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América Latina e África: níveis semelhantes de desigualdade

Segundo relatório da ONU, São Paulo e Rio são mais injustas que Nairóbi, capital do Quênia

Relatório sobre o Estado das Cidades Mundiais 2008/09, divulgado ontem pela Organização das Nações Unidas (ONU), mostra que a desigualdade nas maiores cidades da América Latina está no mesmo nível de um conjunto de 26 cidades africanas. O início do capítulo Harmonia Social, que traz a comparação, é ilustrado por foto de Tuca Vieira que mostra um prédio com varandas e quadra de tênis separado de uma favela por um muro, em São Paulo.

O grupo de 19 cidades da América Latina e do Caribe apresentou coeficiente Gini de 0,55, ante 0,54 para as 26 cidades africanas selecionadas pela ONU. São Paulo está no mesmo nível de Bogotá (0,61), na Colômbia, mas o índice na capital foi superior, por exemplo, ao de Nairóbi (0,59), no Quênia.

"A América Latina é campeã de desigualdade. Colômbia e Brasil são os dois que têm a maior quantidade de cidades com grande índice de desigualdade", afirmou Cecilia Martinez, diretora para a América Latina do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos.

Gini é o sobrenome do matemático italiano Corrado Gini, que desenvolveu o coeficiente, adotado pela ONU para medir igualdade ou desigualdade dos países na distribuição de renda da população. O cálculo leva em consideração variáveis econômicas para verificar o grau de espalhamento da renda, em escala de zero a 1. Quanto mais próximo de zero, mais igualitária é a sociedade. Quanto mais se aproximar de um, maior é a desigualdade. O Gini não mede riqueza ou pobreza de um país, e sim a homogeneidade econômica e social. "As cidades que têm mais de 0,4 (limite internacional de alerta) devem procurar melhorar essa diferenciação", disse Cecilia.

A manutenção da desigualdade em grandes metrópoles não é exclusividade de países africanos e latino-americanos. "Algumas cidades dos EUA, como Atlanta, Washington, Nova Orleans e Nova York, têm índice de Gini muito grande, o mais alto do País, similar ao de cidades como Buenos Aires (0,52). É um fenômeno que acontece não só aqui", disse Cecilia. "O importante agora não é saber de onde veio (o problema), mas o que fazer. Temos de trabalhar mais nas zonas de maior pobreza, onde há um índice maior."

PAC

Ela avalia que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal, "pode melhorar a situação". "Deve-se trabalhar muito nas zonas de pobreza. É importante melhorar os sistemas de transporte e certamente a condição social e econômica. A sustentabilidade da cidade implica em buscar a igualdade", disse. "Ou seja: investimentos públicos e privados devem estar dirigidos para as zonas de mais pobreza, e não somente continuar em zonas de riqueza, que vão favorecer novamente os que têm mais. Isso é o mais importante."

A ONU faz uma projeção do crescimento populacional em São Paulo, que deverá chegar a 2025 com 21,4 milhões de habitantes, a quinta maior população do mundo. No período, São Paulo deverá superar Nova York e Cidade do México, como mostrou o Estado na revista Megacidades, e terá à sua frente, em 2025, Tóquio, Mumbai, Nova Délhi e Daca. "No Brasil, cerca de 70 cidades nos últimos 15 anos deixaram de ser pequenas, com 50 mil habitantes, e chegaram a 150 mil ou 200 mil", disse. Paraopebas (PA), por exemplo, tinha 71 mil em 2000, e chegou a 133 mil neste ano.

Porto Seguro (BA), por conta do turismo, pulou de 95 mil para 114 mil habitantes no mesmo período. O crescimento populacional em Itaquaquecetuba (SP) chamou a atenção da ONU. Eram 272 mil em 2000 - agora são 334 mil. "Indústria e turismo geram muito emprego e crescimento rápido, mas há categorias diversas", comentou Cecilia, para concluir: "É preciso trabalhar intensamente com as comunidades mais pobres. Não se pode falar de grandes políticas urbanas se não for para trabalhar diretamente com essas comunidades."

 

(Estado de SP, 23/10)


Data: 23/10/2008