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Anísio Teixeira abriu mão de salário de professor em prol de biblioteca

Um dos pioneiros da educação, ele tem acervo digitalizado no site da CPDoc

"Acusando o recebimento do ofício 485 em que V. Ex. me comunica desistir em favor da biblioteca deste estabelecimento das vantagens pecuniárias referentes ao cargo de professor contratado da Escola de Professores, enquanto permanecer no exercício das funções de Diretor Geral de Instrução Pública, tenho a satisfação de agradecer esse nobre gesto de V.Ex., de tão alta significação moral (...), que dotará este instituto de meios necessários para iniciar a organização de sua biblioteca".

Assinado por Lourenço Filho e endereçado a Anísio Teixeira, o documento transcrito acima faz parte do acervo pessoal de Anísio, um dos maiores intelectuais da educação no país - ao lado de nomes como Paulo Freire, Gustavo Capanema e Darcy Ribeiro. Os cerca de 20 mil documentos manuscritos e datilografados, além de 465 fotos, estão digitalizados e podem ser acessados no portal do CPDoc da Fundação Getulio Vargas, no endereço: http://www.cpdoc.fgv.br/comum/htm/.

- A consulta é pública e gratuita, como pregava Anísio em relação à educação no país - comenta o diretor do CPDoc, Celso Castro.

O ofício do diretor do Instituto de Educação do Distrito Federal, que mostra Anísio abrindo mão do seu salário em prol da biblioteca da instituição, é de 13 de maio de 1932, ano em que ele assinou o famoso Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que pregava uma escola pública, gratuita, mista, laica e obrigatória.

Arquivo tem cartas de Monteiro Lobato

O acervo pessoal de Anísio Teixeira abrange os quase 50 anos de vida pública, nos quais esteve à frente dos mais importantes órgãos ligados à educação no Brasil. O arquivo contém documentos referentes à sua atuação como secretário de Educação do Rio de Janeiro; conselheiro da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco); reitor da Universidade de Brasília (da qual foi um dos fundadores); entre outros.

- Além de ter acesso à formação crítica e intelectual, o pesquisador vai mergulhar também na perspectiva humanística dele. O acervo tem muitas cartas, várias do Monteiro Lobato. A pesquisa também é um mergulho nas referências intelectuais de Anísio, para quem era preciso fazer uma ciência da educação - explica Luciana Quillet Heymann, pesquisadora do CPDoc.

Segundo ela, o acervo está dividido entre documentos pessoais (certidões, títulos e outros); correspondência; produção intelectual (artigos, ensaios, discursos e anotações dele e de terceiros); legislação; temática; diversos e recortes de jornais. Há documentos referentes à sua passagem pela Unesco, pela Campanha Nacional de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (Capes) e pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep).

Anísio também foi professor nas universidades americanas de Columbia e da Califórnia. Segundo a pesquisadora do CPDoc Helena Bomeny, foi nos Estados Unidos que ele consolidou sua visão sobre a escola pública de qualidade, laica e que juntasse alunos de todas as classes sociais:

- Ele foi muito combatido pela esquerda, pelo seu americanismo. Anísio ficou encantado quando viu, nos Estados Unidos, escolas públicas que reuniam ricos e pobres.

Acervo de Getulio e Geisel também já digitalizados

Helena ressalta que Anísio foi pioneiro também ao compreender que a universalização da educação prepararia o país para o desenvolvimento. Ela lembra que, hoje, o acesso às escolas está praticamente universalizado no país, mas falta qualidade. E lamenta a precariedade da formação de professores.

O acervo de Anísio foi digitalizado graças a um patrocínio do Banco Real no valor de cerca de R$ 3 milhões. Com os recursos, o CPDoc já digitalizou os arquivos dos ex-presidentes Getulio Vargas e Ernesto Geisel. Segundo a coordenadora do setor de documentação, Suely Braga da Silva, agora a navegação está mais fácil e rápida: - Temos uma nova versão web, que facilita a consulta.

Para quem gosta de política fluminense, ela conta que o próximo acervo a ser digitalizado é o de Ernani do Amaral Peixoto, genro de Getulio e ex-governador do Estado do Rio.

 

(O Globo, 30/11)


Data: 01/12/2008