topo_cabecalho
Nível de inglês no Brasil é baixo e país fica em 38º em ranking

Estudantes brasileiros fizeram parte de estudo que contou com 60 países

 

Até os 24 anos, os conhecimentos de inglês do analista contábil Thiago Orgélio (foto), hoje com 28, não iam muito além do verbo "to be". Ex-aluno de uma escola pública da zona sul de São Paulo, ele conta que pouco aprendeu. "Passei os três anos do ensino médio vendo os mesmos conteúdos", lembra. Após concluir a graduação em Ciências Contábeis, ele decidiu que era hora de correr atrás do tempo perdido e se matriculou em um curso de inglês. Hoje faz aulas particulares duas vezes por semana na empresa em que trabalha.

 

Assim como o Orgélio de quatro anos atrás, o nível de proficiência em inglês da maioria dos brasileiros é baixo. É o que mostra o Índice de Proficiência em Inglês, um estudo feito pela Education First, uma rede de escolas de idiomas e programas de intercâmbio presente em 55 países. Segundo o índice, que está na terceira edição e analisou testes de 750 mil pessoas ao redor do mundo, o Brasil tem proficiência baixa em inglês, ficando na posição 38 do ranking, que conta com 60 países.

 

Na mesma faixa do Brasil, estão países como Irã, Sri Lanka e Egito. Entre os latino-americanos, os brasileiros ficam atrás dos argentinos, uruguaios e costa-riquenhos. A Argentina figura na faixa de proficiência moderada e é a nação latino-americana mais bem colocada. Mesmo tendo subido oito posições em relação ao último levantamento e passado da proficiência muito baixa para a baixa, a situação do País ainda é preocupante, segundo Luciano Timm, diretor de marketing da EF no Brasil.

 

"O ganho de renda do brasileiro produziu resultados no aprendizado, pois a nova classe média passou a ter acesso a cursos particulares de inglês. Mas a situação nas escolas pouco mudou nos últimos anos. A qualificação dos professores ainda é baixa, o inglês é visto como uma disciplina menos importante e as aulas são focadas apenas na gramática, por conta do grande número de alunos por sala", afirma.

 

O inglês ensinado na escola é de fato o grande gargalo para que a proficiência do idioma melhore no Brasil, segundo especialistas da área. "Só agora o ensino de inglês está realmente virando uma pauta do Ministério da Educação, que, finalmente, está olhando com mais seriedade para essa questão", afirma Marcelo Barros, presidente da Braz-Tesol, a maior associação de professores de inglês do País.

 

A grande quantidade de escolas de idiomas no Brasil - são mais de 6 mil filiais de 70 redes - deve-se, segundo Barros, justamente à deficiência do ensino da língua no ensino regular. "Essa configuração não existe em nenhum outro lugar do mundo. Não existem grandes redes de franquias, apenas centros binacionais para o ensino de línguas", diz. Ele mesmo é diretor de educação do CNA, uma das maiores redes do País. "Só tenho emprego porque o governo não está fazendo o trabalho dele."

 

No entanto, para Walkyria MonteMór, professora do Departamento de Letras Modernas da USP, é possível aprender inglês na escola pública. "Precisamos de uma outra proposta, que inclua uma formação mais adequada dos professores, mas também é necessário repensar a função da língua estrangeira", diz.

 

Apostas

 

Para melhorar o nível de inglês de seus alunos, algumas redes de ensino estão trabalhando em duas frentes: aumentar a exposição dos estudantes à língua e qualificar os professores, considerada a ação mais urgente pelos especialistas. "Não se aprende inglês na faculdade de Letras", diz Marcelo Barros.

 

Para melhorar a qualificação dos docentes, as Secretarias Municipal e Estadual de Educação oferecem vagas em cursos organizados em parceria com instituições como Alumni e Cultura Inglesa. Só o Programa de Formação Contínua de Professores de Inglês da Rede Pública, da Cultura Inglesa, desenvolvido em parceria com a PUC-SP, já atingiu mais de 5,9 mil docentes desde 1995. A rede municipal afirma ainda promover cursos de formação internos para cerca de 400 professores anualmente.

 

Com o objetivo de aumentar a exposição dos alunos à língua, a rede municipal adiantou a idade em que os alunos começam a ter aulas de inglês. Antes presente apenas no ensino fundamental 2 (da 6.ª à 9.ª série), o inglês está desde 2012 também nas séries iniciais. "Percebemos que era importante promover o contato com a língua o quanto antes, para que o aluno da escola pública tenha as mesmas condições e oportunidades daquele que estuda em escola particular", afirma Christiane de Souza, da Divisão de Orientação Técnica de Ensino Fundamental e Médio da Secretaria Municipal de Educação.

 

Nas escolas do Estado, uma iniciativa parecida está sendo implementada: desde 2013, um grupo de 1,5 mil estudantes dos primeiros anos do fundamental faz parte de um projeto-piloto que oferece inglês para essa faixa etária.

 

Copa do Mundo

 

Em ano de Copa do Mundo, a falta de proficiência do brasileiro na língua inglesa tem preocupado autoridades e organizadores do evento. "A empresa que contrata motoristas para acompanhar as delegações está tendo uma dificuldade enorme para encontrar profissionais bilíngues. O caso mais emblemático é o de Cuiabá. Estão até cogitando encher um ônibus de motoristas de São Paulo e mandar para lá", conta Barros. O salário para função, segundo ele, pode chegar a R$ 12 mil líquidos por 45 dias.

 

Mesmo com a proximidade do evento e das Olimpíadas de 2016, especialistas consideram que a visão do brasileiro em relação à importância do inglês ainda não mudou o suficiente.

 

"Há uma conscientização, mas não existe ação. E qualquer ação não poderia ocorrer apenas um ano antes do evento. Ninguém vai aprender inglês para a Copa, isso não existe. O inglês varia de acordo com a realidade de cada um. Não há boas iniciativas institucionais e a população não está mobilizada para estudar inglês", diz Vinícius Nóbrega, gerente acadêmico da Cultura Inglesa.

 

Ciência sem Fronteiras

 

O programa encontrou obstáculos justamente na baixa proficiência de inglês dos brasileiros. Em 2012, um em cada cinco dos inscritos no programa optou por tentar intercâmbios em Portugal, pela facilidade com o idioma. O resultado foi um grande número de candidatos a intercâmbio no país, o que fez com que o governo cancelasse as bolsas para instituições portuguesas. Parte dos alunos já selecionados foi enviada aos EUA. É o caso do estudante de agronomia Álisson Lander, de 25 anos.

 

Desde setembro na Illinois State University, ele está apenas estudando inglês. "Provavelmente não vou ter tempo de fazer o estágio que estava previsto", diz. Segundo a Capes, 11% dos alunos que vão para países de língua inglesa têm de estudar o idioma antes do início das atividades acadêmicas.

 

(Estadão)


Data: 25/02/2014