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Hormônio amplia estresse de torcedor após derrota

Revés no futebol pode causar tristeza profunda e irritação nos mais fanáticos. Especialista afirma que são comuns casos em que, após decepção no esporte, rendimento de profissional cai no trabalho

Os batimentos cardíacos estão acelerados, as pupilas estão dilatadas e a atenção está voltada para uma única coisa: uma partida de futebol. A expectativa é a vitória.

Mas nem sempre isso acontece e, então, o torcedor sai do momento de euforia e pode embarcar em uma tristeza profunda, apresentando sintomas de irritação e até mesmo de agressividade.

Um dos principais motivos para que isso aconteça é o aumento dos níveis de cortisol (liberado em situações de estresse) no sangue.

O cortisol é um hormônio produzido pela glândula supra-renal (que fica em cima do rim) e é considerado um "maestro do organismo", pois interfere no funcionamento de todos os outros hormônios. Em situações de estresse físico ou emocional ele é liberado pelo organismo como forma de resposta àquela situação.

"A pessoa com os níveis de cortisol alterados pode ficar mais irritada e até mesmo agir com agressividade em algumas situações. É comum que no dia seguinte à decepção [como a derrota de um jogo importante], muitas pessoas fiquem com o "pavio curto" com os que estão ao seu redor.

Em algumas situações, essa alteração pode até afetar o desempenho da pessoa no trabalho", explicou a psiquiatra Alexandrina Meleiro, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas e professora da USP.

Segundo Alexandrina, observar a reação dos torcedores logo após uma derrota em uma partida de futebol é um bom exemplo para verificar esse tipo de situação.

"O brasileiro é fanático por futebol, muito mais do que com outros esportes. Se o time dele ganha um título, é visível que o torcedor vai trabalhar mais feliz, com mais entusiasmo, com mais vontade. Pode até render mais na empresa. Já se o time perde o jogo, a tendência é que a pessoa fique triste, irritada e queira sair quebrando tudo o que vê na frente".

Transferir problemas

O psiquiatra Sérgio Klepacz, do Hospital Samaritano, também destaca a alteração dos níveis de cortisol no sangue como um dos motivos para o transtorno de humor que os torcedores sofrem quando seu time perde uma partida.

Ele destaca, porém, que a reação das pessoas também inclui fatores pessoais. "É como se o brasileiro transferisse para o jogo os "problemas" que enfrenta no dia-a-dia", disse.

"Em geral, o ser humano precisa depositar em alguma coisa as suas expectativas para ter uma vida sem estresse. E ele acaba se apoiando nos jogos de futebol.

A pessoa tem problemas em casa, no trabalho, na escola, mas acredita no futebol. Se essa expectativa for quebrada, a pessoa pode entrar num quadro de tristeza profunda, que pode acabar se tornando uma depressão", disse.

O psiquiatra Marco Aurélio Peluso, especialista em psiquiatria e esporte, afirma que não conhece estudos específicos sobre o aumento dos níveis de cortisol nos torcedores antes e depois dos jogos.

"Mas, dentro do que a gente conhece, é muito provável que os níveis estejam alterados, principalmente depois de uma derrota", disse. Segundo Peluso, todas essas reações dos torcedores acontecem porque na hora em que o time de futebol entra em campo, eles se identificam com os jogadores.

"No caso da seleção brasileira, por exemplo, a identificação acontece por uma questão de nacionalidade. É como se o torcedor também entrasse em campo. É por isso que, no momento da derrota, muitos entram em crise e não sabem lidar com essa situação", explicou.

Para Peluso, o brasileiro tem dificuldade em lidar com a derrota e com a frustração por uma questão cultural. "Nós temos de ser os melhores do mundo, sempre. O brasileiro se identifica tanto com o jogador, que depois da derrota o time vai tirar férias e o torcedor vai ficar em casa, deprimido.

É como se ele tivesse perdido o jogo". Os especialistas destacam, porém, que esses sintomas de irritabilidade, tristeza, agressividade ou depressão são transitórios e devem durar poucos dias.

"Se os sintomas de desânimo persistirem por mais de três meses, aí sim o torcedor deve procurar um médico", disse Alexandrina.


Data: 10/07/2006