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Universidades reprovadas não são fiscalizadas desde 95

MEC não cumpriu lei que determinava recredenciamento e análise de instituições

Universidades reprovadas pelo Ministério da Educação estão ao menos há 13 anos sem passar pela fiscalização que o próprio governo deveria fazer nas instituições -processo chamado de recredenciamento. Em uma das escolas, a última análise foi feita em 1975.

Desde 1996, com a Lei de Diretrizes e Bases, o governo deveria analisar periodicamente indicadores como qualidade do corpo docente da instituição e projeto pedagógico, entre outros pontos. As que não conseguissem o recredenciamento não poderiam abrir turmas.

Norma posterior à lei fixou em cinco anos o prazo para obter o recredenciamento. Levantamento feito pela Folha, porém, aponta que das nove instituições reprovadas pelo MEC (conceitos 1 e 2 no Índice Geral de Cursos), em seis a autorização é anterior a 1996.

Especialistas afirmam que a situação demonstra uma falha do MEC no controle da qualidade das escolas, tanto da gestão FHC quanto Lula. A pasta admite o problema, mas afirma que criou mecanismos para aperfeiçoar o sistema.

Descredenciamento

Nesta semana, durante o lançamento do Índice Geral de Cursos, o ministro da Educação, Fernando Haddad, afirmou que, "no limite, as instituições mal-avaliadas poderão ser descredenciadas".

Haddad se disse mais preocupado com as universidades com notas baixas, pois elas têm autonomia para ampliar vagas e cursos sem prévia autorização do ministério.

"Ele não precisaria criar outra avaliação, que ainda por cima é contestada, para descredenciar uma escola ruim. Bastaria olhar a documentação dessas escolas", disse o membro do Conselho Nacional de Educação, Edson Nunes.

Em 2001, o então ministro Paulo Renato Souza chegou a baixar uma portaria que determinava que as universidades tinham 90 dias para começarem o processo de recredenciamento. "A resistência das instituições foi grande, não consegui aplicar o processo. Muitas obtiveram liminares na Justiça."

Sobre a possibilidade de descredenciamento de instituições, Paulo Renato, deputado federal pelo PSDB-SP, disse: "Tentei fechar alguns cursos e não consegui, mesmo tendo uma série de elementos técnicos. Desejo sorte ao ministro".

Em geral, as universidades abertas antes de 1996 afirmam que não precisam passar pelo recredenciamento, pois foram criadas antes da lei que determina o procedimento.

A tese, porém, não é aceita nos órgãos normativos educacionais (como conselhos de educação). Além disso, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, de 2004, sinaliza que a Justiça determinará que as escolas passem pelo processo.

"O recredenciamento está de fato atrasado, em parte por causa desse embate jurídico", disse o presidente do Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, Paulo Barone. "E esse é um procedimento importante para garantir a qualidade de ensino."

Apesar de terem o recredenciamento anterior a 1996, as universidades não estão irregulares. Isso porque, em 2004, a gestão Lula determinou que a renovação só precisaria ser feita após a finalização do Sinaes, sistema de avaliação do ensino criado pelo atual governo.

O Sinaes conta com três anos de avaliação de estudantes, por meio do Enade, visitas de técnicos às instituições e análises internas do ministério. Não há data para finalizar o primeiro ciclo avaliativo.

"Esses dispositivos que mudam prazos para recredenciamento demonstram a incapacidade de o MEC conseguir aplicar a legislação", afirmou a consultora em ensino superior, Abigail França Ribeiro.

MEC admite demora e diz que irá corrigir problema

O Ministério da Educação admite que as universidades mal-avaliadas já deveriam ter passado pelo processo de recredenciamento, o que poderia melhorar sua qualidade de ensino. Afirma, entretanto, que a situação se deve à implementação de um sistema mais amplo de avaliação.

"Em tese, as escolas já deveriam ter passado pelo processo de recredenciamento, mas é melhor que o façamos adequadamente, de forma madura, e dentro daquilo que estabelece uma lei mais recente, a do Sinaes, de 2004. Portanto, no espírito dessa lei, estamos cumprindo o que ela determina", afirmou o secretário de Ensino Superior do MEC, Ronaldo Mota, por e-mail.

O Sinaes prevê exames aos estudantes (o Enade), visita de técnicos do ministério às escolas e análises internas da pasta. Segundo o secretário, as visitas dos técnicos vão durar um ano. Ainda não há data para a conclusão de todo o processo.

Segundo o secretário, durante a análise as universidades poderão ser obrigadas a assinar um protocolo de compromisso, com cronograma de saneamento das deficiências.

No decorrer deste período, afirma, a instituição poderá ser impedida de abrir novos cursos. No final da avaliação, se não conseguir melhorar, poderá ser descredenciada.

Mais de 30 anos

Questionado sobre o fato de haver universidade cujo recredenciamento tem mais de 30 anos, Mota afirmou: "A questão não é simples. Havia, e de certa forma há ainda, tese segunda a qual universidades anteriores à Lei de Diretrizes e Bases não estariam sujeitas a processo de recredenciamento. Importante destacar, de novo, que a lei do Sinaes define nova fase na institucionalização dos processos avaliativos, que são a base dos processos regulatórios".

O secretário disse ainda que o MEC tem feito supervisão de diversos cursos, como nas áreas de direito, medicina e pedagogia, o que "tem bastante similaridade, embora com diferenças, com os processos de recredenciamento de instituições".

Mota afirma que, por conta do processo de supervisão, uma instituição já foi descredenciada e teve seu curso fechado (Faculdade 7 de Setembro, em Caldas Novas-GO).

Pior universidade do país obtém mais verba do governo

O governo de Alagoas liberou ontem um crédito suplementar de R$ 250 mil para a Uncisal (Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas). O repasse do dinheiro acontece quatro dias após a divulgação do ranking das instituições de ensino superior pelo Ministério da Educação, no qual a Uncisal ficou no último lugar entre as universidades do país.

Desde quarta passada, cerca de 300 alunos estão acampados na reitoria da universidade. Eles reivindicam melhorias na infra-estrutura dos cursos, na titulação dos professores e na reestruturação do hospital-escola.


(Folha de SP, 13/9)


Data: 15/09/2008