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Na França, um relatório parlamentar recomenda a legalização da clonagem terapêutica

Apesar de opiniões contrárias, tais como a da Igreja católica que se opõe a toda intervenção em embriões humanos, o documento defende a prática em função das "inúmeras vantagens técnicas e imunológicas que ela oferece".

O professor Pierre-Louis Fagniez, cirurgião e deputado (da UMP - partido da maioria, de direita) do Departamento do Val-de-Marne (região parisiense), tornou público na quinta-feira (27/07) o relatório intitulado "Células-tronco e escolhas éticas", fruto da missão parlamentar que lhe foi confiada pelo primeiro-ministro Dominique de Villepin em janeiro.

As principais conclusões deste relatório consistem em recomendar a legalização, a curto ou médio prazo, da clonagem com objetivos terapêuticos na França, assim como a autorização das pesquisas sobre as células-tronco embrionárias.

O primeiro-ministro havia pedido que fosse feito rapidamente, no âmbito nacional e internacional, um levantamento da situação atual em dois setores específicos:

de um lado, o da pesquisa sobre as células-tronco humanas (adultas e embrionárias), e de outro, aquele da prática da clonagem humana para finalidades terapêuticas.

Este relatório apresenta uma síntese das audições de cientistas, de juristas, de especialistas em ética, de filósofos, assim como de responsáveis políticos e religiosos.

Ele se inscreve dentro da perspectiva da revisão da lei de bio-ética de 6 de agosto de 2004, que está prevista para 2009.

"A pesquisa sobre as células-tronco é uma das grandes questões da ciência do século 21", observa Fagniez. "Ela permite vislumbrar progressos terapêuticos maiores, entre outros para a medicina de regeneração".

O relatório lembra que, diferentemente dos estudos que foram conduzidos sobre as células-tronco presentes nos organismos adultos, as pesquisas sobre as células-tronco embrionárias levantam uma série de problemas éticos, na medida em que estas células só podem ser obtidas à custa da destruição de embriões.

"Será que uma ação como esta que pode ser assimilada a uma transgressão, deve ser aceita em nome da ciência?

Esta pergunta remete invariavelmente ao conceito e à definição do embrião humano, os quais são objetos de controvérsias", resume Pierre-Louis Fagniez.

Derrogação

A lei da bio-ética proíbe por enquanto as pesquisas sobre essas células-tronco embrionárias, porém autoriza, a título derrogatório e por cinco anos, certos estudos que possam conduzir à destruição de embriões fecundados in vitro e que não mais se inscrevam no quadro de um projeto de procriação.

Esta mesma lei pune com sete anos de prisão e uma multa de 100.000 euros (R$ 277.819) os biólogos que criariam, com o objetivo de obter células-tronco, um embrião humano por meio da técnica da transferência nuclear.

Inventada e aperfeiçoada pelos criadores da ovelha Dolly, esta técnica consiste em criar um embrião por meio da inserção no núcleo de uma célula que foi extraída de uma pessoa, de um ovócito do qual foi retirado previamente o núcleo.

A missão parlamentar procedeu a audições de personalidades que se opõem a uma legalização da clonagem terapêutica, entre as quais Christine Boutin, uma deputada das Yvelines (região parisiense), e o arcebispo de Paris, André Vingt-Trois.

Sublinhando que o próprio Jacques Chirac havia se declarado, em 2001, contrário à legalização da clonagem terapêutica, dom Vingt-Trois lembrou que, para a Igreja católica, "o embrião humano, qualquer que seja o estágio de desenvolvimento no qual ele se encontra, é um ser envolvido dentro de um processo contínuo, coordenado e gradual, e isso desde a constituição do zigoto [célula resultante da união do gameta masculino ao feminino, em estágio anterior ao da divisão celular] até à pequena criança que está prestes a nascer".

Ainda assim, após avaliação do conjunto das audições e da evolução do contexto internacional, Pierre-Louis Fagniez recomenda a legalização deste tipo de clonagem.

Contudo, a seu ver, não há nenhuma emergência – vários pesquisadores franceses já vêm estudando atualmente a técnicas da transferência nuclear nos países onde ela é permitida – e esta autorização poderia ser dada por ocasião da revisão, prevista para ser efetuada dentro de três anos, da atual lei de bio-ética.

Fagniez sublinha principalmente que, em relação às pesquisas que já foram feitas sobre as células-tronco embrionárias, a clonagem com finalidade terapêutica – a qual ele propõe denominar oficialmente de "clonagem não reprodutiva" ou "transferência nuclear somática" – oferece inúmeras vantagens técnicas e imunológicas.

Ele acrescenta que esta autorização, no futuro poderá ser concedida e que se poderá proceder a essas pesquisas "sob o controle atento, ponderado e estrito" da Agência da biomedicina, a "estrutura que se apresenta como a mais adequada para poder exercer um controle eficaz e respeitado pelos pesquisadores".

Paralelamente, recomenda que o poder público garanta um investimento "financeiro, científico e de divulgação na mídia" equivalente, quer se trate das pesquisas sobre as células-tronco embrionárias ou sobre as células-tronco adultas.

Segundo Fagniez, Dominique de Villepin declarou-se favorável a todas as recomendações que foram incluídas neste relatório.


Data: 31/07/2006