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México já possuía escrita há 3.000 anos

Arqueólogos descobrem um bloco de pedra com as inscrições mais antigas das Américas, feitas pela civilização olmeca

Por pouco os operários que trabalhavam na pavimentação de uma estrada vicinal em San Lorenzo, no Estado mexicano de Veracruz, não transformaram em cascalho um bloco de pedra de 30 centímetros cheio de rabiscos engraçados.

Os tais rabiscos, dizem arqueólogos, são o primeiro texto escrito das Américas, gravado por volta do ano 1.000 antes de Cristo.

As inscrições ainda não foram decifradas -e talvez nunca o sejam. O que se sabe sobre elas é que são 62 símbolos pictográficos, alguns repetidos de duas a quatro vezes no "texto".

Há representações de insetos, milho e conchas. Nem a ordem de leitura está clara ainda.

O que parece claro é a identidade dos escribas: o produto é obra da civilização olmeca, que floresceu de 1300 a 400 a.C. e foi o primeiro Estado da Mesoamérica (região que engloba México e América Central).

A nova descoberta confirma que os olmecas também inventaram a escrita, e séculos antes do que se supunha.

"Até agora, nenhuma escrita havia sido associada com certeza à civilização olmeca", afirmam os arqueólogos, do Inah (Instituto Nacional de Antropologia e História) do México e da Universidade Brown, nos EUA.

Eles publicam a descrição do bloco de pedra na edição de hoje do periódico "Science".

Já havia indícios anteriores de escrita olmeca. Em 2002, na mesma "Science", o americano Kevin Pope descreveu um selo cilíndrico de cerâmica de 650 a.C. com supostos hieróglifos olmecas, traduzidos como o nome de um rei.

"Sempre fui cético sobre esses achados [anteriores]", disse à Folha Stephen Houston, antropólogo da Universidade Brown, co-autor do novo estudo. "Ou eles eram simplesmente iconografia ou não mostravam texto contínuo".

A pedra de San Lorenzo -encontrada num sítio ironicamente batizado Cascajal ("cascalheira", em espanhol)- deixa poucas dúvidas de que se trata de um texto de verdade.

Por outro lado, sua datação é controversa: afinal, trata-se de uma rocha, que não tem material orgânico e portanto não pode ser datada da forma convencional, pelo método do carbono-14.

"Nós só conseguimos estimar sua idade com base em correlações com a iconografia olmeca e com cerâmicas encontradas junto com ela", diz María del Carmen Rodríguez, do Inah, primeira arqueóloga a examinar a pedra, em 1999.

Mesmo assim, os especialistas ficaram animados com a descoberta. "Isso resolve a questão para mim", disse à agência de notícias Associated Press David Stuart, especialista em escrita mesoamericana da Universidade do Texas (EUA).

Seja como for, até agora o texto de Cascajal parece ser um beco sem saída na evolução da escrita americana -não parece que os hieróglifos maias, por exemplo, tenham se originado da escrita olmeca.

"Talvez ela nunca tenha sido transmitida, um traço do colapso social, como a Linear-B", diz Houston, referindo-se à escrita grega nunca decifrada.

Por falta de financiamento, o grupo de Houston e Rodríguez ainda não está escavando em Cascajal à cata de mais textos olmecas.

Vários deles provavelmente repousam hoje, moídos em forma de cascalho, sob as estradas de Veracruz.


Data: 15/09/2006