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ARTIGO - O ódio e a vingança batem a nossa porta

Wagner Braga Batista

 

Neste país todos têm direito de se dizer direitos, até o momento que aqueles que se dizem direitos lhe impeçam de exercer este direito.

 

 Nos ultimos dias, juizes e policiais, seletivamente, impuseram ao seu modo, sua visão peculiar de direito. Deste modo, transformaram a privação da liberdade, baseada na presunção de culpa, em método de coação para obter indícios e provas de crimes, que a investigação policial se mostrou incapaz de lograr. Coação e constrangimentos utilizados para incentivar delações são procedimentos questionados por entidades de magistraados, entre elas a OAB.

 

Apresentadas como provas inquestionáveis, são extraídas de pessoas abjetas, em troca de co-autores de suas falcatruas. Submetendo seus pares à situação vexatória, procuram restaurar direitos que ilegalmente lhes foram subtraídos. Estas ilicitudes e abusos, violações de direitos elementares, ora são festejadas pelo senso comum como o eram o pão e o circo no Coliseu.

 

Entre a fogueira e a graça de homens que se dizem direitos detendo a prerrogativa de sonegar direitos aos que não têm direitos, transitam não só delatores emergentes. Transitamos todos nós. Peregrinando por esta selva onde nos condenam por aquilo que fizeram e fazem de todos nós.

 

O ódio e a vingança batem a nossas portas. Cobram obediência ao poder, o dízimo a ser pago aos que intermediam favores  e obtêm a graça dos que mandam. Estão em governos, nos parlamentos e judiciário. Distribuem-se em funcões estratégicas, que lhes permitem identificar e selecionar quais serão os hereges premiados. Quais serão levados à fogueira.

 

Há leitura e citações que, apesar de vivermos sob Estado laico, oferecem salvo conduto e privilégios na Câmara Federal. Nelas,  há dois personagens distintos: Barrabas e Judas. Entre eles, uma grande distância. Um foi salvo da fogueira pela turba ensandecida que, em tese, declinava do amor e celebrava o ódio à humanidade. Graças ao obséquio deste senso comum, cultuado pelos atuais princípes de ofício, Jesus foi cruxificado.

 

A salvação de Judas não se deveu à graça do senso comum. Foi opcional. Traiu por trinta moedas, tal qual os donos do Petrolão. Integrantes de cartel de empreiteiras que expropriavam recursos de empresa estatal corrompendo seus dirigentes e políticos responsáveis pelas suas indicações. Estes são prepostos de um poder diversificado e amplo que habita em quase todo lugar. Desde pequenino municipio ao Governo Federal: o poder da corrupção.

 

Paradoxalmente, os Judas do Petrolão, que se transformaram em delatores premiados, ao invés de promover a defesa de direitos comuns, com sua prática degradante, consagram o senso vulgar.  Recorrem a expedientes ditados pelos principes modernos, a grande imprensa, para viabilizar sua empobrecida derivação maquiavélica, sedimentada no senso comum. Livram-se da fogueira em que serão consumidos seus pares. Igualmente aos que são violentados por arbitrariedades dos que anulam direito elementar de todo ser humano: não ser culpado até prova em contrário.

 

Hoje, o ódio e a vingança batem a nossa porta, chegam a nossa casa pela televisão. Tornam amarga nossa comida, conspurcam nossa consciência e nos cobram réus para seu fastio: trabalhadores precarizados, mulheres violentadas, negros marginalizados, homossexuais discriminados e menores criminalizados.

 

Oferecendo vidas para espetaculosa fogueira, os Judas modernos, reconvertertidos, e salvos do inferno em que se encontravam, são ungidos pelos Torquemadas da vez.  Súbito transformam-se em heróis ao oferecer mais gente para a fogueira.

 

Neste contexto, entra em pauta a questão da menoridade penal.

 

A temática da menoridade penal não está apenas vinculada a juízos de valor, envolve também grandes interesses e investimentos. Mobiliza empresas e agencias que financiaram campanhas de parlamentares e hoje cobram compromissos celebrados às escuras, em gabinetes, com representantes da indústria armamentista, de empresas de segurança, de empreiteiras interessadas na construção de presidios, entre outros. Temáticas que deveriam estar limitadas à observância de direitos humanos são subvertidas por negócios escusos e vantagens inconfessáveis.

 

Este é o fogo que chega à fogueira montada pelo ódio, pela ardilosa vingança e pelo financiamento privado de campanhas eleitorais. Que faz arder a lenha, luzir esta cultura corrosiva e celebra a promiscuidade política. Que destrói a vida de trabalhadores, mulheres, negros, homossexuais e adolescentes. Que corrompe direitos sociais com  motivações solertes.

Duas noticias se casam nesta quinta-feira. De um lado, o superfaturamento de R$ 41 milhões, denunciado na construção de presídio em Minas Gerais, durante o Governo Anastasia. De outro, a manobra do achador-mor, que supõe direitos humanos reservados apenas a homens direitos.

 

Sem nenhum prurido, o achacador-mor passou por cima do artigo 5º da Constituição Federal, empregada para votar novamente a redução da inimputabilidade penal de menores. Em menos de 24 horas, duas dezenas de subdeputados mudaram seu voto. Pagaram o dízimo cobrado pelo achacador-mor e farão jus à graça daqueles que alimentam o fogo do inferno, anunciam ódio e vingança na porta de nossas casas em paralelo ao financiamento privado de suas campanhas eleitorais.

 

Talvez sejam estes os móveis da súbita mudança de opinião dos subdeputados em projeto de lei afeto aos direitos humanos.

 

Apesar de advertências da UNICEF, da Anistia Internacional, de entidades de direitos humanos e do atual  Ministro da Justiça, entrega  lenha, nomes e vidas para a imolação na fogueira dos espetáculos hediondos e dos grandes negócios. O achacador-mor cumpre seu papel, alimenta o fogo e o senso comum.

 

Restaura e moderniza o desempenho daquele que traiu por trinta moedas.

 

Da Paraiba, apenas dois deputados votaram contrários à redução da idade da inimputabilidade penal, Luiz Couto e Damião Feliciano.

 

* Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG

 

As afirmações e conceitos emitidos em artigos assinados são de absoluta responsabilidade dos seus autores, não expressando necessariamente a opinião da instituição

 


Data: 03/07/2015