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ARTIGO - Agora somos um só?

*Wagner Braga Batista

 

Em números, a FIFA  é mais abrangente do que a ONU. Agrega mais federações de futebol do que países alinhados à Organização das Nações Unidas.

 

Seu poder de dissuasão é enorme. Graças às paixões, ao envolvimento e à visibilidade proporcionada pelo futebol, desperta atenções em todo mundo.  Sugere a idéia da diversidade política, cultural, religiosa e étnica, bem como o pressuposto de que o futebol não gera iniquidades e nem estabelece diferenças entre classes sociais. Esta mitologia, gerada pelo futebol, confere-lhe importância impar em plataformas políticas e em estratégias de mercado.

 

Apesar das inúmeras irregularidades e atos de corrupção, que compõem seu memorável currículo, a FIFA se mantém incolume, ao abrigo de sanções, sediada num país que conquistou sua neutralidade em conflitos internacionais por se destacar pela falta de neutralidade em assuntos financeiros. Na sua agenda as finanças e a especulação têm precedência sobre todas temáticas e direitos sociais.

 

No âmbito financeiro, não há isenção, prevalece o rigor do sigilo e o protecionismo de operações sigilosas. Isto mesmo, o manto do protecionismo, tão questionado pelos arautos da globalização, é sua blindagem. Neste paraiso, a Suiça, FIFA se esconde e ostenta sua operacionalidade.

 

Sua capacidade de intervenção pode ser aquilatada pela capacidade de submeter governos e poderes republicanos. Suas proezas equiparam-se às estratégias multilaterais conseguindo dobrar resistências. Fazendo imposições, acatadas solenemente para a realização de eventos futebolísticos em paises que se proclamam soberanos. Por conta da sua maestria em promover mudanças na legislação, a adoção de condutas, que contrariam a cultura política de nações, em intimidar governos, entre outras ações transgressoras, a FIFA deveria ser cultuada pelos anarco-capitalistas, pelos black-blocs e por este pessoal que gravita entre o golpismo e o DEM.

 

Afinal, graças ao seu aclamado  soft power e ao seu modus operandis, a FIFA tornou-se a imagem e o maior instrumento da globalização, da expansão mundial da economia de mercado, da eliminação de barreiras tributárias, da desregulamentação de direitos, da instauração de privilégios abusivos, da habilidosa instituição da sobrerania compartilhada, tào sonhada pela diplomacia de FHC.

 

A Copa do Mundo, no Brasil, saudada entusiasticamente pelo camarada Lula e pelo então Ministro do Esporte, veio acompanhada do anúncio de austeridade. Do epíteto  que não implicaria em gastos públicos. Disseram que os investimentos seriam feitos por empresas que, direta ou indiretamente, se beneficiariam do evento. Que sua realização desdobrar-se-ia no reconhecimento e na ampliação de direitos inadiáveis.

 

Pelo visto, apesar dos envidamento da União, da transferência de recursos públicos para empresas privadas, de financiamentos questionáveis realizados pelo BNDES, de  estádios superfaturados, dos elefantes brancos faraônicos plantados em todo país, que reeditam estratagemas da ditadura, das obras inacabadas, da falta de mobilidade urbana, do preço abusivo dos ingressos que expulsam o povo dos estádios, entre tantas mazelas, ficamos a ver navios. Não à beira do caís, mas à beira do fosso. Ou melhor, no fim do túnel.

 

No negrume, os cara-pálidas, que não nos reconheciam e não nos reconhecem, mostram-se convidativos.

 

Aí, defrontamo-nos com o desfecho desta estória bizarra: Privatizaram os lucros e, agora, convidam-nos para socializar os prejuízos pendentes.

 

Na hora de pagar a conta, os habituais artífices da exclusão social, dizem-se generosos e se mostram ufanistas:

 

Agora somos um só! Vamos torcer pelo time da CBF.

 

* Professor aposentado da UFCG


Data: 03/06/2014