Artigo - Um fantasma ronda o ralo de nossos sanitários Wagner Braga Batista Em 1948, Marx e Engels, dois jovens apaixonados, anunciavam para o mundo que um espectro assolava a Europa: o fantasma do comunismo. As revoluções que seguiram encarregaram-se de exorcizar o fantasma e libertar o comunismo dos pedestais e do gesso das determinações históricas. O comunismo transformou-se num menino lépido, que hoje transita pelo mundo como uma resistente e frágil esperança. Transfigurado em utopia, morre e renasce como a vida humana em condições adversas. Como a justiça social, que fica sempre a nos dever pelo que suprimem de nossas vidas. Em meio a fantasias, hoje enfrentamos novos temores e fantasmagorias. São fantasmas pós-modernos que afloram de nossos sanitários. Porém nem todos temem estes fantasmas, a exemplo de duas mulheres cubanas . (1) Chegaram ao Brasil, segundo seus colegas de profissão, para se locupletar, violar o direito ao trabalho de médicos nativos e trair o juramento de hipócritas. De barco, deslocaram-se durante 18 horas. Estranharam o entorno. Nunca haviam visto casas de palafitas e crianças pedindo esmola na beira de rios. Pisavam onde nenhum médico, até o momento, ousara chegar. No eldorado de Melgaço, o municipio na ilha de Tapajós com o pior IDH do país. Lá não existem fantasmas pós-modernos. Também não existe saneamento. - Não os rios que desaguam no mar? Para quê? Certamente indagaria a vistosa cidadã que há poucos dias interpelara um negro que chegara ao Brasil para prestar serviços de saúde à população. Justificou-se, a seguir. - Não tinha aparência de médico. Os médicos, aparentemente, estão em Brasilia. Brasilia dispõe do melhor Indice de Desenvolvimento Humano-IDH do país. Pode-se dizer que a eficiência domina a capital da promiscuidade e exuberante promiscuidade do capital no berço da corrupção nativa. Esta cidade sem indústria responde pelo nono Produto Interno Bruto do país. Apresenta a maior renda per capita, formada quase que excludivamente pelos salários do funcionalismo. Continua sendo a maior produtora de dejetos invisiveis e invioláveis no país. Portanto, não há um resíduo sequer, nenhum vestígio de imundície ou corrupção à vista. Nesta cidade onde impera e transita a licenciosidade, pode-se dizer com júbilo que o povo é fino e educado. Todo esgoto é tratado. Diversamente do povo que habita sua periferia. Ali não moram fantasmas. O medo é contingente e efetivo. É fruto das injunções do dia a dia. Das relações iniquas que transbordam do centro do capitalismo civilizado para a barbarie de suas periferias. Em Brasilia, no entanto, apesar do circulo virtuoso de benesses e de exclusão social, seus habitantes vivem aterrorizados. Na Noruega candanga todas as residencias possuem sanitários. Portanto estão sujeitas a invasão de fantasmas que rondam os ralos da capital. Em meio à ofensiva do capitalismo civilizado, novos fantasmas rondam tubulações e redes de esgotos. Pelos ralos, invadem ambientes privados. O comunismo já não intimida ninguém, porém o capitalismo civilizado tomou a ofensiva e a todos nós amedronta. A compettividade, a espoliação corrriqueira e a obtenção de vantagens tornaram-se imperativos morais da nossa cultura. Regras indispensáveis que instruem relações sociais de iniquidade. Que recriam e aprofundam fossos, inimagináveis, de desigualdades Em pânico, a classe média vê-se acometida de um furor insuportável. Teme ser retirada de seu AP, da comodidade de seu sofá, da segurança dos jornais da Globo e dos idílios administrados pelo marketing. Exaspera-se com a perda da sua passividade e se angustia ante à iminencia de ser alijada definitivamente dos salários, do emprego e ser jogada na periferia. Depois da falência do fim das ideologias, do irrenconciliável choque de civilizações, de rocambolescos paradigmas, a midia impoluta vê-se resignada a contemplar suas catástrofes e o desmoronamento de seus mitos. Reconvoca a História para legitimar a ética excludente e exorcizar fantasmas, que emergem dos ralos do capitalismo civilizado. 1- Parece que estou sonhando”, diz cubana que vai enfrentar o pior IDH, Viomundo URL: http://www.viomundo.com.br/politica/navegando-no-rio-amazonas-parece-que-estou-sonhando-diz-medica-cubana-que-vai-enfrentar-o-pior-idh-do-brasil.html acessado em 24 de outubro de 2013
Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG Data: 25/10/2013 |