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Educadores criticam decisão do STF de permitir ensino confessional na escolas públicas

Corte aprovou medida, nesta quarta-feira, por seis votos a cinco

 

Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) dividiu opiniões. A corte determinou nesta quarta-feira, por seis votos a cinco, que as escolas públicas podem oferecer ensino religioso confessional, permitindo que as aulas sejam ministradas pelo representante de apenas uma determinada crença. A ação julgada pelo plenário foi movida pela Procuradoria Geral da República (PGR), que pediu a proibição do ensino confessional, argumentando que ministrar apenas os dogmas de uma determinada crença violava o princípio da laicidade do Estado. Em votação apertada, o pedido da PGR foi negado. A medida foi criticada por educadores, que argumentam que a medida permite que continue havendo proselitismo nas escolas. Por outro lado, algumas denominações comemoraram a decisão.

 

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A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) prevê que haja oferta do ensino religioso na etapa fundamental — ainda que a matrícula seja facultativa — mas não determina como a disciplina deve ser conduzida: há apenas a ressalva de que são vedadas quaisquer formas de proselitismo. Com a decisão do STF, fica liberado o ensino confessional, mas a escolha da religião lecionada fica a cargo do poder público. E não há obstáculo a instituições que optem por aulas sobre a história das religiões.

 

A maioria dos ministros ponderou que a religião tem papel importante na sociedade brasileira. E, como as aulas são facultativas, ninguém seria obrigado a se matricular em uma matéria com conteúdo contrário às suas crenças particulares. Assim, o respeito à diversidade religiosa estaria garantido. O julgamento foi desempatado no último voto, dado pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia.

 

— Não consigo vislumbrar nas normas autorização para o proselitismo ou catequismo. Não vejo nos preceitos proibição que se possa oferecer ensino religioso com conteúdo específico sendo facultativa — disse a ministra.

 

Risco de proselitismo

               

Além de Cármen Lúcia, votaram pelo ensino confessional os ministros Edson Fachin, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes. Do outro lado, Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio, Rosa Weber, Luiz Fux e Celso de Mello votaram pelo ensino não confessional, com base no princípio constitucional da laicidade do Estado. Eles argumentaram que, ao não pedir matrícula na aula de religião, o aluno pode passar por constrangimento. Os ministros também criticam a contratação de professores para a disciplina por recomendação de determinada religião. Padres, pastores, rabinos ou ateus podem ministrar a aula, desde que sejam aprovados em concurso público.

 

— O ensino religioso confessional viola a laicidade, porque identifica Estado e Igreja, o que é vedado pela Constituição. A incompatibilidade me parece patente — afirmou Barroso, relator da ação.

 

Especialistas da área avaliaram negativamente a postura adotada pelo STF. O professor Carlos Eduardo Oliva, secretário do Observatório da Laicidade na Educação, afirmou que a corte perdeu uma oportunidade importante de combater o proselitismo religioso nas escolas, que acaba marginalizando alunos que não professam as religiões dominantes.

 

— Os seis votos contra a proibição entendem que o ensino religioso confessional não tenderia a ter esse efeito, mas, na prática, a gente sabe que é isso que acontece — observou Oliva, afirmando ainda que o próximo passo é articular uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para excluir o ensino religioso da educação brasileira.

 

A presidente-executiva do Movimento Todos Pela Educação, Priscila Cruz, também lamentou a decisão e defendeu que o ensino religioso seja ministrado sob uma perspectiva plural:

 

— Podemos potencializar a liberdade religiosa e o sincretismo com um ensino que reconheça o papel da religião, mas não com a pregação de um credo específico. Quando a escola escolhe uma religião para ensinar, toma um partido. E isso pode ser bem complicado.

 

Para o babalaô Ivanir dos Santos, membro da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa do Rio, o ensino religioso confessional não deveria ser considerado sob nenhuma hipótese.

 

— O ensino religioso como é dado, mesmo não confessional, acaba sendo instrumento de intolerância religiosa e proselitismo. As crianças sofrem danos emocionais, e os professores são colocados à margem — disse.

 

Por outro lado, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) comemorou a decisão do STF. Advogado da CNBB, Fernando Neves da Silva argumenta que a posição firmada pelo STF preserva direito de escolha sobre o aprofundamento da fé.

 

— Com a garantia de espaço na grade curricular para o ensino religioso, cada aluno pode optar por frequentar as aulas, de acordo com sua fé. A Constituição não prevê a execução da medida, então cada estado adapta as aulas de religião às suas particularidades, de acordo com os grupos religiosos de maior densidade em cada região — defendeu.

 

(O Globo)


Data: 28/09/2017