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“As autonomias administrativa e financeira são o grande gargalo nas universidades brasileiras”

A afirmação é do deputado federal Eduardo Valverde, ao explicar a grande diferença do PLC, de sua autoria, que institui a Lei Orgânica da Autonomia Universitária

 

Um dos temas mais debatidos pelas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), a autonomia universitária foi contemplada no Projeto de Lei Complementar nº 118/2003, de autoria do deputado federal Eduardo Valverde (PT/RO), que institui a Lei Orgânica da Autonomia Universitária. O PLC pretende regulamentar o dispositivo constitucional que garante “autonomia didática-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial” para as universidades brasileiras.

 

No dia 19 de setembro, o projeto, que tramita em regime de prioridade na Câmara dos Deputados, foi aprovado pela Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público. O PLC ainda passará pelas comissões de Educação e Cultura, de Finanças e Tributação, de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Em entrevista ao Portal Andifes, o deputado Eduardo Valverde aborda alguns pontos importantes do projeto de lei complementar, como a transformação das universidades em autarquias especiais e o conceito concreto de autonomia universitária. Bacharel em Administração e Direito pela Universidade de Rondônia (UNIR), Eduardo Valverde está em seu segundo mandato na Câmara dos Deputados.
  
Na justificativa do Projeto de Lei Complementar nº 118/2003, de sua autoria, que institui a Lei Orgânica da Autonomia Universitária, o senhor afirma que, apesar de proclamada na Constituição Federal de 1988 e em documentos oficiais, nunca houve autonomia universitária em sentido pleno no Brasil. Sendo assim, não seria mais adequado que esse tema tramitasse conjuntamente com o Projeto de Lei nº 7200/2006, que trata da Reforma Universitária, uma vez que este estabelece as normas gerais da educação superior?

 

A Constituição Federal estabelece a autonomia universitária de forma abstrata. Mas esse conceito é concreto. É preciso estabelecer qual o máximo e o mínimo de autonomia – o mínimo é ineficiente e o máximo é a soberania. Nesse sentido, o texto do Projeto de Lei Complementar procura compreender o conceito concreto de autonomia. Ele estabelece as autonomias básicas, principalmente a administrativa e financeira, que é o grande gargalo atualmente nas universidades brasileiras.

 

A Reforma Universitária trata do conceito de autonomia, mas no que tange à educação superior de forma geral, envolvendo não apenas a universidade, mas faculdades e centros educacionais. O PLC nº 118/03 trata a universidade como um ente a ser compreendido. Compreendendo o papel de uma universidade pode-se estabelecer o seu grau de autonomia.

 

A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) é muito simplória no tocante a essa questão porque foi elaborada basicamente para o ensino básico, apenas passeando pela educação superior.

 

No projeto de lei complementar, eu procurei estabelecer, com base na Constituição Federal, um marco em que fica claro o conceito de autonomia.

 

O PLC nº 118/2003 transforma a universidade pública criada ou instituída sob forma de autarquia ou fundação de direito público em autarquia especial. Qual a principal mudança ocasionada por essa alteração no regime jurídico?

 

Para falar em autonomia, precisamos definir qual o formato jurídico das universidades. Hoje o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União são os únicos órgãos previstos na Constituição Federal que apresentam um tipo de autonomia muito ampla, diferentemente de autarquias e fundações, onde a autonomia é limitada. Eles apresentam ao Congresso Nacional suas propostas orçamentárias.

 

O projeto de lei complementar garante que as universidades tenham uma autonomia semelhante a desses dois órgãos, remetendo seus orçamentos diretamente ao Congresso Nacional, não precisando de aprovação do Ministério da Educação (MEC). Essa personalidade jurídica diferenciada irá justificar a autonomia orçamentária e financeira das universidades.

 

Uma das emendas apresentadas no parecer da deputada Gorete Pereira (PR/CE), relatora do projeto, proíbe o governo de contingenciar os recursos das universidades, sejam eles próprios ou provenientes de transferências. Segundo ela, essa é uma medida essencial para garantir a autonomia universitária. O senhor concorda com a posição da relatora? Em que sentido poderia haver perda da autonomia neste caso?

 

A emenda da deputada Gorete Pereira coloca um atributo da autonomia universitária, que é o não contingenciamento. Essa emenda representa uma consequência da autonomia porque, se o Poder Executivo contingencia, estará limitando a autonomia e entrando em um espaço de competência apenas da universidade.

 

Outra emenda aprovada estende a autonomia às instituições de pesquisa científica e tecnológica. Obedecendo as universidades ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, de acordo com o art. 207 da Constituição Federal, porque o projeto inicial não dotava essas instituições de autonomia? O senhor concorda com a emenda?

 

Na verdade, o projeto original coloca as três características da autonomia – a pedagógico-científica, a administrativa e a financeira. A indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão está na própria definição do artigo primeiro do projeto de lei complementar. Nesse sentido, a emenda deixa clara essa noção, mas é totalmente dispensável, uma vez que o conceito está no projeto.

 

O projeto de lei complementar constitui o Sistema de Instituições de Ensino Superior, para estimular ações de cooperação entre seus integrantes. Esse sistema será dirigido por um Conselho Superior, composto por representantes das universidades públicas e particulares, do Poder Executivo, dos docentes e dos alunos. Entre os objetivos deste Conselho está o de estabelecer critérios uniformes para convalidação de diplomas de universidades estrangeiras de países com quem o Brasil mantenha tratados e acordos bilaterais. O senhor acredita que essa medida tornará menos burocrático o processo de convalidação de diplomas? Em que sentido?

 

A idéia do projeto de lei complementar é criar um sistema de educação superior que dê uma sinergia ao ensino para a cooperação técnico-científica, o intercâmbio de professores, a complementariedade de ensino, de pesquisa e de extensão. Na Amazônia, por exemplo, existem muitas universidades que poderiam estar trocando entre si e com outras regiões, com maior eficácia, informações, complementando linhas de pesquisa, promovendo o intercâmbio de professores e de alunos e criando, com isso, uma maior dinâmica do processo de conhecimento.

 

É natural que todo conhecimento adquirido pelas pessoas possa ser útil em outras regiões e países. Quando há limitação a isso, estamos apenas contribuindo para a troca de mercadoria e não de conhecimento. Dessa forma, é correta a convalidação de diplomas para que as pessoas possam exercitar o conhecimento adquirido ou desenvolver atividades relativas à sua área de formação naqueles países que possuem tratados e acordos bilaterais.

 

A deputada Manuela D’Ávila (PcdoB/RS) apresentou voto em separado. Entre seus argumentos estava o de que o projeto de lei complementar, em seu artigo 30, alterava erroneamente a Lei 8.666/1993, ao dispensar a licitação “nas compras ou contratações das instituições federais de ensino, pertinentes a serviços de natureza singular, medicamentos, suprimentos e equipamentos hospitalares ou aqueles destinados ao ensino, à pesquisa ou à extensão, adquiridos no mercado interno ou externo, mediante justificativa pormenorizada, desde que integrem projetos de ensino, pesquisa ou extensão e que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado”. Segundo a deputada, a alteração tornaria menos eficiente a busca pelo menor valor na prestação do serviço e compras pelo Poder Público. Qual a sua opinião a respeito?

 

A deputada repercutiu uma opinião do MEC em seu voto em separado. Evidentemente que o Ministério é contrário à autonomia, na forma como é proposta no projeto. Algumas reitorias e algumas procuradorias universitárias, ao se manifestarem, encaminharam pareceres contrários a essa definição porque entendem que quanto mais obscuro o conceito, mais fácil é de limitar.

 

Na sua opinião, como os dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) podem ajudar na aprovação do projeto de lei complementar?

 

Boa parte do projeto de lei complementar baseou-se em um projeto da Universidade Federal da Bahia (UFBA), que foi veiculado há uns 4 anos no site da instituição. Eu pressuponho que ele foi formulado a partir de fóruns de debate no meio acadêmico.

 

A forma como as IFES poderia ajudar na aprovação do projeto é expondo a sua opinião. Nada melhor do que a própria instituição, que quer ressaltar a sua autonomia universitária, apresentar o seu entendimento a cerca do projeto de lei complementar.

 

As instituições devem divulgar e promover debates quanto ao projeto de lei complementar, que institui a autonomia universitária para tornar mais sólidos os princípios apresentados. A discussão é importante, uma vez que o projeto não é perfeito, precisando ainda ser aperfeiçoado.

 

(Lilian Saldanha - Assessoria de Comunicação da Andifes)


Data: 09/10/2007