ARTIGO - As peladas e Teilhard de Chardin Wagner Braga Batista* Uma crônica de Carlos Heitor Cony, intitulada “Evolucionismo cristão”, publicada na Folha de São Paulo (07 de julho de 2015), remete-nos a Teilhard de Chardin. Pensador católico e humanista, questionado por diversas correntes da igreja e da esquerda, inspirou emergentes movimentos sociais de jovens na metade do seculo XX, bem como o Concílio Vaticano II e a encíclica de João XXIII, Pacem in Terris. Suas elaborações ainda são bastante atuais, têm muito a dizer a religiosos e a esta gente agnóstica e profana, como nós, sobre ecumenismo e sociabilidade laica. Acrescente-se, o nosso estimado Francisco, Papa Pop, muito tem contribuído com estas causas, empenhando-se em agregar interlocutores de vários credos e derrubar barreiras que segregam seus fiéis. Cony assinala a convergência teilhardiana centrada num simples axioma de grande significado para toda humanidade: ser mais é unir-se cada vez mais. Voltando ao mundo profano, hoje vamos falar de atividade gregária, que refuta discriminações de qualquer natureza. Sua denominação, aparentemente chula, supõe-se que decorra dos terrenos áridos nos quais é praticada ou do móvel de suas disputas, a pela, diga-se a bola. Conhecidas como peladas, rachas ou babas, estas partidas futebolisticas são reconhecidas pela gratuidade do jogo e pelo pouco que cobram, apenas o suor na camisa,. Disputadas indistintamente pela plebe e pela elite são envolventes e solidárias. Não pedem curriculos vitae, carteiras de identidade, atestados de antecedentes ou extratos bancários. São eventos universais e universalistas. Peladas são demonstrações cabais que a convivência pacifica se sobrepõe a toda sorte de intempéries e conflitos. Contrariamente ao que apregoam emuladores do ódio, da vingança e da restauração liberal, as peladas se apresentam como generosas revisões históricas do determinismo, que condenavam a humanidade às botinadas, às humilhações, ao cinismo e à sistemática luta das elites contra a emancipação das camadas subalternas. Diferentes dos embates, engendrados pelo marketing esportivo e pelo tráfico de influência de dirigentes de clubes, que mobilizam contratos faraônicos, a escravidão de atletas e torcidas organizadas para batalhas fraticidas em defesa de empresas privadas corruptas, as peladas são suas corruptelas. Como reza a tradição, são disputas amistosas, que se encerram quando o jogo termina. Peladas domicais são incontestáveis provas da sociabilidade e universalidade dos seres humanos. Diga-se, principalmente de brasileiros, povo gregário por natureza. Após animosidades e chingamentos durante a partida, as batidas cardíacas voltam ao normal, a pressão se estabiliza e o preciosos gás dos pulmões cansados destina-se apenas restaurar o folego para animar a conversa jogada fora, após a disputa. Peladas, rachas ou babas, como queiram, jogadas onde sejam com que for, são eventos indispensáveis à vida humana. Ninguém pode se pretender universal sem ter pisado num campo de várzea, perdido uma unha do pé numa dividida, festejado um gol perdido pelo adversário e abraçado ardorosamente um companheiro de equipe pela vitória suada. As peladas nos ensinam a driblar adversidades da vida. A unir cada vez mais. As peladas e Teilhard de Chardin têm muito a dizer à comunidade universitária neste momento delicado de greve. * Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG As afirmações e conceitos emitidos em artigos assinados são de absoluta responsabilidade dos seus autores, não expressando necessariamente a opinião da instituição Data: 07/07/2015 |