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Educação integral: muitos modelos possíveis - Artigo de Antonio Matias

"Lideranças comprometidas com a educação procuram mobilizar a sociedade, transformando esse tema na grande prioridade do Brasil"

Antonio Matias - Engenheiro de produção pós-graduado em administração de empresas, é vice-presidente do Banco Itaú e da Fundação Itaú Social e diretor-executivo da Febraban.


Más notícias costumam trazer nas entrelinhas um apelo para que a sociedade se organize em torno de soluções. Por isso, é natural que, depois do resultado da Prova Brasil, em que o MEC concluiu que os alunos terminam a oitava série com o conhecimento que deveriam ter adquirido até a quarta série, fique uma sensação de inquietude.

Mesmo sentimento já havia surgido antes, com o resultado da pesquisa realizada por ocasião da conferência Responsabilidade Social em Educação, quando foi divulgado que cerca de 50% dos estudantes do Brasil saem da quarta série como analfabetos funcionais.

Por isso, diversas lideranças comprometidas com a causa da educação procuram mobilizar a sociedade em amplo movimento que envolva a todos, transformando esse tema na grande prioridade do Brasil.

Abrir o debate para toda a sociedade é ponto de partida para toda transformação social. E um tema obrigatório nessa discussão são os artigos 34 e 87 da LDB (Lei de Diretrizes e Bases) da educação nacional.

Eles prevêem a implantação progressiva de um sistema educacional integral. Dez anos se passaram desde a promulgação da LDB e quase nada foi feito para transformar a diretriz em realidade.

O próprio conceito de educação integral está em construção. Não se pode resumir o assunto ao aumento no tempo que alunos passam dentro da sala de aula. Oferecer educação integral é possibilitar o desenvolvimento das diferentes potencialidades humanas, em uma jornada mais longa.

Entre os educadores, há pouca divergência sobre a importância do sistema. As grandes questões giram em torno dos mecanismos para sua implantação.

O primeiro ponto a ser pensado é a infra-estrutura. É preciso espaço adequado. As escolas estão dimensionadas para atender os alunos em turnos, e não é possível abrigar todos ao mesmo tempo.

Quanto à qualidade da educação, é preciso oferecer atividades interdisciplinares e transversais. Não se pode simplesmente confinar as crianças nas salas de aula sem atividades complementares de qualidade e sem mudar o paradigma de educação.

O modelo fragmentado, adotado em várias escolas, deve ser substituído por um modelo sistêmico, que estabeleça conexões entre as várias áreas do conhecimento.

São muitos os conhecimentos fundamentais para a formação de cidadãos plenos, e integrá-los de forma significativa é um desafio. Tudo, é claro, sob a responsabilidade de bons profissionais.

A saída pode estar numa reflexão anterior: o processo educativo se dá somente nas escolas? Há muito tempo, as classes médias e altas descobriram que não.

E matriculam seus filhos em aulas complementares. Então, por que não oferecer essas mesmas atividades na educação integral para os alunos da rede pública, fazendo valer o direito à educação garantido a todos pela Constituição?

Assim como são muitas as perguntas sobre o assunto, há muitas respostas possíveis. Há uma certeza, no entanto: as soluções só serão viáveis a partir do reconhecimento da responsabilidade de toda a comunidade e do estabelecimento de uma rede englobando governos, escolas, educadores, ONGs, familiares e iniciativa privada.

Não há um modelo único de educação integral.

Na verdade, alguns Estados e municípios já se articulam para implementar propostas próprias, segundo condições locais e recursos disponíveis. Isso mostra que cada comunidade pode fazer sua própria estratégia de adoção do sistema de acordo com sua realidade.

A iniciativa privada, por exemplo, pode disponibilizar sua capacidade de gestão e seus investimentos em prol da articulação para fortalecimento do processo. As ONGs podem se responsabilizar por atividades complementares.

Os pais podem se comprometer com uma participação mais ativa. E as secretarias de educação podem propor parcerias com as pastas de Planejamento e Desenvolvimento Social.

Um esforço nesse sentido será feito hoje, amanhã e na quinta-feira, quando cerca de mil pessoas, entre professores e técnicos de educação, educadores de ONGs e representantes de todas as instâncias do poder público, se reunirão em SP para o "Seminário Nacional Tecendo Redes para a Educação Integral".

Esse é um esforço da Fundação Itaú Social, Unicef, Cenpec e seus parceiros no Programa Educação e Participação, que procura gerar sementes que poderão desabrochar em propostas concretas de educação integral pelo Brasil afora.


Data: 15/08/2006