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Cotas: Senado deve rejeitar critério de renda

Alterações feitas pela Câmara desagradam a senadores do governo e da oposição, que consideram texto confuso

 

O substitutivo do projeto de lei que cria cotas para as universidades federais e escolas técnicas, aprovado de última hora na Câmara semana passada, deverá ser modificado no Senado. Senadores do governo e da oposição não gostaram das alterações feitas pelos deputados e prometem recuperar a versão original do projeto.

 

O texto inicial prevê destinação de 50% das vagas no vestibular para alunos de escolas públicas, preenchidas segundo critérios de raça. Ou seja, essas vagas serão destinadas a estudantes negros, pardos e índios, de acordo com a proporção dessas populações em cada estado, de acordo com o Censo 2000.

 

Os senadores deverão rejeitar a emenda proposta pelo deputado Paulo Renato (PSDB-SP), que previa, dentro da metade de vagas destinadas à escola pública, um critério de renda para a seleção dos alunos. Metade das vagas destinadas às cotas deveria ser preenchida por alunos com renda familiar per capita de um salário mínimo e meio.

 

Para Ideli Salvatti, emendas “bagunçaram” o texto. A principal crítica ao texto aprovado na Câmara é que a versão final ficou confusa.

 

— No projeto aprovado por unanimidade no Senado não tinha dúvida. Agora o Paulo Renato introduziu o ingrediente de renda, que, além de bagunçar todo o texto, acaba colocando um condicionante que à primeira vista é justo, mas na prática se torna restritivo. Os critérios de renda e raça já estão contemplados no meu projeto — diz a senadora Ideli Salvatti (PT-SC).

 

Ela acredita que seu texto, e não o modificado na Câmara, deverá ser aprovado pelos senadores, que, neste caso, terão a palavra final.

 

O líder do DEM, senador Agripino Maia (RN), reforça a crença da colega petista: — A tendência é o Senado voltar a aprovar o que já havia sido aprovado anteriormente.

 

Autor da polêmica emenda, Paulo Renato, que foi ministro da Educação no governo Fernando Henrique, nega que sua contribuição gere confusão. Para ele, esse argumento é usado por quem tem preconceito contra os pobres. O critério de um salário mínimo e meio, segundo ele, foi definido a pedido do ministro da Educação, Fernando Haddad, para que ficasse igual ao exigido dos candidatos a uma bolsa integral nas universidades particulares, o ProUni.

 

— Não há confusão. Confusão é quando é cota racial, que é preenchida por autodeclaração. A renda é um critério objetivo. Então, se dá certo no ProUni por que não dá certo para as federais? Isso é elitismo das federais, que não querem ver pobre lá dentro — reclama.

 

“A versão anterior é melhor”, diz Cristovam. Para o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), ex-ministro da Educação de Lula, o projeto aprovado pela Câmara é “complicado”. Ele é favorável ao estabelecimento de cotas raciais porque acredita que o único meio de o negro ser inserido na elite brasileira é entrando na universidade.

 

Mas defende o fortalecimento das escolas públicas, coisa que, segundo ele, o projeto de Ideli poderia ajudar a fazer: — A versão anterior é melhor porque é mais simples. Ao dar cota à escola pública, a gente vai ajudar a escola pública a melhorar.

 

Agora, as cotas para renda são ilusórias. Vão beneficiar apenas os raríssimos alunos pobres que chegaram ao ensino médio e vão passar a idéia de que resolveram os problemas dos pobres: “eles já entram na universidade, então não preciso melhorar o ensino básico e médio”.

 

No Senado, o PSDB ainda não tem uma posição definida. Apesar de ter ajudado a aprovar por unanimidade o projeto original, agora, o partido defende que o assunto seja melhor discutido: — A gente vai estudar isso com carinho, é coisa para maturar com calma. Mas em matéria de educação, a opinião do Paulo Renato, que foi ministro da Educação por oito anos, é muito importante — diz Arthur Virgílio (AM), líder tucano no Senado.

 

— Todos me colocam que estamos sendo coniventes em piorar o ensino, enquanto deveríamos garantir que o ensino médio melhorasse, e não fazer cotas. Eu acredito que essa emenda do Paulo Renato vai nos dar a chance de continuar discutindo o projeto. Vamos ter que repensar— complementa a senadora Marisa Serrano (PSDB-MS).

 

(O Globo, 24/11)


Data: 24/11/2008