topo_cabecalho
Reunião Anual da SBPC: Nanociência, megadesafios

Maior interação com setor produtivo e interdisciplinaridade estão entre as carências do setor

A produção brasileira na área de nanociência e nanotecnologia se destaca em alguns campos em âmbito internacional, mas ainda enfrenta lacunas em várias áreas.

A pouca interação dos pesquisadores com o setor produtivo e a falta de interdisciplinaridade estão entre alguns dos principais desafios que o setor enfrenta, na análise de especialistas reunidos em um encontro aberto para discutir as realizações do país na nanotecnologia, realizado no último dia de atividades da reunião anual da SBPC.

"Temos grupos localizados em algumas áreas que tentam acompanhar o que vem sendo feito no mundo. Mas é claro que há muitos vazios", avalia o físico Marcos Assunção Pimenta, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). "Na área de nanotubos de carbono, por exemplo, o Brasil tem uma competência superior à de vários países da Europa, mas isso não ocorre em todas as áreas."

O químico Fernando Galembeck, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), concorda em parte com a avaliação de Pimenta. "O Brasil está bem nos setores em que tem vigor tecnológico - e são muitos. Estamos produzindo, há resultados, produtos novos, inovadores em nível internacional", enumera. "Em praticamente qualquer área de pesquisa há contribuições brasileiras. O problema é que em algumas áreas não existe a prática da união entre conhecimento básico e aplicação."

Galembeck enumerou desenvolvimentos recentes na área de nanomateriais obtido na Unicamp, que mostram que já há frutos concretos sendo colhidos a partir do esforço de pesquisadores brasileiros da área.

O mais promissor deles é o Biphor, pigmento branco que não gera poluentes em sua fabricação e que possui muitas vantagens competitivas em relação ao único concorrente disponível no mercado, o dióxido de titânio.

Nanotubos de carbono

Aplicações com nanotubos de carbono em desenvolvimento em outras universidades brasileiras também foram apresentadas ao público por Marcos Pimenta durante o encontro aberto.

Entre elas, estão um sensor de gases com grande potencial de aplicação na indústria automobilística e ambiental e um compósito biocompatível para reconstituição óssea, ambos desenvolvidos na UFMG.

O físico citou ainda dispositivos fotoelétricos capazes de converter com grande eficiência luz em energia elétrica e dispositivos de memória, ambos desenvolvidos na Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Pimenta apontou ainda números que mostram a eficácia das redes nacionais criadas para reunir grupos de pesquisa de diferentes estados em algumas áreas da nanociência. A rede de nanotubos de carbono, por exemplo, formada em 2005, reúne 19 instituições e envolve 40 doutores, entre físicos, químicos e cientistas de materiais.

"Já foram defendidas 58 teses nessa área, e o grupo publicou mais de 170 artigos sobre nanotubos de carbono nas melhores revistas internacionais, como Science e Physical Review Letters", conta o físico.

O programa motivou também a interação com pesquisadores de todo o mundo, tanto que a cidade de Ouro Preto (MG) sediará em junho do ano que vem a conferência internacional Nanotube 07.

Uma outra rede nacional de pesquisa, sobre nanobiotecnologia, também alcançou resultados expressivos, segundo o relato da farmacologista Sílvia Guterres, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Entre 2001 e 2005, a rede reuniu cerca de 20 grupos de pesquisa interessados nas aplicações da nanotecnologia voltadas para o desenvolvimento de fármacos e cosméticos. Nesse período, foram formados 45 doutores e publicados mais de 600 artigos na área.

No entanto, os números não têm contrapartida na transformação do conhecimento gerado em novas tecnologias - reproduzindo um problema crônico da ciência brasileira. A rede nacional de nanotubos de carbono gerou apenas 6 patentes; a rede de nanobiotecnologia, 36.

Na avaliação de Fernando Galembeck, os números refletem uma realidade de muitos pesquisadores brasileiros, pouco habituados com a cultura da inovação. "Nossos estudantes não lêem patentes", denuncia. "Os pesquisadores aprendem a ler artigos científicos, mas não patentes. E quem nunca leu não será capaz de escrever uma."


Data: 24/07/2006