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Projeto de lei de reforma do ensino superior é criticado na Reunião Anual da SBPC

Principal alvo das críticas foi a ausência no texto do tema autonomia universitária

Na mesa-redonda Reforma Universitária, com a participação de Eunice Durham, professora da USP; Paulo Speller, reitor da UFMT e presidente da Andifes; e Álvaro Prata, professor da UFSC, não faltaram críticas ao texto, enviado ao Congresso Nacional em 8 de junho.

Prata, mostrando dados do Inep, defendeu que o ensino superior precisa de modificações extremas. Ele criticou, por exemplo, o fato de cerca de 80% dos universitários serem formados por instituições privadas.

Os dados mostrados por ele apontam também que a massa de graduados não está sendo formada em Universidades, mas sim em faculdades e centros universitários, onde a pesquisa quase não está presente.

“Nós temos 169 Universidades e 1844 faculdades e centros. Os formados em instituições com mais de cinco mil alunos são apenas 9,5%”, disse.

Segundo ele, cerca de 60% são formados em instituições com menos de mil alunos. “Não é um sistema superior universitário, não são Universidades”.

Outro ponto problemático hoje é que poucos dos que entram para a graduação completam o curso. Segundo ele, dos cerca de 620 mil que entram por ano para o curso de Administração apenas 83 mil se formam. Nos outros quatro cursos mais concorridos, Direito, Pedagogia, Engenharia e Letras a média fica em cerca de 10% de concluintes em relação aos que entraram na faculdade.

Outro dado apresentado por ele mostra a inversão da proporção de alunos por turno. Nas públicas, 63% das matrículas é no turno diurno. Já no particular é o oposto: 68% dos estudantes freqüentam a faculdade à noite. “Esses dados mostram que não podemos continuar com a estrutura que o ensino superior tem hoje.”

O problema, diz ele, é que o texto enviado ao Congresso não foca nos reais problemas, mas sim nos complementares. Para ele, seria importante que no texto estivessem presentes a necessidade de a Universidade ter uma inserção social e tecnológica, de ela ser universalizada para que os alunos pudessem cursar aulas em diferentes Universidades e que fossem traçados planos para a interdisciplinaridade das áreas.

Sobre a autonomia, diz ele, não há: “a Universidade vai continuar amarrada”.

Speller, presidente da entidade que congrega os reitores das Universidades federais, disse que a versão enviada ao Congresso foi um inesperado retrocesso. “A versão enviada foi a quarta. Nós estávamos debatendo há três anos o projeto e na terceira versão havia muitos avanços, mas eles foram cortados no quarto projeto”.

O reitor contou que antes do envio do projeto, no dia 8 de junho, a Andifes se reuniu com Lula e pediu para que ele não mandasse o texto como estava. Ele disse que o presidente não concordou porque se não fosse esse o texto, ele não teria como enviar ao Congresso um outro projeto ainda neste mandato. Mas segundo Speller, o presidente prometeu que enviaria o projeto, mas que não usaria sua bancada para aprovar o texto como está.

“O Lula disse que o projeto não é ‘imexível’, disse que será feita grande discussão no Congresso e o que for aprovado no legislativo será sancionado”.

Como o projeto não será aprovado este ano, como já afirmou o próprio ministro da Educação, Fernando Haddad, a promessa da sanção vale apenas se Lula for reeleito.

Speller contou então que a Andifes passou a atuar com foco no Congresso. “Já nos reunimos com os deputados Paulo Delgado, do PT, e com Gastão Vieira, do PMDB. Vamos lutar para que a comissão ouça as reivindicações da comunidade universitária.”

Os dois pontos fundamentais não contemplados no texto, a seu ver, são a autonomia universitária e o financiamento da Universidade. “Precisamos da autonomia, todas as semanas os reitores tem que ir a Brasília para resolver muitas vezes problemas insignificantes. A questão do financiamento não foi totalmente resolvida. Os 75% de vinculação não serão suficientes, precisamos pensar em uma política duradoura de financiamento, não apenas para os próximos 2 ou 10 anos.”

Eunice Durham, que chegou a participar do Ministério da Educação no governo FHC, também defendeu a autonomia como fundamental. A pesquisadora da USP criticou diversas iniciativas da atual gestão do MEC, como o Prouni, o programa de cotas e o fim do provão.

Segundo ela, o Prouni deveria dar bolsas apenas para as boas Universidades particulares. A seu ver, esse seria um incentivo a busca da qualidade.

No programa de cotas ela diz não enxergar uma iniciativa para mudar a desigualdade em nosso país. “Fora o paternalista bolsa família não há iniciativas que ataquem o problema da desigualdade social”. Para ela, este é o grande problema também da educação, em todos os níveis.

O fim do provão, iniciativa substituída pelo Enade, foi lamentado por ela. Com a divulgação das notas do provão, diz ela, as faculdades com piores conceitos eram preteridas pelos alunos e não há nada que afete mais os donos de faculdades do que a falta de aluno, de dinheiro.

Eunice defendeu também que não é necessário o aumento da vinculação de recursos para as Universidades. Diferente de Prata, que havia criticado o pequeno número de graduandos nas Universidades, ela defendeu que a Universidade deve ser para poucos, para a excelência das pesquisas, de ponta. Para o restante da educação superior, poderiam ser construídos, diz ela, pequenos centros espalhados pelo país.

Polêmica

No decorrer da mesa e após, com a abertura dos debates, pode-se compreender o quanto o projeto enviado ao congresso é polêmico. Foram muitas as manifestações contrárias aos participantes da mesa.

Speller ouviu críticas de um aluno da UFMT a sua gestão. O reitor, ao ter a palavra, evitou o debate direto e se focou na questão da Reforma, sempre defendendo como fundamental a busca da autonomia.

Eunice, por sua vez, foi questionada sobre quais avanços foram alcançados na gestão de Paulo Renato no MEC, quando ela fez parte do governo. Ela respondeu dizendo que não concordava com a política adotada pelo ex-ministro e que por isso acabou deixando o MEC.


Data: 19/07/2006