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A conta do aquecimento do planeta

O aquecimento global não é apenas indesejável, mas também muito caro. Dois relatórios divulgados nesta semana prevêem que os gases de efeito estufa lançarão a economia mundial em colapso se não forem controlados

O diretor do departamento de mudança climática da ONU, Yvo de Boer, deixou claro quando apresentou o novo relatório de clima da ONU em Bonn na segunda-feira (20/10):

"Temos que reagir urgentemente à mudança de clima. De outra forma, será muito caro."

Essa conclusão veio junto com um estudo econômico do Reino Unido sobre o aquecimento global - chefiado pelo ex-diretor do Banco Mundial Nicholas Stern e também divulgado na segunda-feira - que prevê uma crise econômica mundial se a mudança climática não for efetiva e imediatamente combatida.

O relatório da ONU detalha uma tendência preocupante: a medida mais importante da influência humana no clima global - a emissão de dióxido de carbono (CO2) - está novamente progredindo na direção errada.

Depois de deter as emissões mundiais de CO2 durante os anos 90, a ONU estima que as emissões de gases que prendem o calor aumentaram de 17,5 para 17,9 bilhões de toneladas entre 2000 e 2004.

Os seres humanos estão se dirigindo para uma catástrofe climática? Quão dolorosas devem ser as medidas contra as emissões? O que vem após Kyoto?

Essas perguntas estarão em pauta na semana que vem em Nairóbi, nas discussões climáticas da ONU. Se os ministros de meio-ambiente e de finanças do mundo vão concordar com qualquer solução é outra questão.

Enormes reduções

Há uma dura batalha pela frente: para provocar uma grande mudança no consumo de energia e na produção pesada, seriam necessárias reduções dolorosas no tráfego e no consumo.

Até a metade deste século, as emissões de CO2 precisam ser reduzidas entre 60 e 80% em países industrializados, disse Boer.

Entre 60 e 80%? As diretrizes de mudança climática dos anos 90 nem chegaram perto desse patamar de redução.

Durante os anos 90, os níveis de CO2 caíram, principalmente porque o fim da União Soviética causou uma desaceleração econômica mundial, além dos avanços em tecnologia ecológica.

As emissões de dióxido de carbono de fato diminuíram entre 1990 e 2004 em 3,3%. Isso pode parecer um sucesso menor em um período de 15 anos - especialmente considerando-se as reduções que o novo relatório sugere - mas ainda assim foi uma conquista.

Para chegar a esse retrato de tendência mundial, o relatório da ONU observou as emissões em 41 países industrializados. Os principais pontos incluem:

- A Alemanha reduziu suas emissões de CO2 entre 2000 e 2004 em modestos 0,7%. Como resultado do colapso da indústria no antigo oriente comunista, os níveis caíram em 17,2% entre 1990 e 2004. Sergej Kononow, da secretaria de mudança climática da ONU, diz que isso "é muito perto da meta do Protocolo de Kyoto".

- As emissões de CO2 nos EUA aumentaram em 15,8% entre 1990 e 2004, incluindo um aumento de 1,3% entre 2000 e 2004.

- Turquia, Espanha e Portugal devem levar o prêmio por lançar ainda mais CO2 na atmosfera. Entre 1990 e 2004, os três países aumentaram suas emissões de gás de efeito estufa em 72,6%, 49% e 41%, respectivamente.

- A principal questão que ficou em aberto no relatório é a Ásia. A China e a Índia, com populações enormes e economias prósperas, nem mesmo foram avaliadas pelo relatório.

O Protocolo de Kyoto previa uma redução de emissões de gás de efeito estufa nas nações industriais até 2012; nessa altura, os países em desenvolvimento entrariam no esforço.

Hoje, com a mudança das tendências desde 2000, esse objetivo parece improvável. O fracasso dos alvos de Kyoto pode complicar negociações mundiais porque as pessoas mais afetadas pela mudança climática vivem em países em desenvolvimento.

A
África será a mais afetada, mas ao mesmo tempo produz uma quantia relativamente pequena de gases de efeito estufa, diz Stern, autor do relatório do Reino Unido.

O comissário da UE Jose Manuel Barroso confessou que países da UE provavelmente não vão cumprir seus alvos de redução de CO2.

"Isto não é uma fabricação de alguns ecologistas", disse ele,"este é um sério problema que ameaça o futuro da vida neste planeta" .

Ainda assim, Barroso disse na segunda-feira em uma conferência de energia em Lisboa que a questão da competitividade e da segurança de fornecimento eram prioridades.

"Podemos crescer e sermos verdes"

Os EUA rejeitaram Kyoto e não reduziram suas emissões de CO2 desde 1990.

Ainda assim, estão lentamente descobrindo seu lado ecológico. Grandes empresas americanas instituíram suas próprias políticas de redução de CO2, e Estados individuais como a Califórnia estão criando suas próprias leis ambientais.

De fato, a Europa não pode simplesmente apontar o dedo para o outro lado do Atlântico. De acordo com o relatório do Reino Unido, a Europa tem que reduzir suas emissões de CO2 em 30% até 2020 e 60% até 2050.

"Isso é possível de se fazer", disse Stern. "Podemos crescer e sermos verdes." Ele argumenta que se a mudança climática for ignorada, o dano à economia global será comparável à Grande Depressão ou às guerras mundiais.

O primeiro-ministro britânico Tony Blair disse que o relatório de Stern "demoliu o último argumento que restava para a inação diante da mudança climática".

O Reino Unido está promovendo uma nova estrutura que inclua os EUA, China e Índia -que não fazem parte do tratado de Kyoto. (Tradução: Deborah Weinberg)


Data: 01/11/2006