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“A nova geração precisa se interessar pelo semi-árido”, afirma pesquisador

O botânico José Luciano Santos proferiu palestra na UFCG

 

Mestre em Botânica, bacharel em Recursos Naturais, com livros publicados sobre plantas arbóreas e medicinais do Nordeste, o pesquisador de Embrapa Semi-árido e professor José Luciano Santos de Lima esteve na semana passada no campus da UFCG em Campina Grande, onde proferiu palestra para alunos do curso de graduação em Engenharia Agrícola.

 

Várias outras cidades interioranas do Nordeste, a exemplo de Crato, Milagres, Barbalha, Salgueiro, Santa Luzia e Junco também serão visitadas, no que o pesquisador classifica de “expedição”. O objetivo, segundo ele, é interagir com pesquisadores locais, verificar o grau de interferência antrópica, coletar dados, ocorrências de espécies características locais e planejar quais ações nas áreas da educação ambiental podem ser implantadas, “para facilitar aos jovens o acesso ao conhecimento da Caatinga”.

 

"É possível que um grande cientista de caatinga aflore vindo de qualquer lugar dessa região. As condições são difíceis, mas foram bem piores. Na verdade, não temos mais cientistas em lugares mais isolados dos grandes centros porque as crianças não têm oportunidade de ser apresentadas ao que tem de bom do lugar e em ciência", observou.

 

Com relação às estratégias para manejo da Caatinga, ele afirma que o Brasil precisa aumentar em mais de dez vezes o número de pessoas qualificadas para promover o desenvolvimento tecnológico da região de forma sustentada. "Temos muitas iniciativas bem-sucedidas, mas precisamos de mais", disse o pesquisador. Segundo ele, a maioria dos manejos ecologicamente corretos está nas Regiões Sul e Sudeste.

 

De acordo com Lima, o estado de Paraíba apresenta um quadro caótico. “Há uma tradição da criação extensiva de animais, da retirada das madeiras de lei, do uso de lenha para indústrias ceramistas e da construção civil, e o despreparo para conviver com as secas, e, agora com as enchentes”, disse. O pesquisador ressaltou que em apenas 10 anos a paisagem interiorana sofreu mudanças drásticas, com o desaparecimento de vários animais.

 

Para mudar o quadro, Lima destacou a participação de ações e projetos de ONGs e de instituições de ensino superior, como a UFCG, com seus programas de manejo de bacias, barragens subterrâneas, manejo e pasto e produção de forragens, banco de sementes nativas, água doce e do dessalinizador, entre outros, na socialização e popularização das ciências, além de facilitar o acesso aos recursos tecnológicos, às áreas mais isoladas.

 

“A nova geração precisa se interessar pelo semi-árido”. A nossa meta é continuar descobrindo e classificando os exemplares arbóreos e arbustivos, incluindo muito mais gente no processo, que podem melhorar a condição de vida, fomentar a indústria e o processo de desenvolvimento da dessa região do país, de forma planejada e harmônica, explicou Lima.

 

Veja trechos da entrevista concedida a membros do Laboratório Interdisciplinar de Ciências e Tecnologias Agroambientais (LICTA), da UFCG.

 

O que levou o senhor a estudar as plantas do semi-árido?

 

Eu tenho a formação em Técnico em Agricultura. Fui interno por 7 anos na Escola Agrotécnica Federal de Barreiros, PE. Tive aulas de solos, jardins, cuidados veterinários, máquinas agrícolas, história natural, matemática, francês, etc. Concluí em 1961 e o meu primeiro trabalho foi nos Tabuleiros Costeiros, em Alagoas. Daí, me interessei em estudar as plantas madeireiras.

 

O solo da Caatinga não é o principal recurso natural?

 

O ciclo da mineração é limitado em qualquer parte. É explorado pelo homem. Este e os animais têm que se alimentar, necessitando de ambiente equilibrado e sustentável para obtenção de comida. Tudo tem tido um grande avanço e nas áreas de mineração mais esgotadas, há possibilidade de recuperação. É caro e lento, mas tem jeito.

 

Qual tem sido o papel da universidade na preservação dos recursos naturais?

 

Por que a Melanoxylon brauna do Nordeste está ficando escassa? Trata-se da braúna preta e não saberemos de imediato o motivo desse desaparecimento. Agora, quando um aluno é chamado para estudar o caso, descobre a sua ocorrência em outras regiões, etc., terminando por concluir sobre essa hipótese. Há investimentos para isso, os laboratórios estão aparelhados, e a pesquisa avançando.

 

O senhor tem percorrido boa parte da região semi-árida, inclusive na Paraíba. Qual a sua avaliação quanto ao estado de conservação?

 

De 1972 a 1974 estivemos envolvido na elaboração do diagnóstico sócio-agro-econômico na região do Apodi, RN, e também do inventário florestal. Já naquela época as serras estavam desnudas. Os animais silvestres foram rareando. Ocorrência do Cryturellus parvirostiris (lambu) e Cavia aperea (preá) já era raridade. Na Paraíba não tem sido diferente. A queima de madeira nos fornos tem sido o maior descontrole.

 

Quais as iniciativas de convivência com o semi-árido que o senhor tem visto e que estão dando certo?

 

Existe o plano de manejo da Caatinga com experimentação florestal, espalhado pelo espaço geográfico deste importante bioma nacional. Aí, alguns exemplares são submetidos à mensuração agronômicas, mensalmente, em que, diâmetro do caule, altura de planta, número de ramos, etc. são registrados, para posterior comparação e análise.

 

Por que pesquisadores estrangeiros se interessam tanto e investem recursos no semi-árido?

 

O semi-árido é um valioso recurso natural que temos e eles não. Para se ter uma idéia, na Inglaterra há programa geneticista em que seus membros vão para outros países só buscar sementes.

 

Como começa a destruição da vegetação do semi-árido, não são pelas queimadas?

 

As queimadas são uma delas. A cultura intensiva e a pecuária vem a seguir. A título de exemplo, a implantação da soja nos cerrados da BA está acabando com vegetação originária. Em Barreiras, já se percebe contaminação do solo que afeta animais e microrganismos. O avanço de querer mais dinheiro deve ter seus limites.

 

Quais as plantas mais importantes dentre as que o senhor já pesquisou?

 

Depende do foco de observação. Se for madeira para fins de construção civil, se tem a Tabebuia impetiginosa (pau d’arco) Cedrela odorata (cedro) e Myracrodruon urundeuva (aroeira). Se for para fins medicamentosos, se dispõe do Chenopodium ambrosioides (mastruz) da Aloe vera (babosa) ou da Sideroxylon obtusifolium (quixabeira) que podem ser desidratados e vendido. Cada região tem seu potencial vegetal do qual ainda precisamos conhecer.

 

Quem mais tem estudado as plantas do semi-árido?

 

As principais universidades federais e estaduais, institutos de pesquisas e segmentos da iniciativa privada.

 

Quanto tempo será necessário para recuperar essa região?

 

Deixando em repouso e sem a presença humana, entre 10 a 20 anos já se formará uma capoeira, em que boa parte dos animais se abrigarão.

 

Suas considerações finais.

 

“Estou sempre agradecido a todos da UFCG pela acolhida e atenção de sempre. Também a vocês alunos que aqui se deslocaram e interagiram com a minha mensagem. Muito obrigado a todos. E não esqueçam que o semi-árido precisam de vocês”.

 

(Kennyo Alex, Ascom/UFCG, com texto fornecido pelo professor Jógerson Pinto, do LICTA/UFCG)


Data: 15/05/2008