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Reunião Anual da SBPC:"A ciência, hoje, tem uma posição central na sociedade pós-industrial, graças à massa de recursos e pessoas que ela absorve"

Para o governador de SC, Eduardo Pinho Moreira, o lugar central na sociedade pós-industrial já não é mais a fábrica, mas o laboratório científico

Leia a íntegra do discurso do governado do Estado, proferido neste domingo:

"Senhores,

Lembro-me dos tempos em que a SBPC era uma das mais fortes e influentes aliadas que nós, da oposição ao regime militar, tínhamos. Lembro-me como foi fundamental o seu papel para que conseguíssemos superar aqueles tempos.

Vencida aquela etapa do nosso processo civilizatório, esta importante entidade, mesmo sem excluir-se totalmente das discussões da nacionalidade, retornou ao seu leito natural, dedicando-se aos seus misteres de ofício.

E feliz do país em que seus cientistas podem dedicar-se à ciência, seus estudantes aos estudos, seus legisladores a legislar.

Sem menoscabo à sua atuação nesse último período, ouso sugerir aos membros da SBPC que, diante dos percalços e das desilusões recentes, diante dos desafios que se apresentam, não só no campo político, econômico e social, mas, também, no científico e tecnológico, com as graves conseqüências éticas, morais e filosóficas que trazem embutidas, talvez seja hora de voltar a reforçar a sua ação cívica, política e institucional, emprestando todo o seu prestígio no sentido de iluminar os caminhos a seguir, como é um dos objetivos desta reunião.

A velha sociedade industrial aparentava produzir novas respostas, novas soluções; já a sociedade pós-industrial parece gerar novas perguntas, novas questões, novos problemas.

Os senhores, cientistas e pesquisadores, são responsáveis por fantásticas revoluções, que invadem com força desmesurada as economias, as sociedades, os usos e os costumes. Enquanto em vários países, partidos, governos e suas burocracias discutiam a oportunidade de nacionalizar ou privatizar os correios, cientistas e pesquisadores produziram o fax e depois a internet, eliminando boa parte do problema. Em 1995, o número de mensagens trocadas via internet superou o das cartas enviadas pelo correio tradicional.

Os senhores, cientistas e pesquisadores, são responsáveis, também, pela duplicação da expectativa de vida, mas, por conseqüência, são igualmente responsáveis pelo dilema previdenciário que mobiliza e inquieta o mundo inteiro. Nós, que estamos na faixa dos 50, viemos de famílias nas quais os tios eram bem mais numerosos do que os avós. Nossos filhos, provavelmente, viverão em famílias nas quais os avós serão mais numerosos que os tios.

Diante desses cenários que se apresentam, podemos ser otimistas ou pessimistas, de acordo com o prisma que escolhamos para a análise. É a questão do copo meio cheio ou meio vazio.

Olhando a parte vazia do copo, vemos que, dez mil anos atrás, a população mundial não superava 5 milhões de habitantes. Hoje, somos 6 bilhões, a caminho dos 8 bilhões! Seis bilhões de barrigas para encher, seis bilhões de pessoas para abrigar, seis bilhões de corpos para dar saúde...

Olhando a parte cheia do copo, vemos que todas as noites 6 bilhões de cérebros adormecem e começam a sonhar novas formas, objetos, idéias, cores, sons, jogos, negócios, ações... e, todas as manhãs 6 bilhões de cérebros acordam e começam a pensar em como traduzir na prática esses sonhos.

Voltando à parte vazia do copo, vemos as estatísticas da World Population Prospect, que revelam que em 1950, os pobres eram o dobro dos ricos; em 2000 já eram cinco vezes mais numerosos; e em 2050, serão oito vezes mais. Então, teremos não 6 bilhões de cérebros adormecendo e sonhando, mas muitos bilhões vitimados pelo pesadelo da luta pela sobrevivência, dos conflitos por terra, por água, sofrendo iniqüidades de toda sorte...

Olhando a parte cheia do copo, comemoramos a superação do taylorismo e do fordismo, que nos permite novos luxos, como a disponibilidade de tempo e de espaço, de autonomia e segurança, de beleza e simplicidade, bem como ser globais e locais ao mesmo tempo. Nossos avós trabalhavam cerca de 120.000 horas, mas hoje a duração média de uma vida de trabalho não supera 80.000 horas; com isso, no último século o tempo vago numa vida média passou de 25.000 horas para 260.000 horas.

Olhando a parte vazia do copo, tememos que Fausto e Frankenstein venham a ser as metáforas inquietadoras da relação do homem pós-moderno com a tecnologia pós-industrial, com o surgimento de novas solidões, novos egoísmos, novos estranhamentos, novos dilemas éticos e morais.

A ciência, hoje, tem uma posição central na sociedade pós-industrial, graças à massa de recursos e pessoas que ela absorve, à potência da tecnologia que emprega, à acumulação de conhecimentos de que dispõe, à quantidade de resultados que consegue obter e à velocidade com que o progresso teórico se dissemina e é convertido em progresso prático. A descoberta copérnica levou 300 anos para prevalecer sobre as convicções ptolomaicas. O microcomputador e a internet precisaram só de dez anos para destruir o passado e reinventar o futuro. Além disso, hoje a ciência "inventa"; novos setores, não prescritos pela natureza, mas induzidos pela cultura. Daí porque o lugar central na sociedade pós-industrial já não é mais a fábrica onde se produzem bens, mas o laboratório científico, onde se desenvolvem novos saberes, novas informações, novas estéticas e novas patentes.

Einstein dizia que "um dos maiores problemas da humanidade não consiste na imperfeição dos meios, mas na confusão dos fins".

Daí a minha sugestão de que, talvez, seja hora de a SBPC voltar a reforçar a sua ação cívica, política e institucional, emprestando todo o seu prestígio no sentido de iluminar os caminhos e delimitar os fins.

Obrigado!"


Data: 17/07/2006