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Acreditem: a matemática pode ser fascinante, artigo de Ethevaldo Siqueira

"Gente, para mim, o livro de Gilberto Garbi me fez um quase milagre ao me despertar outra vez para as belezas da matemática. Não é incrível?"


Ethevaldo Siqueira - Jornalista especializado em Tecnologia da Informação e Telecomunicações.



Acabo de ler um livro que, entre outras reflexões, me trouxe de volta um debate educacional antigo, em que me envolvi, tantas vezes, nos tempos de universidade e que resumo numa pergunta: 'Por que tantos alunos odeiam a matemática?'

A resposta todos sabem. Hoje como ontem, a maioria dos jovens acaba odiando a Matemática porque é vítima de maus professores. Eu só vim a superar meus traumas algébricos e geométricos e, finalmente, descobrir o encanto do pensamento matemático, com as aulas do extraordinário professor Osvaldo Sangiorgi, na USP, nos anos 1960 e 70.

Agora, no entanto, vislumbro pelo menos um remédio para esse mal, especialmente depois de ler um livro que o Brasil inteiro deveria ler: A Rainha das Ciências: Um passeio histórico pelo maravilhoso mundo da Matemática (Editoria Livraria da Física, 346 p., São Paulo, 2006), de Gilberto Geraldo Garbi. Por que não utilizar a história e a vida dos grandes matemáticos para estimular e atrair os jovens e melhorar o ensino e o estudo dessa ciência?

Mais do que a resenha desse livro, prefiro dar meus pontos de vista pessoais sobre o tema, pois conheço o autor no mínimo há 30 anos.

Gilberto Garbi. 62 anos, é engenheiro e empresário. Personalidade multifacetada, foi um dos mais respeitados executivos de telecomunicações do período Telebrás, nos anos 1970 e 80, e da indústria, como presidente da NEC, nos anos 1990.

A Matemática sempre foi uma de suas paixões. Nos últimos anos, decidiu escrever sobre o tema, primeiro com o livro O Romance das Equações Algébricas (Makron Books, São Paulo, 1997). Agora, com o novo livro, ele focaliza a vida dos gênios e faz, realmente, uma viagem histórica ao desenvolvimento da matemática.

Em 24 capítulos, o leitor passa por um prólogo delicioso - O que é a Matemática - e segue com os mesopotâmicos, egípcios e chineses, Tales de Mileto, Pitágoras, Platão, Arquimedes, Nove Séculos da Universidade de Alexandria, Isaac Newton, Euler e Gauss, para chegar ao adorável 'As Mulheres e a Matemática'.

Tecnologia

No prólogo, Garbi recorda que toda tecnologia de nosso tempo está baseada em alicerces matemáticos - seja ela energia elétrica, telecomunicações, computadores, aviões, veículos espaciais - ou produtos e coisas de uso corrente como televisores, aparelhos de som, automóveis, geladeiras, equipamentos de medicina, casas, pontes, produtos químicos, biotecnologia e tantos avanços do progresso humano que 'exigem, em sua concepção e produção, elevados conhecimentos matemáticos, desenvolvidos ao longo, pelo menos, dos quatro últimos milênios, em especial dos séculos 17, 18 e 19.'

E a produção de conhecimento matemático não pára, leitor. Garbi cita os matemáticos norte-americanos Philip Davis e Reuben Hersch, para nos lembrar que 'existem atualmente mais de 4 mil ramos da matemática, dentro dos quais se publicam, a cada ano, cerca de 200 mil teoremas' - nesse universo que inclui a Análise Combinatória, a Teoria das Probabilidades, as Séries Infinitas, a Teoria dos Números Complexos, o Cálculo Matricial, a Teoria dos Grupos, a Teoria Analítica dos Números, a Teoria dos Conjuntos, a Axiomática, a Lógica Matemática e outras especialidades.

Já imaginou, leitor, o que significam 200 mil teoremas por ano? Na adolescência, bastava para mim o teorema de Pitágoras para me fazer sofrer nas mãos de um professor rabugento, que jamais associava a matemática à vida real, ao cotidiano.

Outro, sádico, no curso colegial, nos dava, como castigo, extrair a raiz cúbica de imensos números, na unha. Por fim, na universidade, um terceiro que proibia o uso de calculadora.

Biografias

A Rainha das Ciências é um livro que podemos ler de diversas maneiras. Eu, não sendo matemático, saltei por cima de todas as demonstrações algébricas mais complexas e gráficos geométricos ultraespecializados e me concentrei nas histórias e biografias de cada gênio.

É claro que gostaria imensamente de absorver cada raciocínio numérico e cada demonstração matemática. Mas essa incapacidade não me fez sentir frustrado, pois suas narrativas nos mostram a beleza da vida de quase uma centena de gênios, de seus desafios e da vitória da inteligência no campo mais abstrato da cultura humana.

Alguns capítulos me marcaram mais fundo, como o de Isaac Newton, ou das mulheres matemáticas - como Gabrielle Émilie Le Tonnelier de Breteuil, Laura Catharina Bassi, Maria Gaetana Agnesi, Sophie Germain, Mary Fairfax Somerville ou Sofia Kovalevskaia. Confesso e faço meu mea-culpa: eu era machista, por pura ignorância, a respeito da existência de mulheres tão inteligentes no campo da matemática.

Minha alegria maior foi o capítulo sobre a matemática contemporânea, ao rever com razoável familiaridade o trabalho de James Clerk Maxwell, Claude Shannon (o pai da Teoria da Informação), Charles Babbage, Alan Turing e John von Neumann - todos mais próximos de meu mundo computacional.

Gente, para mim, o livro de Gilberto Garbi me fez um quase milagre ao me despertar outra vez para as belezas da matemática. Não é incrível?


Data: 18/09/2006