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Licenciamento ambiental em SP, artigo de José Goldemberg

Embora existente, a legislação federal não é aplicada com muito rigor em alguns Estados

José
Goldemberg - Secretário do Meio Ambiente do Estado de SP


Problemas ambientais e como enfrentá-los não têm ocupado um lugar muito expressivo na atual campanha presidencial.

A explicação que se dá para este fato é que existem problemas mais imediatos a discutir, como segurança, saúde, educação, saneamento básico e, acima de tudo, corrupção, ao passo que problemas ambientais como a qualidade do ar, da água e o desmatamento parecem mais distantes e interessam apenas a uma parte mais esclarecida da população.

Existem, de fato, países onde a legislação ambiental é praticamente inexistente, como a Índia e a China, e a necessidade de crescimento econômico rápido relegou a segundo plano a proteção do meio ambiente.

Mas esta percepção está mudando na China, que está, agora, pagando um elevadíssimo preço para corrigir os danos ambientais causados nos últimos 50 anos.

A situação no Brasil é, contudo, diferente, porque um dos legados positivos que o regime militar nos deixou foi uma legislação ambiental moderna e atualizada.

Graças a ela, e a governos progressistas como o do governador Franco Montoro, Cubatão foi saneada e as chaminés que cobriam de fumaça vários bairros de SP desapareceram.

Embora existente, a legislação federal não é aplicada com muito rigor em alguns Estados.

Al
ém disso, a eficiência do órgão federal de fiscalização, o Ibama, deixa muito a desejar.

Este não é o caso de SP, onde a legislação federal foi complementada por uma legislação estadual e os órgãos licenciadores e fiscalizadores são razoavelmente equipados.

O licenciamento das atividades produtivas contempla desde a construção de uma fábrica, plantações de cana, destilarias de álcool, aterros sanitários até a abertura de estradas.

Tais atividades são analisadas pela Cetesb e pela Secretaria do Meio Ambiente, o que tem garantido uma qualidade ambiental melhor para o Estado.

Há queixas sobre a morosidade deste processo, mas um enorme esforço foi feito no atual governo para simplificar o licenciamento e reduzir os prazos de análise, o que muitas vezes não é reconhecido por empreendedores que, provavelmente, prefeririam não se submeter a licenciamento algum.

Dentre outros, um dos fatores que ainda podem ser melhorados é a redução dos prazos legais para convocação de audiências públicas, que, embora contribuam para a transparência do processo de licenciamento, o tornam demorado.

Existe um conflito claro entre interesses específicos e comerciais e os interesses maiores da população, que são difusos. É função do Estado atuar para garanti-los e o Ministério Público vigia esta atuação.

Tal vigilância, contudo, tem sido freqüentemente exagerada por grupos interessados que, por meio de liminares, promovem a 'judicialização' do processo de licenciamento, contra a qual os órgãos licenciadores pouco podem fazer.

Só para dar um exemplo, a limpeza do canal do Rio Pinheiros utilizando o processo de flotação até hoje não saiu do papel em razão de liminares concedidas pela Justiça.

Outro exemplo deste conflito é o que ocorre com a permissão para o corte manual de cana na região canavieira do Estado.

A queima prévia da cana-de-açúcar é condição necessária para que seja realizado o corte manual, porém esta prática é uma importante fonte de poluição no interior paulista e causa de problemas de saúde e inconvenientes para a população.

A rigor, o corte da cana deveria ser mecanizado e a Assembléia Legislativa aprovou uma lei para introduzir gradativamente este procedimento no Estado.

O cronograma, contudo, não é muito rápido e só em 2012 se tornará mais eficaz.

Até então cabe à Secretaria do Meio Ambiente autorizar a queima quando as condições atmosféricas assim permitirem, o que tem sido feito, apesar da insurgência de alguns usineiros.

A exigência do Código Florestal de manter uma reserva legal de 20% nas propriedades agrícolas é mais um ponto polêmico.

Alguns argumentam que este índice é arbitrário, não tem base científica, e adotá-lo prejudica seriamente as atividades produtivas.

Há outros, porém, que argumentam que 20% é pouco e que a preservação ambiental só seria obtida com uma reserva legal mais ampla, como é na Amazônia Legal, cujo índice é muito maior e onde, apesar disso, o desmatamento continua, sobretudo em alguns Estados.

Es
te desmatamento em grande escala vai acabar por produzir mudanças do clima no Sudeste e no Nordeste, que se tornará ainda mais seco.

Finalmente, existe o exemplo do licenciamento do Rodoanel, que hoje todos os candidatos ao governo estadual reconhecem não só como necessário, mas urgente.

Este empreendimento foi licenciado pela Secretaria do Meio Ambiente após três anos de trabalhos, mas só depois de removidos inúmeros obstáculos criados por alguns grupos - os quais levaram a ações do Ministério Público Federal - e de vencer uma colaboração problemática do Ibama, além da ausência do governo federal no financiamento da obra.

No plano federal, são notórias as dificuldades que o Ministério de Minas e Energia encontra em licenciar no Ibama usinas hidrelétricas na Amazônia e muitas obras da Petrobrás.

O governo federal fez muito pouco para resolver estes problemas, que dependem menos de mudança da legislação ambiental do que de melhora no desempenho dos órgãos ambientais federais.

É por estas razões que os temas ambientais deveriam ser mais discutidos na campanha eleitoral. O abrandamento das exigências ambientais proposto por alguns setores seria um sério retrocesso.

O que pode ser feito é aperfeiçoar a legislação existente, mas sem perder de vista que o problema urgente é melhorar a eficiência dos órgãos licenciadores, o que foi feito em SP.


Data: 19/09/2006