsificação entrou em voga.

É exercitado de forma sistemática. Em nome da dissuasão e do entretenimento,  volta-se a inibir a consciencia e a interpretação crítica de fatos sociais ao nosso alcance.

Trata-se da modelagem praticada pela grande imprensa, constituindo pautas que definem  previamente a relevancia de fatos e moldam a realidade social à luz de interesses inomináveis..

Assim, o desarranjo instestinal da cadelinha Fiu-Fiu, o batom fucsia, o bumbum injetado de silicone, a suntuosidade de gadgets, a superficialidade de estilos de vida, as aventuras sexuais de efemerides das efemerides, ganham relevância no imaginário coletivo. Piruetas de membros do exceutivo,   artimnhas do judiciário e falcatruas do legislativo são celebradas como atos de malandragem e sagração. Adquirem maior importancia do que irredutiveis carencias da população brasileira.

O noticiario valoriza mais a criminalidade do que ações edificantes voltadas à criaçâo de  condições de vida que propiciem sua superação.

Estes mecanismos e artificios desviam nossa atenção. Dissimulam padrões de vida e disfarçam a perversidade inerente a estas relações sociais desumanas.

A midia modela a realidade social e nos infunde uma visão adulterada de sua dinâmica.

Nesta quinta-feira, dia 11 de julho, juntamente com a mobilização promovida pelas centrais sindicais de trabalhadores, serão realizadas manifestações a favor da democratização dos meios de comunicação. A pregoando a liberdade de imprensa, monopólios cerceiam a liberdade de expressão. É expresivo que além de receitas e faturamentos obscuros, poucos veículos de comunicação detenham 70% das verbas publicitárias do governo federal, nos primeiros 18 meses da admistraçãod e Dilma Roussef.

Estes organismos, brilhantemente denominados por Otavio Ianni (in memorian) como principes modernos não se limitam a plasmar a opinião pública. Ocupam o lugar de partidos políticos, modelam e instruem, como maquiáveis da modernidade, ações  deletérias de parlamentares, juizes, governantes, entre outros agentes sociais, fundadas em sondagens previamente arquitetadas para legitimar propósitos escusos.

A dissuasão, a manipulação e a adulteração da realidade social promovida pela grande imprensa, passam a integrar como elementos críticos, a pauta de discussão de movimentos sociais presentes na manifestação de quinta-feira.

Esta manifestação, também pode se constituir em novo referencial para as mobilizações em curso no país.

 

Inicialmente, sem prejuízo do reconhecimento dos sujeitos multiplos, legitimamente representados nestas mobilizações sem compleição definida, torna-se precípua a busca da hegemonia .

Esta manifestação pode contribuir para a afirmação de pauta de reivindicações unitária e ampla que canalize este movimento. Sem renunciar ao seu vigor crítico do movimento, pode enfatizar e sinalizar a exigência de programa antiliberal cuja tônica seja o investimento em serviços públicos e a ampliação de direitos sociais.  

Contudo, faz-se oportuna uma advertência. Nem tudo que é estatal é público. Nem todas instituições públicas comportam-se como institutos voltados ao atendimento do público. Nem todos servidores públicos estão a serviço do público. Há muitos que servem apenas a si mesmos.

Portanto, a defesa de ampliação do Estado e de investimentos em saude, educação   impõe criteriosa avaliação de prioridades, de desempenhos e da efetiva destinação de recursos públicos para estes fins.

Esta manifestação deve aprofundar a defesa da democracia.

As forças populares e correntes de esquerda não podem embarcar no oportunismo da direita ao fazer coro com iniciativas golpistas que atentem contra algumas conquistas democráticas.

A democracia liberal, distorcida e limitada, oferece-nos  espaços de intervenção que não devem ser desprezados pelo viés golpista.

Portanto, é preciso oferecer sinalização de um horizonte democrático e consciencioso para movimento que pode descambar no  descontrole e no imponderável.

Inicialmente resgatando contribuições de muitos companheiros que perseguem historicamente estes propósitos. Manifestando nossa irrestrita solidariedade a todos que estão sendo desqualificados e alijados de forma violenta destas mobilizações.

Um movimento supra ou apartidário de compleição democrática não pode se configurar como anti-partidos democráticos.

É necessário aprofundar a democracia direta ao invés de reduzi-la às ambuiguidades e aos malabarismos liberais.

A crítica à desfiguração de instituições democráticas deve estar a serviço do seu aprimoramento e de sua consolidação. É um sério equivoco supor que o desmonte de instituições democráticas favorecera o avanço do socialismo.

As mobilizações podem revitalizar a democracia, ampliar e promover direitos sociais, bem como anunciar para parcela facciosa da grande imprensa, para governos anti-populares, parlamentares corruptos e inescrupuloso membros do poder judiciário que focinho de porco não é tomada...

Vamos fazer valer os direitos da população brasileira.

 

Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG


Data: 09/07/2013