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Artigo - A cortante linha chilena

Wagner Braga Batista*

 

Nas ruas das metrópoles, a voz corrente é que uma ameaça nos chega do Chile.

 

Desde o colapso do consórcio ultraliberal de Pinochet com Milton Friedman, nào se ouvia falar de linha chilena.  Mais eis que aporta em nosso país uma nova ameaça. Afiada como a sintonia de sicários, livres para corromper e seviciar, com defensores da coerção em benefício da liberdade do mercado. É a cortante linha chilena, que se dissemina às escuras. Prospera em mercados clandestinos como manobras golpistas financiadas por grandes grupos economicos no Brasil.

 

A linha pirata é perigosa. Parece-se com a que instruiu pioneiro laboratório de atrocidades a serviço da expansão mundial da economia de mercado. Cortante, ameaça a integridade fisica de todos que transitam pelas ruas das cidades. Assim como o alinhamento de sicários e liberais sempre infligirá graves à sociedade, à cidadania e à democracia .

 

Falemos da matriz da linha cortante. A linha mestra do neoliberalismo corrompeu e minimizou o aparelho de Estado para propiciar a privatização da economia e a transferência de patrimônio público para grandes grupos economicos. Eliminou políticas sociais, desregulamentou e anulou direitos trabalhistas. Ofereceu plenas condições para a mercantilização de serviços públicos essenciais, financiando e desonerando empreendimentos privados em saúde, educação, comunicações, entre outros. Extinguiu mecanismos de proteção a investidores internos, favorecendo a internacionalização e a destruição de recursos estratégicos. Valorizou atividades financeiras e especulativas em detrimento de setores produtivos. Em síntese, subordinou políticas de governo às diretrizes do Consenso de Washington e comprometeu a soberania de nações periféricas. Permitiu que mentores da política externa norteamericana estebelecessem linhas de intervenção socioeconômicas em países sob sua influência.

 

Com este intuito, utilizou-se de vários alibis. Entre eles, a correção de distorções em gastos públicos e disfunções do Estado. Ao invés de equilibrio financeiro, ajuste de despesas e distribuição equanime de gastos públicos, este expediente teve como escopo obter superavits  para garantir e saldar escorchante divida externa. Impagável, a bem da verdade. Para viabilizar este intento, montou estafes de gerentes e financista para administrar a partilha destes dividendos financeiros com grandes corporações internaconais. Hoje, estes experts, beneficiários enriquecidos pela privatização da economia, distribuem-se em aras, em sociedades financeiras, em cassinos globais e ainda comem no prato dos que viabilizaram sua ascenção milionária.

 

O controle dos gastos públicos impôs sacrifícios enormes a setores mais carentes da população, enquanto elites parasitárias enriqueceram celeremente. Beneficiaram-se da falta de investimentos públicos, da especulação lograda por altas taxas de juros , que remuneraram grandes estoques de capital, migrantes da esfera produtiva para o mercado financeiro. Lucraram, e ainda lucram, agiotas, credores, agências multilaterais e financeiras que patrocinaram a escalada retro-liberal. Nós, peixinhos miúdos, sofremos na carne a bocada destes tubarões.

 

Hoje querem reeditar no Brasil, a chamada linha dura chilena. Clamam por sua versão nativa implementada durante os governos Collor, FHC e, em modalidade soft, com Lulinha da Silva.

 

O preço pago pelo butim empreendido por agências financeiras foi enorme. No Chile e em todo mundo. Não deve ser contabilizado apenas em recursos materais e pecuniários, mas também em vida humanas.

 

No Chile, a perversa aventura neoliberal além de lançar grandes contingentes populacionais na pobreza e na miséria, para facultar enriquecimento ilicito de elites parasitárias e agentes financeiros, foi responsável pelo assassinato de três mil presos políticos e o desaparecimento de outros mil e trezentos. A ampla liberdade dos mercados foi alcançada graças à supressão de liberdades civis.  Foi consumada sob a pressào de crimes hediondos, imprescritíveis, praticados contra todos que resistiram à eliminação de direitos sociais inalienáveis.

 

Para saudosistas de chantagens, chacinas e torturas, o Chile, hoje, não dá margem a novas investidas. Ao contrário, oferece dois bons exemplos para nós brasileiros.

 

O primeiro advém de mea culpa do Congresso pelo desgaste e descrético popular causados por práticas de corrupção. Ao invés da conivência, o parlamento chileno expôs seus infratores. Trouxe à luz a desfaçatez desta gente que invoca probidade para se alimentar de sonegação. de impostos, de fraudes fiscais, de financiamento privado de campanhas eleitorais, da submissão de mandatos e do parlamento a interesses de grandes grupos economicos.

 

O segundo exemplo resulta da responsabilização criminal de 17 agentes do aparelho repressivo pelo assassinato de resistentes à ditadura do General Pinochet. Na última semana foram processados os assassinos do compositor Victor Jara, que dá nome ao Estadio Nacional, local de retenção e martírio de presos políticos, em 12 de setembro de 1973, bem como autores da imolação de estudantes, em 1986, queimados vivos como “punição exemplar” aos que se rebelavam contra a ditadura de Pinochet.

 

No Brasil, eufóricos anarco-coxinhas, liberais a serviço da supressão da democracia, e hitlernautas,  golpistas de prontidào, saudosos dos bons tempos de sequestros, torturas, assassinatos e desaparecimento de opositores, deveriam se inspirar nesta linha chilena.

 

Contudo vibram com a linha cortante chilena, mutiladora, análoga à insidia, à vilania e à virada de mesa, procedimentos integrantes de sua metodologia golpista, típicos de matrizes  conspiratórias.

 

As novas gerações talvez desconheçam a brutalidade da repressão no Chile, efetuada com aval e apoio logístico norteamericano e dos regimes militares do cone sul. Porém podem conhecer e saudar a altivez com que suas instituições democráticas chilenas repelem o retrocesso político nos dias de hoje. Podem valorizar estes bons exemplos de conduta, que se prestam à denúncia de condôminos da corrupção em governos, parlamentos e instâncias do judiciário no Brasil.

 

Estes, moralmente intimidados, devem estar se perguntando: E agora? Se a moda pega?

 

No Chile, como aqui, perderão as imunidades, os palanques e as incontestes boquinhas, as prerrogativas para realizar achaques, chantagens e colher propinas. Impunemente.

 

No Chile, como no Brasil, podemos coibir a hipocrisia dos eternos democratas que conspiram contra o Estado de Direito e contra todos que não têm direitos.

 

A simbiose de anarco-coxinhas e hitlernautas, que se dizem patriotas, procura reeditar  surrada linha dura chilena. A harmoniosa conjunção da ditadura sem limites de Pinochet e a irrestrita liberdade de exclusão social, praticada pelo higiênico mercado de Milton Friedman.

 

Anarco-coxinhas e hitlernautas aproveitam ventos ocasionais. Aventuram-se em céus que não lhes impõem limites. Erguem suas pipas sem constrangimentos legais. Valem-se da democracia para tentar inviabilizá-la. Usam as velhas tramóias de Pinochet em cortantes e traiçoeiras linhas chilenas. Com cerol pouco visivel, impunemente, lançam-se nos ares e urdem o corte de nossas cabeças.

 

* Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG

 

As afirmações e conceitos emitidos em artigos assinados são de absoluta responsabilidade dos seus autores, não expressando necessariamente a opinião da instituição


Data: 28/07/2015