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Aquecimento do planeta coloca em perigo a economia mundial

Relatório oficial inglês avalia em R$ 15,12 trilhões a conta global da destruição do meio-ambiente até o final do século, se nada for feito a partir de agora

O Reino Unido apresenta-se daqui para frente como um dos principais países envolvidos na luta contra os efeitos do aquecimento climático.

Destinado a servir como base para uma política que se quer decidida, o relatório Stern, que foi tornado público em 30 de outubro, alerta para os riscos de uma recessão econômica "de uma amplidão catastrófica" caso nenhum esforço for rapidamente empenhado na escala do planeta contra o efeito-estufa.

A originalidade deste documento de mais de 600 páginas, que foi encomendado em julho de 2005 pelo poderoso ministro da Economia e das Finanças, Gordon Brown, ao chefe do serviço econômico do governo britânico, Sir Nicholas Stern, está no fato de ele oferecer uma avaliação em números - particularmente preocupante - do que custaria a inexistência de um compromisso da humanidade como um todo frente a essa ameaça.

Segundo explica Sir Nicholas, o produto interno bruto mundial (PIB), poderia sofrer, daqui até o final do século, uma redução "muito grave", situada entre 5% e 20 %. O preço a pagar para esse desaquecimento se elevaria a mais de 3,7 trilhões de libras (R$ 15,12 trilhões).

As enchentes, o derretimento das geleiras, a diminuição dos recursos em água que seriam provocados por essas mudanças ambientais poderiam conduzir à "migração" de dezenas, e até mesmo de centenas, de milhões de "refugiados climáticos" em certas partes do mundo, geralmente as mais pobres, tais como as áreas costeiras por todo o planeta e a África sub-sahariana.

Os perigos apontados por esta perícia não constituem nenhuma novidade, mesmo se o custo anunciado das suas conseqüências é de natureza a impressionar as mentes.

De fato, o objetivo do relatório Stern é de rebater os argumentos que costumam ser alegados pelos Estados os mais poluidores do planeta - os EUA, assim como a Índia e a China -, segundo os quais a luta contra o aquecimento planetário prejudicaria o seu desenvolvimento econômico.

Não é verdade. Segundo Sir Nicholas, a redução desde já das emissões de gases de efeito estufa não iria reduzir o PIB em mais de 1%.

A situação catastrófica anunciada pelo relatório, "de uma amplidão análoga àquelas que se seguiram às grandes guerras e à grande depressão da primeira metade do século 20", foi projetada com base nas previsões oficiais britânicas de um aumento de 4% a 5% daqui até 2050 das temperaturas em relação aos valores atuais.

Além das suas conclusões macroeconômicas, a outra novidade apresentada pelo Stern Report se dá por meio do apelo a agir rápido e das iniciativas efetivas que ele preconiza.

"O aquecimento climático deixou de ser apenas uma questão da alçada exclusiva dos especialistas da proteção do meio-ambiente e dos cientistas", sublinha Beverley Darkin, do Centro de pesquisas londrino Chatham House sobre o problema do aquecimento.

"Este relatório situa a responsabilidade da ação firmemente no campo dos protagonistas da política externa e econômica".

Portanto, a palavra fica cada vez mais com os políticos e os economistas, ao menos aqueles que estão conscientes dos enormes interesses que estão em jogo nesta questão.

Este parece ser o caso na Grã-Bretanha onde está sobressaindo um consenso político tanto à direita como à esquerda em torno deste problema.

Aliás, na esteira da publicação do relatório Stern, o ministro das finanças, que é também o provável sucessor de Tony Blair, pediu aos seus parceiros europeus para diminuírem as suas emissões de CO2 de 30% daqui até 2020, e de 60% daqui até 2050.

O seu colega encarregado do meio-ambiente, David Milleband, propôs por sua vez uma série de "taxas verdes" sobre o transporte aéreo, o transporte rodoviário e sobre alguns equipamentos domésticos.

Em virtude desta estratégia fiscal, que poderia ser revelada, em 15 de novembro, no discurso do Trono, os contribuintes britânicos serão tributados não só sobre a sua renda, mas também em função do seu comportamento ecológico.

"Nós estamos e continuaremos sendo na vanguarda da luta contra as mudanças climáticas", declarou a Comissão Européia, que se mostrou favorável ao relatório Stern.

O Foreign Office (equivalente ao ministério das relações exteriores) insistiu sobre o papel-chave da Alemanha, que assume no próximo ano a presidência conjugada do G8 dos países os mais industrializados e da União Européia, para dar prosseguimento a esta missão na escala mundial.

Do ponto de vista das autoridades londrinas, a prioridade deverá ser de atuar de modo a acelerar as negociações internacionais - visando a encontrar um sucessor ao tratado global de Kyoto de redução do efeito-estufa -, as quais terão início no próximo mês em Nairóbi (Quênia).

Para incentivar os norte-americanos a exercerem uma pressão sobre a administração Bush, que se recusa a ratificar o protocolo, Gordon Brown retirou um trunfo da sua cartola.

Ele contratou os serviços de um novo e influente conselheiro, o antigo vice-presidente americano Al Gore, cujo filme sobre a defesa do planeta Terra vem conquistando inúmeras platéia, e que se tornou com isso um dos protagonistas os mais ardorosos e os mais convincentes da necessidade de uma luta contra o aquecimento e contra a inação da administração Bush.

As associações de defesa do meio-ambiente, tais como o WWF (World Wildlife Fund) entenderam perfeitamente a mensagem, interpretando a publicação do relatório Stern como um "apelo a despertar". (Tradução: Jean-Yves de Neufville)


Data: 01/11/2006