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87% dos bolsistas vivem com apenas R$ 300

Programa Conexões de Saberes atinge 1.610 alunos

Comer ou tirar xerox? A dúvida da estudante Marcelly Marques Pereira, de 21 anos, matriculada no 3º período do curso de Museologia da Universidade do Rio de Janeiro (Uni-Rio), durou um ano. Agora, ela recebe bolsa de R$ 300 do programa federal Conexões de Saberes, destinado a estudantes de baixa renda. 'Não sei como cheguei até aqui. As pessoas pensam que difícil é entrar, mas o difícil mesmo é continuar na universidade', disse Marcelly, que tem um filho de 1 ano e 8 meses. Ela mora em Olaria, zona norte do Rio, e anda 40 minutos todos os dias para chegar à Uni-Rio e para voltar para casa, porque não tem dinheiro para pegar os dois ônibus que seriam necessários.

 

Ontem, o Ministério da Educação (MEC) divulgou uma pesquisa feita com 1.142 de 1.610 bolsistas do programa em 32 universidades federais, dos quais 998 (87% dos entrevistados) disseram viver apenas com o dinheiro da bolsa. O trabalho mostra que a média de idade dos calouros bolsistas (24,6 anos) é bem maior que a média dos que não participam do programa (20,7).

 

Morador da zona rural de Pentecoste (CE), Valdey Silva de Souza, de 29 anos, conta que o seu sonho é conseguir uma bolsa do Conexões. Ele diz que não sabia ler nem escrever até os 18 anos, depois estudou muito e fez seis vestibulares até conseguir passar para Agronomia na federal do Ceará, em 2005. Agora, além da faculdade, ele dá aula de matemática todo fim de semana no cursinho gratuito que o ajudou a passar no vestibular. 'Muita gente dizia que eu não ia conseguir, mas eu não podia desistir nomeio.'

 

Referência de qualidade

 

O secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC, Ricardo Henriques, disse que o objetivo é estimular o convívio com a diferença. 'O risco das ações afirmativas é cair na armadilha do exótico. Eu não quero proteger o Valdey, é o contrário. Ele, com essa trajetória excepcional, pode ser uma referência de qualidade. O que a gente quer é mostrar que a diferença pode produzir outro campo de conhecimento. Não é uma visão paternalista nem idealista.'

 

O programa tem Orçamento de R$ 8,5 milhões. Como contrapartida, os estudantes devem cumprir 20 horas semanais de trabalhos comunitários. 'As contrapartidas são totalmente ligadas à formação', diz Henriques.

 

Segundo a pesquisa, 69,9% dos bolsistas nunca estudaram língua estrangeira, 72% cursaram o ensino fundamental em escola pública, 63,7% prestaram vestibular por mais de um ano, 62% têm pai cuja escolaridade não ultrapassa o ensino fundamental e 61% têm mãe na mesma situação.

 

Bolsista há dois meses, Kelly Cristina Santos Gama, de 23 anos, é mãe de Maria Clara, de 1 ano e 3 meses. Ela sempre estudou em escola pública e quer ser escritora. Está no 6º período do curso de Letras da federal do Rio. 'Fui a primeira da família a entrar na universidade. Como o curso era integral, minha mãe trabalhava em dois empregos para me manter.' Hoje, Kelly vive com o dinheiro da bolsa e faz vários planos para o futuro.


Data: 06/11/2006