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Parasita que daria inveja aos sanguessugas - Artigo

Parasitas e hospedeiros vivem uma relação conflituosa


Fernando Reinach - Biólogo

 

Parasitas e hospedeiros vivem uma relação conflituosa. Ambos utilizam os mais diferentes ardis para garantir sua sobrevivência, o parasita tentando exercer seu controle sobre o hospedeiro e este tentando minimizar os efeitos maléficos do parasita.

Alguns parasitas, como o carrapato, têm uma interação curta e intermitente com o hospedeiro: após sugar o sangue de uma vaca o carrapato se solta, coloca milhares de ovos de onde nascem as pequenas larvas que passam meses, com suas patinhas estendidas, esperando que outra vaca rele no galho em que se alojaram.

Outros parasitas, como o causador da malária, nunca estão distantes de seus hospedeiros: o Plasmodium divide seu tempo entre o intestino do mosquito, onde espera pacientemente que ele encontre uma pessoa para picar, e o sangue da pessoa picada, onde se reproduz até ser sugado por um outro mosquito.

Mas existe uma classe de parasitas que adota uma estratégia ainda mais esperta. Após invadirem o hospedeiro, eles colonizam seus óvulos ou espermatozóides.

Quando o hospedeiro se reproduz, eles são transmitidos diretamente para os filhos do hospedeiro. Pegando uma carona no sistema reprodutivo do hospedeiro, eles garantem sua presença em todos os seus descendentes. É neste grupo que está a Wolbachia.

Estratégia parasitária

A Wolbachia é uma bactéria que parasita insetos. Ela é tão bem-sucedida que entre 20% e 80% das espécies conhecidas de insetos é parasitada por ela. Uma vez dentro do inseto ela é transmitida de geração em geração, se estabelecendo na "família" de forma quase permanente.

Esse feito é o resultado de sua capacidade de infectar células germinativas com sua parcimônia: por não afetar demasiadamente a saúde do hospedeiro, a Wolbachia permite que ele se reproduza.

Até agora não se compreendia como esses parasitas conseguiam invadir os ovos do hospedeiro. Agora, a tática usada pelo parasita foi descoberta.

Horácio Frydman, um brasileiro que trabalha em Princeton, injetou em um grupo de Drosófilas (aquelas pequenas moscas que vivem em volta das bananas) uma pequena quantidade de Wolbachia.

Após a injeção, a cada dois dias, ele matava algumas Drosófilas e observava onde estavam os parasitas.

Na primeira semana, ele observou que as bactérias migravam para o interior dos ovários da mosca após atravessarem a membrana que separa os ovários do espaço existente no interior do abdômen.
Logo depois ele observou as bactérias atravessando uma segunda membrana que isola cada um dos grupos de células que vão dar origem aos ovos das Drosófilas.

Após 15 dias, os parasitas se acumulavam em um pequeno espaço onde estão localizadas as células-tronco dos ovários que vão dar origem aos ovos. Esse é o lugar ideal para os parasitas alojarem nos ovos ainda durante sua formação.

Por conseguirem migrar de maneira organizada para esse local, os parasitas conseguem ser transmitidos de uma geração para outra.

Esse resultado mostra o profundo "conhecimento" que os parasitas possuem do funcionamento de seu hospedeiro. O caso da Wolbachia sugere que os caçadores de sanguessugas têm muito a aprender com os biólogos especializados em parasitas e seus hospedeiros.

Mais informações: Somatic stem cell niche tropism in Wolbachia. Nature - vol. 441, pág. 509, 2006.


Data: 05/07/2006