12/07/05 Assentamentos na Paraíba
De acordo com o superintendente do Incra, Júlio Cezar, a situação de desenvolvimento nos assentamentos está geralmente ligada ao tempo de criação
Mais de 205,3 mil hectares de solo paraibano fazem parte atualmente das 217 áreas de assentamento existentes no Estado. Com isso, são ao todo 55 mil pessoas assentadas.
Dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) também apontam que, nas últimas três décadas, 21 propriedades remanescentes de Reforma Agrária já conquistaram a emancipação. A meta do órgão para este ano é beneficiar mais 1.1 mil famílias, com investimentos previstos na ordem de R$ 24 milhões. Mas, será que para esses pequenos agricultores o direito à terra é representado simplesmente pelo ato que garante a posse por parte do Governo Federal, ou essa batalha continua depois?
A equipe do Associados teve acesso a nove assentamentos paraibanos, localizados no Litoral, Brejo Várzea, com o objetivo de fazer uma radiografia da situação nesses locais. Aspectos distintos dentro de uma mesma região e histórias de lutas, entre outras particularidades, farão parte de uma série de matérias especiais, que serão publicadas nos próximos domingos.
Dos 217 projetos voltados a Reforma Agrária na Paraíba, 28 foram criados pelo Governo do Estado - reconhecidos pelo Incra - e 189 gerados pelo Governo Federal. Números do Incra revelam que 11.165 mil famílias foram beneficiadas, o que corresponde a 55 mil pessoas. A área hoje assentada é de 205.3 mil hectares.
O mais antigo assentamento registrado pelo Incra é o Alagamar, entre os municípios de Itabaiana e Salgado de São Felix, criado em 1979 e já emancipado. Nessa época o órgão era apenas uma delegacia, pois a superintendência do Recife era encarregada de promover a reforma agrária no Estado. Enquanto isso, o mais novo projeto é o Pedro Henrique, situado entre as cidades de Remígio e Solânia, criado este ano.
De acordo com o superintendente do Incra, Júlio Cezar, a situação de desenvolvimento nos assentamentos está geralmente ligada ao tempo de criação. "O tempo é um dos fatores mais determinantes no desenvolvimento dos assentamentos. Até porque é preciso um determinado período até que a área se transforme em local auto-sustentável e apresente lucro", explica. "Elementos como tipo de cultura e assistência técnica também são fundamentais", completa.
O Apasa, por exemplo, criado em 1995, é considerado pelo superintendente do Incra um dos melhores assentamentos. A equipe dos Associados esteve no local, que fica no município de Pitimbu, a 70,9 quilômetros do Centro da Capital, em pleno litoral paraibano, e possui emtorno de 1,1 mil de hectare, onde estão instaladas 143 famílias. A associação dos moradores do Apasa dispõe até de um carro de marca Gol, último modelo. Quando questionada pela reportagem sobre a procedência do dinheiro, a líder do assentamento explicou que a compra do automóvel foi "rateada" entre os integrantes. Cada um contribuiu, segundo ela, com R$ 50.
Informações do Incra apontam que os projetos de assentamento melhores estruturados estão situados, em sua maioria, no Litoral Sul. Os de condições mais precárias estão encravados no Semiárido. Um exemplo disso é o assentamento Dona Antônia, na praia de Jacumã, município do Conde, a 22,2 quilômetros do Centro de João Pessoa, com 1,12 mil de hectare. No local, existem 109 famílias. Fundado há 11 anos, o Dona Antônia é um exemplo de assentamento agroecológico bem sucedido. Uma das famílias entrevistadas pela reportagem trabalha com apicultura, além de outras atividades da lavoura. Ela consegue comercializar algo em torno de 805 litros de mel por ano, que representa um lucro de R$ 8.050 anuais. Esses e ouros produtos, que não levam agrotóxicos, são comercializados em várias feiras voltadas a esse tipo de agricultura.
"A contabilidade dos assentamentos agroecológicos é que é estimulante. Alguns chegam a fazer por mês até quatro salários mínimos", diz Júlio César. "Aí está a importância dos movimentos sociais. Esse trabalho surgiu na Paraíba, a partir dos acampamentos acompanhados pela CPT (Comissão Pastoral da Terra).
Critérios para desapropriação
Existem alguns critérios para que uma terra seja desapropriada. Um deles é quando a área não cumprir função social, ou seja, quando não respeitar a lei ambiental e trabalhista. Também podem receber intervenção federal aquelas propriedades improdutivas com mais de 15 módulos fiscais (tamanho que pode variar de acordo com região e município). Podem ainda ser destinada à Reforma Agrária aquelas de tamanho médio (acima de cinco módulos fiscais).
Segundo informações do Incra, quando não há nenhum obstáculo judicial, a imissão pode sair em até nove meses - contados a partir da notificação do proprietário. Porém, quando há obstáculos judiciais, essa espera pode durar, no mínimo, três anos.
"Um dos maiores obstáculos que hoje encontramos é a Medida Provisória editada no Governo FHC, segundo a qual a área invadida passa dois anos sem vistoria. Geralmente, isso abre espaço para o proprietário entrar com pedido de liminar na Justiça. Muitas vezes não há nem ocupação, mas o dono da terra entra com o pedido. O caso vai parar até no Supremo Tribunal", lamenta Júlio Cezar.
O superintendente destaca ainda as manobras praticadas pelos proprietários para burlar a Lei de desapropriação. Muitos chegam até a desmembrar as terras. "Isso aconteceu, por exemplo, na Fazenda Mendonça. Foram ao todo sete anos", exemplifica. Esse assentamento - hoje chamado Dom Marcelo Carvalheira - também foi visitado pela reportagem e os primeiros recursos do Governo Federal ainda não foram liberados desde o ano passado.
Aplicação de R$ 21 milhões
De acordo informações passadas pelo BNB na Paraíba, o valor previsto para aplicação nos assentamentos da PB em 2005 é de R$ 21 milhões. Até junho passado, foram contratados R$ 9.700.585,86 para assentados. O Pronaf-A (investimento) e o Pronaf A/C (custeio agrícola e pecuário) são os programas de financiamento mais procurados pelos trabalhadores. Para o primeiro, a carência é de até cinco anos. Já no segundo, carência é de no máximo 2 anos.
Ainda de acordo com o BNB, a liberação dos valores referentes à mão-de-obra dos itens financiados é feita diretamente ao agricultor. Já os recursos voltados aos demais itens, como insumos, máquinas e equipamentos, por exemplo, são liberados aos fornecedores. As operações de crédito do Pronaf são feitas mediante a apresentação de projetos técnicos elaborados por profissionais habilitados, autônomos, de empresas particulares ou da Emater, contratados pelos próprios assentados. A taxa de elaboração de projetos também é financiada dentro do próprio programa.
Fonte:
Diário da Borborema (Repórter: Cecília Noronha)
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