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Investimento público em educação está aquém do necessário

Brasil dificilmente cumprirá a Meta 5 do movimento Todos Pela Educação, pois o país está longe de investir 5% do Produto Interno Bruto (PIB) na educação básica


O movimento Todos Pela Educação propõe em sua Meta 5 que o Brasil chegue a 2010 investindo diretamente na educação básica no mínimo 5% do PIB, e que esses recursos sejam bem geridos. Atualmente não há um indicador que possa avaliar a gestão desse dinheiro, mas é possível acompanhar a evolução do investimento como proporção do PIB.

Em 2007, o investimento público direto do país na educação básica chegou a 3,9% do PIB; em comparação com o ano anterior, houve um aumento de 0,2 pontos percentuais. Entretanto, na avaliação de Ricardo Martins, consultor legislativo da Câmara dos Deputados, o Brasil ainda está longe de cumprir a meta.

Em entrevista, o consultor também analisa o impacto da crise sobre o financiamento educacional e a promulgação da emenda constitucional que prevê que se exclua gradativamente do cálculo da Desvinculação das Receitas da União (DRU) os recursos da educação e se amplie a obrigatoriedade do ensino para crianças e jovens de 4 a 17 anos.

Além disso, Ricardo Martins, que é sócio-fundador e membro da comissão técnica do movimento, defende a criação de uma lei de responsabilidade educacional, e explica a sua importância para a efetivação do regime de colaboração no Brasil.

- Na sua avaliação, qual o impacto da crise econômica do ano passado sobre o financiamento da educação em 2009?

A participação dos recursos da educação em proporção ao PIB deve se manter mais ou menos estável. Acredito que não deve haver redução, porque os programas estão sendo mantidos em 2009. Mas a expectativa de um aumento maior não deve se confirmar.

- No ano passado, o economista Ricardo Paes de Barros afirmou que, para o alcance da Meta 5 do movimento Todos Pela Educação, seria necessário um crescimento de 0,33 ponto percentual no investimento direto da Educação Básica nos anos de 2007 a 2010. Entretanto, em 2007 o aumento foi de 0,2 ponto percentual, o que torna a meta ainda mais desafiadora. Avaliando esse contexto, o senhor acredita ainda ser possível alcançar a Meta 5 em 2010?

Tem havido um comportamento mais ou menos estável entre as unidades federadas nos gastos diretos com manutenção e desenvolvimento do ensino. A União tem tido um papel muito confortável em relação aos gastos diretos em educação, sem muita variação. O esforço e o crescimento maiores têm se verificado nos estados e municípios, apesar de ainda bastante modestos. Assim, a expectativa de crescimento não é muito grande, até porque a evolução tem ocorrido de forma proporcional ao crescimento do PIB, e nós ainda não sabemos como isso se dará em 2009, por conta da retração econômica. Por exemplo, a previsão do Fundeb atualizada entre janeiro e agosto foi de R$ 8 bilhões a menos, e isso deve impactar ainda mais o atingimento da meta. Não tenho a menor dúvida de que ainda estamos longe de atingir a Meta 5 em 2010.

- O que mudará no orçamento de 2010 com a aprovação da Emenda Constitucional 59/2009, que exclui do cálculo da DRU os recursos destinados à Educação?

Isso poderá significar um saldo positivo, mas não necessariamente. Não tenho o cálculo exato para este ano, mas no orçamento de 2010 será algo em torno de R$ 7,9 bilhões. Esses recursos serão aplicados necessariamente em educação, mas é importante ressaltar que não estão vinculados à educação básica. Hoje, no orçamento do MEC já existem despesas que estão com fontes de financiamento de outras rubricas do Tesouro, por exemplo, a fonte "100" de recursos ordinários. No orçamento de 2010 já está previsto algo da ordem de R$ 7 bilhões, que virão dessas fontes. Esperemos que não, mas pode acontecer apenas uma troca de fontes, sem aumento de despesas.

- Dessa forma, é possível que o fim da desvinculação não impacte, por exemplo, o custo aluno/ano?

Pode ser que não. Pode haver simplesmente uma troca da fonte de recursos. Não estou dizendo que o governo vá fazer isso, mas é possível. Por isso, é preciso que a sociedade fique atenta.

- A Emenda Constitucional 59/2009 também ampliou a obrigatoriedade do ensino para crianças e jovens de 4 a 17 anos. Qual será o impacto disso no financiamento?

A ampliação da obrigatoriedade do ensino para a faixa etária de 4 a 17 anos é positiva. Mas não há dúvida de que isso impacta o financiamento. Existe um número razoável de crianças de 4 a 6 anos fora da escola, e também de jovens de 15 a 17 anos. Mas, talvez o maior problema não sejam os que estão fora do ensino médio, mas sim os jovens que ainda estão retidos no ensino fundamental. Se fosse possível, deveria haver um esforço grande de agregar recursos adicionais por um período de pelo menos dois ou três anos para regularizar o ensino fundamental. Essa é uma bandeira de todos nós, inclusive do Todos Pela Educação - que os jovens concluam o ensino fundamental e médio em uma idade razoável.

- Então o senhor considera que os recursos advindos da DRU não serão suficientes para garantir a ampliação dessa obrigatoriedade?

O que afirmo é que o fim da DRU não garante que haverá recursos adicionais e não garante que esses recursos sejam direcionados totalmente para a educação básica. A União tem que gastar no mínimo 18%, e tem se comportado muito bem em relação a isso, gastando muito próximo desse percentual, exceto no ano de 2006, em que houve um salto - mas nos outros anos ela tem se comportado bem. A estimativa para 2009 está em torno de 19%. É verdade, porém, que o orçamento do MEC tem crescido, assim como o gasto com a educação básica. Mas, do ponto de vista da proporção dos encargos, quem tem arcado com a maior parte são os estados e municípios.

- E o quadro financeiro dos estados e dos municípios - eles terão dificuldades para garantir a ampliação da obrigatoriedade do ensino para essa faixa etária?

É preciso colocar as coisas com certo limite e cuidado. Quando falamos em universalizar o atendimento de crianças de 4 a 6 anos, não estamos falando em uma coisa absurda, porque esse atendimento escolar, tirando algumas carências, já vem sendo feito com bastante amplitude. Não é uma ação sobre-humana. Depois, ainda temos até 2016 para fazer isso. A mesma coisa ocorre no ensino médio: hoje o número de vagas disponível em relação à demanda efetiva também não está significativamente pressionado. Estará depois que corrigirmos o fluxo no ensino fundamental. Aí sim, haverá necessidade de criar vagas. Na verdade, será uma despesa maior, mas que deve ser realizada ao longo do tempo. Se há um aumento das obrigações, é natural que as unidades federadas peçam também a ampliação dos recursos.

- Como o senhor avalia o processo de articulação para proposição da Lei de Responsabilidade Educacional?

Existem vários projetos voltados para esse tema, às vezes não exatamente com esse nome, mas dentro desse campo da responsabilidade educacional, trabalhando com direitos e deveres, responsabilidades, meios legais de atuação do Estado e do poder público para que se cumpram os direitos constitucionais em matéria de educação e de cidadania. Há projetos de diferentes partidos e de diferentes origens, embora isso ainda não tenha tramitado na Câmara. Chegou-se a fazer um seminário sobre o assunto e há uma minuta, mas o assunto ainda não evoluiu.

- Qual a importância de uma lei como essa?

Entendo que é positivo ter uma espécie de legislação que permita à sociedade acompanhar e cobrar de forma adequada a realização das políticas públicas. O nome lembra a lei de responsabilidade fiscal, mas tratam de normas de natureza diferente. Inclusive o teor da legislação. A responsabilidade educacional trata de outras questões, e é preciso lembrar que não há um mandato constitucional tão claro quanto o que se refere à lei de responsabilidade fiscal. Mas, de qualquer forma, me parece extremamente oportuno para a bandeira da educação que haja uma forma organizada e legal da agenda das políticas públicas - uma espécie de pauta que favoreça o controle pela sociedade. Por outro lado, a União não pode tudo. Uma lei federal não pode contrariar os mandamentos constitucionais, por exemplo, tem que ser cuidadosa para não intervir na autonomia de estados e municípios, e isso tem sido discutido.

- A Lei de Responsabilidade Educacional pode contribuir para efetivar o regime de colaboração?

Sem dúvida. Um dos seus propósitos é esse mesmo. Ao se definirem as responsabilidades nas diferentes instâncias, isso é possível. A Emenda Constitucional nº 53, conhecida como a emenda do Fundeb alterou o artigo 23 da Constituição, para dispor que leis complementares tratarão do regime de cooperação entre a União, os estados e os municípios. O objetivo era fazer uma lei complementar que tratasse do regime de colaboração dentro da área educacional. Isso pode ser um caminho para que uma lei de responsabilidade educacional venha a ter com esse status e regule o regime de colaboração. Mas essa discussão ainda não evoluiu, embora pareça uma possibilidade interessante. De fato, o regime de colaboração não é definido na legislação. Não estão claras quais seriam as contribuições das partes envolvidas. Toda a legislação educacional no Brasil parte de uma óptica federativa, tem as atribuições de cada unidade federativa, mas sem dúvida pode haver um detalhamento maior, para a forma com que os entes federados devem interagir em benefício da educação nacional.

(Assessoria de Comunicação do movimento Todos pela Educação)


Data: 10/12/2009