topo_cabecalho
ARTIGO - A UFCG, o HUAC e a Ebserh

José Edilson de Amorim*

 

A comunidade precisa conhecer um assunto de absoluto interesse da população paraibana: a adesão da UFCG à Ebserh – Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares – criada pelo governo federal para administrar, juntamente com as universidades, os seus hospitais universitários. É sobre este assunto que passamos a refletir.

 

A criação dessa empresa pública, com recursos e gestão totalmente estatal, se deu porque a crise nos hospitais universitários de todo o país é profunda – falta pessoal, faltam instalações e equipamentos, falta controle eficiente. Tudo isso tem levado os hospitais a não prestarem bem os serviços que contratam com os municípios por meio do SUS.

 

A população foi quem primeiro denunciou a precariedade dos hospitais universitários; o governo reconheceu a situação e, assumindo para si a autocrítica do Estado brasileiro, se propõe a contribuir com as universidades oferecendo um modelo de gestão compartilhada para os hospitais.

 

Este novo modelo começa com uma análise criteriosa da demanda da população e da capacidade de atendimento dos hospitais para, a partir daí, fixar o pessoal necessário a ser contratado por concurso público para cargo efetivo; continua com o estabelecimento das dimensões tecnicamente corretas e a definição dos equipamentos indispensáveis à necessidade e à qualidade dos serviços que um hospital de assistência e de formação profissional deve oferecer.

 

A situação do nosso HUAC – Hospital Universitário Alcides Carneiro – não é diferente da situação dos demais hospitais universitários do país. Por isso mesmo que estamos retomando o diálogo buscando nossa adesão ao novo modelo de gestão proposto pelo governo federal.

 

Foi com essa disposição que, em setembro de 2013, nos reunimos com o Presidente do Conselho Municipal de Saúde, com a Secretária de Saúde do município de Campina Grande e com a Diretora do HUAC, comunicamos que iríamos retomar a discussão sobre nossa adesão, iniciando por solicitar ao Conselho Deliberativo do hospital que rediscutisse a questão; este conselho não incluiu o assunto em sua pauta.

 

Com essa recusa, em dezembro de 2013 levamos a questão ao Colegiado Pleno da nossa universidade. A reunião deste conselho superior foi tomada por militantes sindicais e estudantis contrários ao novo modelo de gestão, criando-se um clima absolutamente inapropriado para o diálogo que orienta as decisões deste conselho.

 

Aqui, é preciso situar o equívoco sectário que inviabilizou a reunião aludida: primeiro, os serviços a serem prestados pelo HUAC continuarão, total e integralmente, no âmbito do SUS e sem a interveniência de qualquer plano ou empresa privada de saúde; depois, serão contratados, por concurso público e em caráter efetivo, mais de duzentos servidores para o hospital. Então, o que muda, de fato, a ponto de provocar tão forte reação de estudantes e sindicalistas? A única mudança substantiva é que o contrato de trabalho, em vez de se dar de acordo com o RJU, Regime Jurídico Único, que regulamenta a vida funcional dos atuais servidores, passará a se dar, para os novos servidores, de acordo com a CLT, Consolidação das Leis do Trabalho, conforme a imensa maioria dos trabalhadores de todo o país.

 

Ora, aqui cabe uma pergunta – os profissionais de saúde não podem ser regidos pela CLT, com sua carteira de trabalho assinada, como os demais trabalhadores? Pensamos que sim.  É justo criar um regime especial para esses profissionais? Pensamos que não. As condições gerais de trabalho devem amadurecer e melhorar para todos os trabalhadores indistintamente.

 

Ser contrário, portanto, à melhoria dos hospitais e à contratação de mais pessoas tornou-se uma decisão política que terminará se voltando contra as necessidades da população; com essa atitude, os sindicalistas e os estudantes pensam estar se afastando à esquerda, mas acabam se encontrando com a direita mais reativa e conservadora; isso porque, em sua leitura juvenil da dialética, eles se esquecem de que o mundo da política também é redondo. Para usar uma imagem bastante conhecida na argumentação política, os sectários jogam fora a criança junto com a água do banho, ou seja, junto com a crítica infantil ao governo prejudicam a população que continuará com menos e mais precário atendimento.

 

O militante incauto e desavisado se contenta com a palavra de ordem e com o panfleto; mas o gestor público tem a responsabilidade de ler o texto inteiro em sua relação histórico com o contexto em que foi concebido. Nessa leitura, não pode faltar um cotejo histórico com nosso passado recente, que os sindicalistas sequer consultam no caso em apreço. Se consultassem, comprovariam que estivemos à beira da privatização dos serviços de educação e de saúde; numa situação em que os hospitais universitários foram levados à penúria em que se encontram.

 

Toda esta reflexão, aqui desenvolvida, não foi possível ser feita; os nossos conselheiros foram impedidos de expressar sua opinião e seu voto; os militantes sindicais e estudantis ocuparam espaço da reunião que se realizaria em 20/12/13 e promoveram sua inviabilização. Pensamos que os militantes têm todo o direito de se manifestarem, contrariamente ou não, ao modelo de gestão hospitalar em apreço; mas não têm o direito de impedir a manifestação dos que são favoráveis ao novo modelo porque são favoráveis à melhoria e à ampliação da assistência à saúde.

 

Ademais, a maioria dos conselheiros sabe dos prejuízos que a população paraibana terá se a UFCG não aderir ao modelo de gestão criado com a Ebserh: a) não conseguiremos ampliar e nem melhorar os serviços do HUAC de acordo com a demanda e a necessidade da população paraibana; b) perderemos o Hospital Materno-infantil Júlio Bandeira porque não conseguiremos completar sua transformação em hospital federal vinculado a nossa universidade; c) perderemos a oportunidade de construir mais um hospital universitário com capacidade para 200 leitos e com 24.000 m².

 

A repercussão positiva de um hospital com as dimensões acima referidas, no interior do Paraíba, é incalculável, diminuindo a pressão por assistência em cidades maiores como Campina Grande e João Pessoa, levando assistência ao interior do Estado, criando oportunidade de empregos para cerca de 800 pessoas.

 

Uma ação dessa magnitude significa mais presença do Estado, mais presença do setor público em uma região que mais carece dessa presença. Não devemos perder uma oportunidade de desenvolvimento social como esta, sobretudo quando a população nas ruas está exigindo cada vez mais medidas do governo federal para ampliar e melhorar os serviços de saúde e de educação.

 

A Ebserh não é uma ONG, não é uma OS, não é uma OSCIP; não é, portanto, uma organização efêmera subordinada a interesse circunstancial. A Ebserh é uma instituição pública federal vinculada ao Ministério da Educação.

 

Portanto, cumpre advertir os militantes sindicais e estudantis de que “não basta ler Marx, é preciso estar atento aos sinais das ruas”. E os sinais das ruas ensinam muito mais do que a palavra de ordem de interesse marcadamente partidário, circunscrita a uma leitura parcial e interessada da conjuntura. As ruas criaram uma hipersensibilidade voltada para a maior presença do Estado no interior da sociedade.

 

Não vamos jogar fora esta oportunidade histórica em que o gesto do governo federal se encontra com o desejo das ruas.

 

* José Edilson de Amorim é reitor da UFCG.


Data: 14/01/2014