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Estados podem questionar constitucionalidade do piso dos professores no STF

Principal queixa é o aumento de 20% para 33% das atividades extra-classe dos professores

Os secretários de educação reunidos em Porto Alegre na 3ª Reunião do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) consideram a possibilidade de os estados entrarem com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a lei do piso nacional do magistério.

Desde a sanção presidencial a entidade pede a revisão de alguns dispositivos da lei que seriam inconstitucionais. O principal questionamento dos secretários é com relação a um artigo que aumenta de 20% para 33% a carga horária de atividades extraclasse dos professores, o que exigirá a contratação de novos profissionais para atuar em sala. Como a regra já vale a partir da sanção, o Consed argumenta que a lei é inconstitucional porque cria uma nova despesa no ano em curso.

Na reunião da última sexta-feira (1º), os secretários decidiram que vão encaminhar aos governadores um estudo sobre o impacto das remunerações e sobre a inconstitucionalidade do projeto.

“A Adin nós entendemos que é uma ação administrativa e cabe aos governadores e prefeitos decidirem se vão entrar ou não [com a ação]. Independente de ter impacto [financeiro] ou não, a lei tem problemas”, ressaltou a presidente do Consed, Maria Auxiliadora Rezende.

O número de professores que deverão ser contratados para atender à nova determinação varia de 900, em Rondônia, a 27.300, no Rio Grande do Sul.

Outro caminho para a revisão da lei é um novo debate no Congresso Nacional. O secretário executivo do Ministério da Educação (MEC), Henrique Paim, anunciou durante a reunião que o Executivo já encaminhou para o Congresso um novo projeto de lei em regime de urgência. A matéria revê um outro dispositivo da lei relativo ao indexador para o cálculo de reajuste anual do piso.

“O projeto tem alguns aspectos que impactam a gestão das secretarias estaduais e será feita uma gestão para que o debate se estabeleça e possamos eventualmente corrigir essas questões”, afirmou Paim. Ele acredita que o novo PL, apesar de não tratar da questão da carga horária, pode abrir esse debate. Os estudos do Consed também serão encaminhados ao Ministério da Educação (MEC) e ao Congresso. A previsão é que o Consed se reúna com o ministro Fernando Haddad para discutir o problema no dia 14 de agosto.

A secretária de educação do Rio Grande do Sul, Mariza Abreu, disse que a lei uma é “batata quente” que agora está nas mãos dos secretários e que em ano eleitoral "ninguém diz não" para aumento de salário, por isso a lei foi aprovada no Senado.

“O piso é importante, nós estamos em um caminho de valorização, então a gente não pode entrar por um caminho estreito que não vai prosseguir”, avalia a presidente do Consed.

Ela ressaltou que a intenção não é entrar em confronto com os professores, mas que a lei já está valendo e os secretários acabam sendo os responsáveis legais pelo seu cumprimento. Alguns estados, como o Mato Grosso do Sul, já encaminharam os estudos sobre a lei para análise nas Procuradorias Gerais dos Estados.

Realidades diferentes

A presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Educação, Maria Auxiliadora Resende, alerta que o problema da nova lei não é o piso salarial. A imposição de uma regra de carreira de magistério para todos os estados e municípios pode comprometer as contas.

- Por que os estados se posicionam contra a lei?

Não estamos questionando o piso de R$ 950, que sempre agradou a todos. O problema está em relação à carga horária definida para os professores. Existem 27 estados com realidades tão diferentes que uma regra única nacional se torna um problema.

- Por que a polêmica?

O Plano Nacional de Educação coloca como recomendação que o professor dedique 20% a 25% de seu tempo para preparação das aulas. A nova legislação passa para um terço do tempo, ou 33%. Isso tem implicação para as contas de estados e municípios. Por levantamentos que estamos fazendo, para cada quatro professores será preciso contratar mais um. Em média, isso aumenta em 20% a folha de pessoal de várias unidades da federação, um impacto pesado. E já vale a partir deste ano.

- O projeto está sendo discutido há vários meses. Esse detalhe passou despercebido?

Não, mas não constava do projeto original e, desde que apareceu, nos manifestamos contrariamente. O Consed enviou documentos aos governadores, mas não nos cabe pressionar o parlamento. No Senado, o texto não tramitou.

'Tem de haver federalização'

Principal defensor do projeto que fixou o piso, o presidente da Comissão de Educação do Senado, Cristovam Buarque (PDT-DF), disse que a reação dos secretários estaduais de Educação é mais um sinal de que o ensino fundamental precisa ser federalizado.

- Como o senhor recebe a notícia?

Isso confirma o que defendo há muito tempo. Tem de haver a federalização da educação de base. Não há como deixar uma coisa dessa importância nas mãos de estados e municípios. Primeiro, porque são muito desiguais. A diferença per capita da renda de um município muito rico para um muito pobre é de cem vezes. Não podemos deixar a educação nas mãos dos poucos recursos que os prefeitos pobres têm.

- Como resolver o problema? Teme que a lei não seja cumprida?

A não ser que os governos não queiram cumprir. A lei vai fazer com que o aumento seja em três momentos diferentes. O piso não é de R$ 950 já no primeiro momento. Vai chegar a esse patamar só em 2010. Os estados têm como fazer esforços para aumentar um pouco o dinheiro necessário para a educação. Eu vi que o governo de São Paulo disse que precisaria de R$ 1,4 bilhão. Tenho minhas dúvidas. Esse montante representa 1,5% da receita do estado.

- Falta prioridade para a educação?

Não tenho a menor dúvida. Um dia desses foi fixado um piso de R$ 10,5 mil para os auditores fiscais e ninguém protestou.

(O Globo, 5/8)


Data: 05/08/2008