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Entidades podem ser proibidas de oferecer cursos de especialização

Parecer do conselho de educação impede hospitais e fundações de abrirem vagas; decisão final depende do MEC

Entidades como hospitais, fundações e institutos podem ser proibidas de oferecer cursos de especialização lato sensu, reconhecidos pelo Ministério da Educação, caso parecer aprovado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) seja homologado pelo ministro Fernando Haddad.

A medida atinge cerca de 150 instituições do país, como os hospitais Sírio-Libanês, Albert Einstein, Inca e Beneficência Portuguesa, escolas de negócios como FIA, Fipe, BSP e Dom Cabral e outras como Escola Paulista de Magistratura e a Superior do Ministério Público.

A proposta do conselho é que as autorizações dadas a essas instituições sejam revogadas a partir de 2010, abrindo espaço para que os programas continuem sendo oferecidos como cursos livres. Nesse modelo, não há necessidade de autorização para abertura da escola, não existem critérios para seu funcionamento e o certificado não é reconhecido pelo ministério - semelhante ao que ocorre com cursos de idiomas e artes.

A justificativa do CNE para o parecer está na proliferação de entidades que pedem o credenciamento com fins meramente comerciais, sem tradição de excelência na área de atuação. "O credenciamento especial se desvirtuou de seu objetivo, que era atender apenas centros de excelência e notório saber", afirma Milton Linhares, um dos relatores do parecer e ex-vice-reitor da Universidade Bandeirantes. "Hoje, instituições de alto nível em suas áreas não precisam da chancela do poder público para mostrar que têm credibilidade. Quem é bom vai continuar bom."

Para Antonio Carlos Ronca, também relator do texto e ex-reitor da PUC-SP, é melhor que o próprio mercado e a sociedade se encarreguem de dizer quais são os cursos bons e os ruins, sem envolver o ministério na autorização.

"É preciso desregulamentar a intervenção do Estado nas coisas em que a regulamentação não é importante", defende.

Os críticos da medida afirmam que por trás da iniciativa há uma briga pelo mercado de especializações - nos últimos anos, muitas universidades abriram unidades voltadas para esses cursos, principalmente nas áreas de saúde, economia e administração. "Esses cursos são importantes para a educação continuada e para a atualização profissional", diz Paulo Monteiro Barone, presidente da Câmara de Ensino Superior do conselho e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora. Ele deu um voto contrário ao parecer.

"A maioria desses cursos aborda temas que não estão na agenda das universidades e devem ser ofertados em abundância, com qualidade." Na avaliação de Barone, tirar a chancela fará com que universidades tenham uma nova fonte de renda emprestando seu nome a eles. É que, sem emitir certificado reconhecido, as instituições teriam de pagar uma parte da renda a alguma universidade para que ela faça isso.

Número de cursos cresce 15% ao ano

O credenciamento especial de hospitais, fundações e institutos profissionais para oferta de cursos de especialização lato sensu cresceu 15% ao ano, desde 2001, representando atualmente 5% de todas as instituições de ensino superior do país. Para se ter uma ideia, são cerca de 150 entidades do tipo num universo onde existem 183 universidades, segundo dados de levantamento do Conselho Nacional da Educação.

"É um mercado que tem crescido, com atuações muito específicas, mas a solução não é extinguir toda a modalidade. Seria jogar o bebê junto com a água do banho", afirma o consultor Carlos Monteiro, da CM Consultoria. "Seria melhor criar uma espécie de avaliação para o setor, que oferece cursos muito específicos e que atende uma demanda de mercado."

Hoje, esses cursos são avaliados apenas no momento de sua abertura e na hora em que pedem o recredenciamento, num processo semelhante ao que ocorre com as especializações dadas por universidades e faculdades. Apenas a especialização stricto sensu, que forma mestres e doutores, é avaliada constantemente pelo governo.

"É um grande equívoco e não entendo o que motivou o conselho a fazer isso. Por mais que possa haver instituições menores e sem credibilidade, há entidades sérias, com alto nível de excelência e que atuam em áreas muito específicas na formação para o mercado de trabalho", afirma Roberto Padilha, diretor do Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês. O centro tem cerca de 400 estudantes de especialização e nesta semana, por exemplo, inaugurou em parceria com o Ministério da Saúde um curso de especialização em Gestão na Clínica do SUS com 860 alunos de todo o país.

Para o médico, mesmo com a credibilidade que o hospital tem entre a área médica e o restante da sociedade, a possibilidade de oferecer um curso com certificado reconhecido pelo ministério é importante. "Você não pode colocar esse setor à margem do ensino superior, pelo contrário, é necessário discutir, pensar formas de melhorar até mesmo a avaliação. Há todo um movimento do próprio ministério de valorizar a educação profissional e esse parecer está na contramão", afirma.

A área da saúde é uma das que mais têm instituições com este tipo de credenciamento. Na área odontológica, por exemplo, são cerca de 20. "O curso de especialização em ortodontia tem 1.200 horas, é um treinamento que não se aprende na faculdade e que sempre foi dado por instituições especializadas", defende Flávio Vellini, do Instituto Vellini. Até cerca de dez anos, esses cursos eram regulados pelo Conselho Federal de Odontologia.

"Não faz sentido esse parecer, não é extinguindo uma modalidade que você ajuda a esclarecer quem são os bons e os ruins. Em todo ensino superior há instituições boas e ruins, como as avaliações mostram. Vamos extinguir o certificado dado por todas elas?", questiona Claudio Felisoni, da Funasp, entidade que representa 33 fundações de apoio à USP, como FIA e Fipecafi, que oferecem MBAs na área de negócios e administração. Nos cursos oferecidos pelas entidades da USP estudam 4 mil alunos.

 

(O Estado de SP, 12/9)


Data: 14/09/2009