topo_cabecalho
Artigo - Tudo começa num ponto: Kandinsky no Brasil

Wagner Braga Batista*

 

O Banco do Brasil está patrocinando exposição do pintor russo Wassily Kandinsky: Tudo começa num ponto (  1866 -1944). É a primeira vez que 72  trabalhos originais deste autor e de outros pintores russos da transição do século XX são expostos na América Latina e no Brasil. Reune pinturas sobre diferentes superfícies, litografias, fotografias, objetos de uso corrente e riquissimo acervo de costumes da época. A mostra  percorreu as cidades do Rio de Janeiro, São Paulo, Brasilia e, ora, encontra-se em Belo Horizonte.

 

Talvez, a primeira menção à Kandinsky tenha sido feita por Onofre Penteado, na Escola de Belas Artes, da UFRJ. Onofre foi um dos poucos bons professores que escaparam à degola do AI 5, que aposentou forçosa e prematuramente Abelardo Zaluar, Quirino Campofiorito e Mario Barata. Formalista e espiritualista buscava nas teorias e experimentos de Kandisnky motivações para seus próprios trabalhos artisticos e pedagógicos.

 

Pelas suas mãos tive acesso ao livro, Do espiritual nas artes ( 1912). Este texto integra a fase de amadurecimento, durante a qual Kandinsky subdivide suas obras em impressões, composições e improvisações.

 

Pouco tempo depois, quando estudante de Desenho Industrial, retomamos licões de Kandinsky, em sua fase racionalista, por meio de exercícios de metodologia visual, desta feita recorrendo às elaborações contidas em “Ponto e linha sobre o plano”, escrito durante sua permanência na Bauhaus (1926), na qual realiza atividades desde 1922 . Consoante com as pulsões da arte moderna, encanta-se com o construtivismo. Deixa de lado o sentido descritivo das linguagens figurativas e passa a explorar recursos constitutivos da própria linguagem das artes plásticas. Sem desprezar o estudo de métodos de representação, dedica-se à especulação e utilização de elementos construtivos da forma, pontos, linhas, planos e relações entre as cores.

 

Portanto, para nós, o contato com trabalhos originais deste estudioso da linguagem gráfica e motivações pictóricas foi bastante sugestivo, apesar do hiato que separa o encantamento juvenil da percepção de suas obras em idade senil.

 

A exposição é um painel de escolas, correntes e tendências pictóricas que se desenvolveram na Europa na transicão do século XIX.  Reune obras de pintores russos (Acervo do Museu Estatal Russo de São Petersburgo) que integraram o círculo de relacionamento de Kandinsky.

 

Inicialmente influenciado pelas culturas primitivas e pela religião, trabalho  com tempera em madeira recorrendo a temas nativos. Aos poucos, municia-se com conhecimento teórico e incorpora a sua pintura novas técnicas e recursos materiais. Contemplado com bolsa de estudos na Alemanha, entrará em contato com outro universo cultural e absorverá elementos das principais correntes artísticas do final do século XIX, a exemplo do  expressionismo, do impressionismo, até enveredar pelo abstracionismo e pelas improvisações, que dão corpo a visão mística e surreal da realidade.

 

A composição de arranjos formais abstratos valem-se de estímulos proporcionados por novas linguagens emergentes, entre as quais, a música dodecafônica, da fotografia minimalista e do cinema expressionista, que rompiam com padrões clássicos e romanticos das artes a passagem do século XIX.

 

Sua arte é convergente e se mostra cada vez mais racionalista no tocante à elaboração dos elementos pictóricos culminando com a tentativa de fusão dos processos de criação na perspectiva da síntese e da industrialização das artes, que redundaram na objetividade da Arquitetura e do Desenho Industrial, intentada pela Bauhaus. Lamentavelmente, esta fase é pouco contemplada na mostra. Constitui uma lacuna na apresentação da trajetória do autor, uma vez que é contemplada apenas pela exposição de um jogo de xícaras de autoria de Kandinsky.

 

Com o fechamento da Bauhaus, em 1933, pelos nazistas, acompanhando o exilio forçado de seus integrantes, Kandinsky migra para Paris, onde irá falecer em 1944.

 

Porém, além da exposição de Kadinsky, o Centro Cultural do Banco do Brasil nos reservava uma outra auspiciosa surpresa, que será objeto de outro artigo.

 

* Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG

 

As afirmações e conceitos emitidos em artigos assinados são de absoluta responsabilidade dos seus autores, não expressando necessariamente a opinião da instituição.


Data: 21/05/2015