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Educação integral, modelo ainda restrito a poucos

Dos 32 milhões de alunos de ensino fundamental no país, apenas 1,2% ficou mais de oito horas/dia na escola em 2008

Defendido por especialistas como caminho natural para melhorar a aprendizagem, a educação em tempo integral ainda engatinha no Brasil. Dos 32 milhões de alunos de ensino fundamental das redes pública e privada do país, apenas 406.964 (1,2%) ficavam mais de oito horas na escola, no ano passado, segundo o Censo Escolar.

O número inexpressivo reflete não só falta de dinheiro e espaço para acomodar os alunos. Mesmo um programa específico do Ministério da Educação (MEC), criado para levar ensino integral às escolas com mais baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), tropeça na burocracia e em falhas de gestão.

Recursos para aumentar carga não foram repassados

A meta do Mais Educação este ano é financiar o aumento da carga horária em 5 mil escolas, beneficiando 1,3 milhão de estudantes das redes estaduais e municipais - apenas 3% dos alunos de ensino médio e fundamental das escolas públicas. Terminado o primeiro semestre, porém, o programa não repassou sequer um centavo às escolas.

A previsão é que isso ocorra em agosto, afirma o secretário de Educação Continuada, Diversidade e Alfabetização do MEC, André Lázaro. O secretário estima que serão liberados até R$ 120 milhões este ano, com complementação de R$ 150 milhões em 2010.

Segundo o secretário, o atraso foi provocado pela troca do sistema de gerenciamento, isto é, o programa de computador que detalha os investimentos em cada escola. A análise dos projetos também demora. Das 159 escolas de ensino médio selecionadas, apenas uma já está apta a receber o dinheiro.

- Preferimos retardar para começar com segurança. A pior coisa do mundo é ter um sistema inconsistente, com informações que não são verídicas. Isso mata o gestor - justifica Lázaro.

Atraso no repasse impediu adicional do Fundeb Em 2008, porém, o Mais Educação também teve início no segundo semestre, restrito a 1.409 escolas e 380 mil estudantes.

A demora no ano de estreia deu origem a um efeito cascata com consequências perversas para o financiamento do ensino integral.

Isso porque um dos mecanismos para incentivar as escolas integrais está no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). O Fundeb paga 25% a mais por alunos de ensino integral, com base nos dados do Censo Escolar.

O problema, diz Lázaro, é que o censo coleta informações no primeiro semestre. Assim, matrículas integrais patrocinadas pelo Mais Educação podem ter ficado de fora do Censo Escolar 2008 do MEC, impedindo que prefeituras e governos estaduais recebam o adicional do Fundeb em 2009.

O mesmo estaria ocorrendo no censo deste ano, o que terá efeitos sobre os repasses do Fundeb em 2010.

- Não posso me desesperar. Não teria mais cabelos (se cogitasse arrancá-los). Estamos construindo coisas que não existiam - diz Lázaro.

No DF, 50 mil são beneficiados na rede fundamental

Lançado ano passado, o programa de educação integral do Distrito Federal já beneficia cerca de 50 mil estudantes da rede pública de ensino fundamental, diz o secretário de Educação do DF, José Luiz Valente. A iniciativa beneficia 15% dos alunos em 200 escolas.

Segundo Valente, se o atual ritmo de investimento for mantido, o ensino integral poderá ser universalizado até 2014.

O esforço do DF soma-se ao de prefeituras que também apostam na ampliação da carga horária. Seja com atividades escolares ou extraclasse, como é o caso do programa Bairro Escola, em Nova Iguaçu (RJ), que aproveita a infraestrutura de associações de moradores, clubes e órgãos públicos. Belo Horizonte (MG), Palmas (TO), Sorocaba (SP) e Apucarana (PR) também estão na lista.

Valente conta que o objetivo do turno integral é melhorar a aprendizagem, compensando a defasagem cultural de boa parte dos alunos. O secretário lembra que o crescimento populacional do DF nas últimas décadas ocorreu em cidades-satélites criadas sem planejamento e, portanto, sem escolas.

Quase todos os docentes têm diploma de nível superior

Assim, observa o secretário, os índices de repetência e atraso escolar contrastam com o nível de formação dos professores e com o investimento por aluno. Praticamente todos os docentes têm diploma de nível superior e metade já concluiu a especialização.

- Muitos alunos trazem consigo uma defasagem cultural e familiar enorme. Tem gente que não conhece o Plano Piloto. Entendemos que a educação integral é a forma de corrigir isso - diz Valente.

A adesão das escolas é voluntária. O programa mobiliza também 2.870 universitários, que recebem bolsas do governo do DF para frequentar faculdades privadas. Em contrapartida, eles dedicam 20 horas semanais ao projeto, atuando como monitores.

- Eu aprendo mais aqui do que tenho condições de retribuir. Tudo é supersimples, mas tudo funciona - diz o estudante do curso tecnológico de produção publicitária Djalma Maia, de 36 anos, que é monitor de educação física na Cidade Escola de Candangolândia.

O secretário de Educação Integral do DF, Marcelo Aguiar, diz que o maior obstáculo é a falta de espaço para atender mais alunos.

Já o presidente-executivo do Movimento Todos pela Educação, Mozart Neves Ramos, observa que a expansão do ensino integral requer mais recursos e professores qualificados: - Tem que ser uma política de Estado. Mesmo que se tivesse toda a grana do mundo, hoje não teria professor para dar conta, em tempo integral, de todas as escolas de ensino médio.

(O Globo, 12/7)


Data: 13/07/2009