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Cargos eletivos e exigências éticas - Artigo de Raimundo Braz Filho

"Da mesma forma que aqueles que pleiteiam cargos públicos através de concurso precisam provar sua idoneidade antes de assumir o posto, precisamos criar meios e mecanismos efetivos para evitar que pessoas com passado suspeito tentem e cheguem a ocupar cargos eletivos"

Raimundo Braz Filho - Reitor da Uenf



Toda vez que surge um novo escândalo de corrupção envolvendo políticos, uma perigosa e indesejável névoa poluidora se espalha pelo ar: o descrédito ameaçador e inconcebível nas instituições democráticas.

Não é preciso ir muito longe para encontrar personagens arrogantes capazes de defender com vigor o retorno dos tempos da ditadura, alegando a falta de caráter dos políticos legitimamente eleitos pela sociedade.

Como os escândalos têm sido tantos e a indiferença da população está atingindo um abismo dominado pela falta de espanto e indignação, é importante analisar até que ponto reações contrárias à democracia podem estar se formando espontaneamente.

De fato, é desolador saber que um mesmo esquema de fraudes, apropriadamente chamado de Máfia das Sanguessugas, pode envolver em torno de 115 dos cerca de 500 parlamentares. Juntos, eles teriam roubado dos cofres públicos cerca de R$ 110 milhões desde 2001, quando o esquema começou.

Conforme divulgou a imprensa, um ex-ministro de Estado recentemente substituído seria um dos personagens centrais do esquema. E tudo isso num momento em que a população ainda nem estava refeita do escândalo do Mensalão, que derrubou figuras de peso do Governo, frustrando inúmeros eleitores que ainda confiavam num governo pautado pela ética.

No entanto, nada garante que, num regime não democrático, as coisas poderiam ser diferentes. Muito pelo contrário: a experiência de anos de ditadura nos mostra claramente que a imprensa é um dos primeiros alvos da repressão. E sabemos que, sem a pressão diária da mídia, as investigações tendem a não sair do lugar.

Não há por que acreditar que num governo ditatorial seria diferente - a única diferença seria a possibilidade de evitar a merecida publicidade de tais fatos. Na realidade, o momento exige não um retrocesso político, mas novas estratégias para evitar que pessoas inescrupulosas cheguem ao poder e subvertam o princípio da imunidade parlamentar.

Da mesma forma que aqueles que pleiteiam cargos públicos através de concurso precisam provar sua idoneidade antes de assumir o posto, precisamos criar meios e mecanismos efetivos para evitar que pessoas com passado suspeito tentem e cheguem a ocupar cargos eletivos.

O voto é um importante instrumento da democracia, mas não se pode cobrar do eleitor a tarefa de investigar a vida de cada candidato.

Num país onde grande parte da população ainda troca votos por benefícios pessoais, é ainda mais importante que a escolha dos candidatos se paute por um passado ético, limpo e honroso, que se coadune plenamente com o cargo.


Data: 03/08/2006