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Pós-graduação stricto sensu a distância recebe aval do MEC

Capes já avalia propostas de mestrado e doutorado em EAD

 

A pós-graduação stricto sensu a distância já tem o aval do MEC (Ministério da Educação) para se tornar realidade no meio acadêmico brasileiro. Conforme antecipou o secretário de EAD (Educação a Distância) do Ministério da Educação, Carlos Eduardo Bielschowsky, no ESUD (Congresso Nacional de Educação Superior a Distância), realizado em abril, a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) já recebe propostas de cursos de mestrado e doutorado nesta modalidade. A expectativa agora, é que a contrapartida venha das IES (Instituições de Ensino Superior) por meio do envio de projetos de qualidade.

 

"Para que haja cursos de pós-graduação stricto sensu no Brasil, basta que as IES enviem projetos de qualidade. Essa será a função das universidades brasileiras", enfatiza o diretor de Educação a Distância da Capes, Celso Costa. Segundo ele, o compromisso da Capes será avaliar as propostas, planos pedagógicos, sugestões de corpo docente e infra-estrutura, para conceder ou não a licença de execução do curso. "O mesmo procedimento utilizado para a aprovação dos mestrados e doutorados presenciais se repetirá para os programas de EAD", explica.

 

Portanto, as universidades interessadas em acrescentar em seus catálogos de cursos opções de mestrado e doutorado a distância já podem elaborar seus projetos e enviá-los à Capes. Costa garante que a determinação não será exclusiva às universidades públicas. "Não há restrição em relação à constituição da universidade, ou seja, independe se ela é pública, privada, comunitária ou confessional. Também não há limite de projetos apresentados por instituições. Basta que as propostas tenham qualidade", afirma Costa.

 

A medida é uma determinação legal desde 1996, quando foi criada a lei nº 9.394. De acordo com o diretor de regulação e supervisão em EAD do MEC, Hélio Chaves Filho, a existência de mestrado e doutorado a distância no Brasil sempre esteve assegurada pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). Tanto que já houve experiências nesse sentido (veja no box ao lado o caso da UFC - Universidade Federal do Ceará). O artigo 80 da lei prevê o desenvolvimento de programas de ensino a distância em todas as modalidades de ensino, o que inclui também a pós-graduação stricto sensu. "Mas a legislação determina que qualquer proposta seja aprovada pela Capes antes de ser colocada em prática", explica ele.

 

Essa lei, segundo Chaves Filho, ganhou mais força com a elaboração do decreto 5.622, de 19 de dezembro de 2005. "A partir dessa determinação, todas as instituições de ensino tiveram abertura legal para apresentar seu projeto de mestrado e doutorado a distância à Capes", enfatiza. "A Coordenação não pode recusar receber a proposta, mas ela tem todo o poder de não aprová-la, desde que a rejeição seja fundamentada", acrescenta o diretor.

 

Para o presidente da ABED (Associação Brasileira de Educação a Distância), Fredric Michael Litto, apesar da lei, o conservadorismo da Capes, bem como da academia, foram e ainda são os principais responsáveis pelo tardio reconhecimento da Educação a Distância na pós-graduação brasileira. "O novo geralmente assusta. Essa é uma tendência normal em qualquer corporação, inclusive na educação. É difícil romper com o preconceito em relação às inovações", opina. Litto acredita que grande parte desse tradicionalismo também esteja relacionada ao desconhecimento da modalidade.

 

O diretor de EAD da Capes reconhece o conservadorismo da instituição, mas justifica a postura pela grande preocupação e responsabilidade com o desenvolvimento científico do Brasil. "O tradicionalismo é uma forma de garantirmos a metodologia, o bom desempenho do curso e dos alunos, bem como, sua aceitação no mercado de trabalho. Temos o compromisso com a qualidade do ensino científico, então qualquer decisão deve ser bem estudada e planejada para que essa trajetória seja traçada com segurança", alerta Costa.

 

O tutor dos cursos de EAD da Universidade Anhembi Morumbi João Mattar defende a atitude da Capes. "Essas demoras são positivas. Existem muitos interesses e muitas discussões que devem ser levadas em consideração antes de qualquer decisão, já que se trata de um assunto sério: o desenvolvimento educacional brasileiro", argumenta. Na opinião dele, é preciso ter no mínimo uma exigência sadia. "As mudanças aconteceram num ritmo aceitável. Não foi nem muito demorado, nem muito precipitado", avalia.

 

Para o secretário de Educação a Distância do MEC, Carlos Eduardo Bielschowsky, esse foi o momento ideal para que a Capes pudesse tomar uma decisão com mais segurança. "A UAB (Universidade Aberta do Brasil) se expandiu com cursos de qualidade e os alunos da educação a distância do País conseguiram comprovar seu elevado desempenho no Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes)", relata Bielschowsky. Esses, segundo ele, são fatores que comprovam a eficácia da modalidade na graduação e indicam uma provável expansão bem-sucedida para outros níveis de ensino como a pós-graduação. "Se é possível nesse nível de ensino, então por que o mesmo não poderia se repetir na pós-graduação stricto sensu?", questiona ele.

 

Repercussão no meio acadêmico

 

Apesar da perspectiva de mestrado e doutorado a distância já ser uma realidade no Brasil, a iniciativa ainda gera divergências entre os especialistas do meio acadêmico. De um lado, há quem defenda a EAD como contribuição para a expansão do ensino científico do País. Do outro, os que acreditam que a modalidade possa comprometer a qualidade da pós-graduação brasileira.

 

"As literaturas estrangeiras apontam que 20% do corpo docente é aberto à novidades do ensino, outros 20% não conhecem, mas - em nome da tradição - se posicionam contra inovações. Os 60% restantes são mais cautelosos, porém caminham conforme o vento. É isso que acontece com a EAD no Brasil", declara o presidente da ABED. Mas Litto é otimista. "O Enade deu novo fôlego à modalidade. O conservadorismo dos professores começa a diminuir e o MEC abre com isso mais uma válvula de escape", afirma.

 

Na opinião do diretor da UnisulVirtual (Centro de Cursos de Educação a Distância da Universidade do Sul de Santa Catarina), João Vianney, a implantação dos cursos de mestrado e doutorado a distância só tende a contribuir com a melhoria do ensino do País. "Quanto mais brasileiros na pós-graduação, melhor será a educação do Brasil", diz ele. Atualmente, de acordo com Vianney, o conhecimento de alto desempenho só é accessível para quem tem condições de se deslocar para as grandes cidades.

 

A coordenadora do GVnet (Programa de Educação a Distância da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas), Marta de Campos Maia, corrobora a idéia de Vianney e aponta a proporção da distribuição das universidades brasileiras em território nacional para fundamentar essa argumentação. "As instituições de Ensino Superior estão presentes em apenas 30% do País. Ou seja, 70% desse gigante chamado Brasil não conta com o aporte das universidades", cita.

 

Por esse motivo, Vianney acredita que a EAD revoluciona, permite a expansão e a democratização da pós-graduação, além de melhorar a qualificação profissional do brasileiro. "Ou seja, para educação o ensino a distância é um passo de modernização", enfatiza. Marta arrisca dizer ainda que a modalidade também contribui para o desenvolvimento econômico do País. "As experiências mundiais comprovam que quanto maior o nível de educação dos habitantes de um país, melhor sua situação econômica. Então o que temos a perder?"

 

Apesar da argumentação dos especialistas, o pró-reitor de pós-graduação da USP (Universidade de São Paulo), Armando Corbani Ferraz, não acredita na eficiência da modalidade no ensino científico. Para ele, a criação de mestrados e doutorados a distância vai modificar o conceito do que é fazer um curso stricto sensu. "A pós-graduação vai acabar virando uma escola, sendo que ela não tem essa característica", contesta. De acordo com ele, a medida será um atraso para o país. "Será um retrocesso educacional, pois a universidade dirá que forma um mestre ou um doutor, mas na verdade não formará", argumenta.

 

Marta - assim como Vianney, Litto e Mattar - discorda de Ferraz e acredita que é extremamente viável realizar cursos de pós-graduação a distância. "No mestrado e no doutorado, além de algumas aulas presenciais, há o desenvolvimento de pesquisa - geralmente já realizada a distância - e o acompanhamento do orientador", descreve a professora. "Desta forma, é possível adaptar o conteúdo das aulas presenciais ao método da EAD. Não haverá perda de nenhum conceito. Isso já está comprovado na graduação. Tudo é uma questão de flexibilização do modelo", sugere.

 

O presidente da ABED vai além e ressalta que não é a modalidade de ensino que garante a qualidade da aprendizagem. "Tanto no ensino a distância quanto do presencial é o empenho do aluno que determinará sua eficiência", conta. Na EAD, Litto defende a necessidade da maturidade e organização do aluno, características de um estudante de pós-graduação. "Tais características são mais presentes nos alunos da pós-graduação do que na graduação. Esse público é mais maduro, mais experiente, além de ter mais autonomia para estudar sozinho. Pelo menos é isso que se espera de um profissional que queira seguir pelo caminho acadêmico ou científico", afirma.

 

O pró-reitor Ferraz rebate que embora o perfil do aluno de pós-graduação se encaixe com os padrões da modalidade a distância, o grande problema é que um curso de EAD não poderá reproduzir a vivência acadêmica, fundamental para a maturação de um bom projeto científico. "Tanto no mestrado como no doutorado é preciso desenvolver um projeto de pesquisa e não há como fazer isso a distância. O ambiente acadêmico é que contribui para a realização desse trabalho científico", ressalta. "A EAD vai arrebentar o 'diamante da educação brasileira'. Tudo que foi construído até agora sobre a pós-graduação no Brasil será destruído", opina.

 

O secretário Bielschowsky discorda de Ferraz. Segundo ele, as pós-graduações, assim como as graduações, deverão ter uma porcentagem de aulas presenciais, o que não comprometerá a vivência acadêmica. "Os cursos não serão 100% a distância. Haverá, sim, encontros presenciais para dar suporte as aulas práticas e não perder essa tão importante vivência acadêmica", garante. O secretário afirma ainda que é preocupação do MEC e da Capes assegurar a qualidade do ensino científico. "O controle será o mesmo ou até mais rígido do que é feito no ensino presencial. Tudo isso para garantir que o 'diamante da educação' não se estilhace", enfatiza.

 

Para Litto, é possível desenvolver projetos de programas de pós-graduação a distância tão bons quanto os presenciais. "Há diversas universidades espalhadas pelo mundo e reconhecidas internacionalmente que já desenvolvem pós-graduação a distância com qualidade. Se é possível produzir projetos de excelência fora do país, por que não é possível fazer o mesmo no Brasil?", questiona.

 

(Portal Universia)


Data: 01/07/2008